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TJ/CE absolve mulher reconhecida só por foto presa durante gravidez

Acusada de roubo, costureira conseguiu provar falha em reconhecimento fotográfico.

25/3/2024

Após defesa provar falhas no reconhecimento fotográfico e apresentar álibi, costureira presa enquanto gestante por roubo foi absolvida pela 3ª câmara Criminal do TJ/CE. 

A mulher foi detida em dezembro de 2021, quando estava grávida de três meses, após ter sido acusada de envolvimento em um roubo à mão armada ocorrido em um restaurante em Fortaleza/CE, em julho daquele ano, no qual seis vítimas tiveram bens subtraídos por um casal de assaltantes. 

As vítimas identificaram a costureira, com base exclusivamente em reconhecimento fotográfico, como uma das pessoas envolvidas no crime.

Em abril de 2022, devido ao estágio avançado da gravidez, a acusada foi autorizada a aguardar o resultado do recurso em liberdade. 

Mulher foi presa grávida após ter sido reconhecida pelas vítimas por fotografia em procedimento que desrespeitou previsão do CPP. (Imagem: Freepik)

Fragilidade probatória

A absolvição da acusada veio após a defesa provar que a ré passou o dia do crime em um churrasco na residência de sua ex-patroa, sem qualquer participação no roubo. 

Também foi questionada pela defesa a condenação com base exclusivamente em fotografias mostradas pela polícia, sem aderência ao procedimento formal estabelecido no art. 226 do CPP, que exige medidas específica para garantir a precisão e a justiça do reconhecimento pessoal, incluindo a colocação da pessoa a ser identificada ao lado de outras com semelhanças físicas.

Lacuna 

A revisão do caso pelo TJ/CE destacou a ausência de provas concretas, além do questionável reconhecimento fotográfico. 

"Segundo os relatos das vítimas, o ato criminoso foi perpetrado por um casal, com o homem usando máscara e a mulher desprovida desse acessório. Essa particularidade possibilitou a algumas das vítimas observarem as características físicas da mulher, que foi descrita como morena, de estatura baixa e com cabelo curto. 

Em que pese às narrativas das vítimas, tal prova deixa à mostra uma lacuna probatória de irremediável efeito sobre o desfecho do processo, no caso, a realização de reconhecimento dissociado da ritualística prevista no art. 226 do Código de Processo Penal, o que, conforme recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, gera irreversível invalidade do ato."

Na decisão, o tribunal enfatizou que, além do reconhecimento, não havia outras evidências como testemunhas adicionais, gravações de câmeras de segurança, confissões ou recuperação de itens roubados que pudessem vincular a mulher ao crime.

Os magistrados citaram precedentes do STJ e STF que invalidam o reconhecimento fotográfico como base exclusiva para a condenação, devido à sua natureza altamente sugestionável e a probabilidade de erros. 

Ressaltaram, ainda, a importância de aderir ao devido processo legal, fundamental para a integridade do sistema judicial e para a proteção dos direitos dos indivíduos.

"O reconhecimento fotográfico caracteriza um total desrespeito à legislação processual penal e tem sido causa de diversas iniquidades judiciais, resultando, por vezes, na condenação de pessoas inocentes. O Poder Judiciário não pode nem deve compactuar com essa prática, sob pena de afronta ao postulado constitucional do devido processo legal", concluíram.

Reconhecimento de pessoas

A prisão com base exclusivamente em reconhecimento fotográfico é um tema recorrente em decisões do STJ e do STF. 

Ministros da Corte da Cidadania consideram que o reconhecimento em desconformidade com o procedimento estipulado pelo CPP torna-se campo fértil para o erro judicial. Em 2020, a 6ª turma do STJ firmou o entendimento de que não é possível condenar alguém exclusivamente com base em um reconhecimento fotográfico. Desde então, até fevereiro de 2022, a Corte já havia proferido ao menos 90 decisões absolvendo réus pela fragilidade desse tipo de prova.

Em dezembro de 2022 o CNJ estabeleceu diretrizes pelo ato normativo 0007613-32.2022.2.00.0000  para orientar o reconhecimento pessoal e evitar erro que condenam pessoas inocentes, e, muitas vezes, reforçam o racismo estrutural, já que, segundo dados do projeto “Justiça para os inocentes” da OAB/RJ, 70% de acusados injustamente por falhas no reconhecimento fotográfico são pessoas negras. 

Entre as medidas que devem ser observadas estão a preferência pelo reconhecimento presencial, com a presença de quatro pessoas ou a apresentação de quatro fotografias, a gravação do procedimento de reconhecimento e a disponibilização dessa gravação às partes envolvidas, além da coleta de autodeclaração racial de reconhecedores e investigados.

Veja o acórdão.

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