Por 6 a 5, a Corte Especial do STJ restabeleceu a continuidade da tomada de contas especial aberta pelo TCU para apurar suspeitas de recebimento indevido de diárias e passagens pelo ex-procurador Deltan Dallagnol durante a operação Lava Jato.
Em junho de 2022, quando exercia a presidência do Tribunal da Cidadania, o ministro Humberto Martins também atendeu pedido da União para restabelecer a tramitação do processo de tomada de contas contra Deltan. Ao decidir, o ministro considerou que a decisão da Justiça Federal no Paraná, suspendendo o procedimento instaurado pelo TCU, fere a autonomia da corte de contas.
Ao negar recurso do ex-procurador e deputado cassado, a decisão do ministro Humberto Martins foi restabelecida.
Ao julgar o caso na Corte Especial do STJ nesta quarta, a relatora presidente, ministra Maria Thereza, não foi efetivamente comprovada, com dados e elementos concretos, a ocorrência de grave lesão aos bens tutelados pela legislação, e nem foi demonstrado na inicial, de modo preciso e inequívoco, o alegado efeito multiplicados do julgado, não bastando, para tanto, meras alegações genéricas de que outros procedimentos de tomada de conta especial podem ser atingidos no âmbito do TCU.
Para a ministra, os argumentos referem-se ao mérito da ação na origem, não sendo viável a sua apreciação na via excepcional da suspensão de segurança, que não constitui sucedâneo recursal apto a propiciar o exame do acerto ou desacerto da decisão impugnada.
"Na verdade, o deferimento da medida urgente levou em consideração as peculiaridades do caso concreto, circunstância que afasta a possibilidade do chamado efeito multiplicador de demandas idênticas, e de igual modo impede o reconhecimento de que essa decisão de sobrestamento do andamento da tomada de contas especial causa grave lesão por interferir no pleno exercício dos Poderes garantido à Corte de Contas."
A ministra ressaltou que se trata de decisão em caso individualizado, sem repercussão direta na competência institucional do TCU. Nesse contexto, para ela, não estão preenchidos os requisitos para o deferimento do pedido.
"A SLS é medida excepcional, não tem natureza de recurso, razão pela qual não permite a devolução do conhecimento da matéria de mérito da controvérsia para o eventual reexame ou reforma."
Assim, deu provimento ao recurso para indeferir o pedido de suspensão.
Atuação do órgão
O ministro Humberto Martins, em divergência, reafirmou o voto proferido em 2022. Para ele, está caracterizado o perigo da demora inverso, uma vez que a decisão questionada obsta a atuação regular fiscalizatória de importante órgão administrativo de controle, cuja atuação é de extrema relevância para toda a sociedade que exige transparência e eficiência na gestão dos recursos públicos.
"Está caracterizada a lesão à ordem pública na medida em que a decisão judicial impugnada, sem a demonstração inequívoca de ilegalidade, obstou o trâmite e o pleno funcionamento autônomo e independente da atuação fiscalizatória do Tribunal de Contas da União."
Assim, votou para negar o provimento interno, mantendo a decisão que prolatou quando exerceu a presidência.
Lesões graves
Em voto-vista, o ministro Mauro Campbell ressaltou que, no que diz respeito à gravidade da lesão, a Corte entende que o incidente de suspensão de decisões judiciais foi idealizado para proteger de lesões graves alguns bens jurídicos caros à vida em sociedade: saúde, economia, segurança e ordem públicas.
"Não é, porém, qualquer lesão que autoriza o manejo do pedido de suspensão. As leis de regência exigem lesão qualificada, grave, que ponha em risco imediato e inaceitável aqueles bens jurídicos protegidos."
Para o ministro, no caso, "revela-se flagrante a ingerência jurisdicional em seara tipicamente administrativa, conforme demonstrado pela União, em que se obstou, previamente, o próprio exercício de atribuição constitucional conferido ao TCU, em proceder tomada de contas especial para apurar eventual malversação dos recursos públicos, o que é de absoluta gravidade".
"Não se cogita, por tanto, controle de legalidade ou ilegalidade de ato administrativo, reconhecidamente sujeita a controle jurisdicional. Mas, sim, de grave e entrave à atuação independente da Corte de Contas, a partir de notória ingerência indevida."
Assim, acompanhou o voto divergente do ministro Humberto Martins. Os ministros Francisco Falcão, João Otávio de Noronha, Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira também acompanharam a divergência.
Ficaram vencidos, junto com a relatora, os ministros Nancy Andrighi, Herman Benjamin, Raul Araújo e Villas Bôas Cueva.
- Processo: SLS 3.133