Para o ministro Gilmar Mendes, é válida a proibição aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios a cobrança de contraprestação às concessionárias pelo direito de passagem em vias públicas, faixas de domínio e e outros bens públicos de uso comum na instalação de infraestrutura e redes de telecomunicações, prevista no artigo 12 da lei 13.116/15.
O entendimento foi proferido na tarde desta quarta-feira, 17, em julgamento do plenário do STF. O debate, que tem efeitos sobre o leilão da frequência 5G da internet, continua amanhã com os votos dos demais ministros.
Entenda o caso
A ação foi proposta no ano passado, pelo PGR Augusto Aras contra dispositivo da lei geral das antenas. O artigo questionado diz o seguinte:
"Art. 12. Não será exigida contraprestação em razão do direito de passagem em vias públicas, em faixas de domínio e em outros bens públicos de uso comum do povo, ainda que esses bens ou instalações sejam explorados por meio de concessão ou outra forma de delegação, excetuadas aquelas cujos contratos decorram de licitações anteriores à data de promulgação desta Lei."
A norma proíbe aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios a cobrança de contraprestação às concessionárias pelo direito de passagem em vias públicas, faixas de domínio e e outros bens públicos de uso comum na instalação de infraestrutura e redes de telecomunicações.
Aras argumenta que a norma viola a autonomia dos entes federados, pois sacrifica receita que poderia ser aplicada nos serviços públicos locais para fomentar atividades exploradas em regime de competição. Segundo o PGR, o usual é o pagamento pelo uso privativo de bem público como elemento de atividade econômica ou comercial do usuário, em razão da necessidade de socializar os benefícios originados da exploração do domínio público. A lei, ao estabelecer a gratuidade do direito de passagem de infraestruturas de telecomunicações, retirou dos entes federativos a prerrogativa de dispor dos bens integrantes de seu patrimônio jurídico.
A possibilidade de frustração de receita pública, a seu ver, agrava a crise fiscal numa conjuntura de queda de arrecadação tributária decorrente dos impactos econômicos da Covid-19, resultante da paralisação de setores estratégicos da economia e agravada pela necessidade de auxílio estatal para a população mais carente.
Relator
Para Gilmar Mendes, o artigo impugnado se insere no âmbito da competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações e se reveste de inequívoco interesse público. Não há inconstitucionalidade formal e material, segundo o relator, pois o dispositivo é adequado, razoável e proporcional.
O ministro salientou que a pulverização descoordenada de condicionamentos jurídicos à instalação da infraestrutura de telecomunicações incrementou de forma significativa o custo regulatório. Este problema, segundo o ministro, é crítico para o setor no qual a interconexão e o compartilhamento da estrutura de redes são essenciais para garantir a universalização de acesso.
O ministro citou como exemplo o Estado do Paraná: se uma empresa de telecomunicações decidisse levar uma rede de fibra ótica de Cascavel para Juvinópolis, a cobrança pelo Estado somente pelo uso das faixas de domínio seria 50% superior ao faturamento potencial com a prestação de serviços.
“Ou seja, apenas o custo de pagar pelo uso da faixa de domínio seria 50% maior que a renda esperada pelas empresas, o que torna proibitiva a ampliação da rede neste e em muitos outros pequenos municípios.”
Assim, Gilmar Mendes enfatizou a necessidade de o Estado e a Agência reguladora responsável em fixar normas jurídicas que se voltem a uma prestação universalizada.
O dispositivo, ao renunciar qualquer pretensão de retroatividade, G prestigia a garantia constitucional do direito adquirido e do ato jurídico perfeito e da impessoalidade.
O ministro frisou que a finalidade do artigo impugnado é de garantir a expansão de um serviço público de interesse da coletividade. “A edição de uma lei Federal nacional sobre o tema é medida adequada”, afirmou.
“O direito de passagem não representa qualquer tipo de aniquilamento dos bens dos Estados e municípios.”
Por fim, Gilmar Mendes julgou improcedente o pedido, ou seja, pela validade da norma.
Amici Curiae
Pelo Sindicato Nacional de Empresa e Telefonia e de Serviço Móvel, o advogado Saul Tourinho pediu pela improcedência da ação. “O futuro pede passagem”, disse o advogado ao defender a disposição prevista na lei. Segundo o advogado, a norma vitaliza a liberdade, porque confere autonomia aos usuários de telecomunicação e vitaliza a igualdade, porque reduz a exclusão digital. Saul Tourinho salientou a inclusão digital que a norma propicia, pois o debate impacta diretamente sobre o leilão da frequência 5G da internet.
No mesmo sentido, defendeu o advogado Alexandre Batista Marques, pela TELCOMP - Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas, frisou que a receita pelo direito de passagem não deveria fazer parte do plano de negócios das empresas. A norma, segundo o advogado, possibilita a massificação da banda larga, ocasionando a geração de empregos e redução de desigualdades sociais.
Também pela improcedência, a Associação NEO TV, por meio de seu advogado Antonio Pereira Junior, salientou a importância da norma para o Brasil, país que ainda sofre com o déficit de infraestrutura de telecomunicações. A norma, segundo o advogado, é benéfica para o país porque auxilia a estrutura de internet no país. “É imperioso a manutenção da lei geral das antenas”, afirmou.
O advogado Lucas Mayall, representando a Aprosoja Brasil - Associação Brasileira dos Produtores de Soja, afirmou que a procedência da ação canaliza recursos que seriam fundamentais para os investimentos necessários que levariam o 5G para o campo. Segundo o advogado, atender a demanda poderia ruir a vantagem competitiva das empresas para o Brasil.
O advogado Alan Silva Faria, pela Abrint - Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações, afirmou que os serviços de empresas de telecomunicações são essenciais. O causídico disse que existe um ecossistema formado dentro dessa dinâmica de prestação de serviços, que integra grandes e pequenas empresas. “Todo mundo vai sentir caso a inconstitucionalidade seja declarada”, afirmou.
Por outro lado, Leonardo Chaves, procurador do Estado de SP, salientou os negativos impactos jurídicos e econômicos que decorrem da gratuidade de uso de bens públicos. O procurador enfatizou que estas contraprestações são receitas legítimas para a Administração do próprio patrimônio do ente federado, a fim de evitar enriquecimento sem causa destas empresas.
Pela inconstitucionalidade da norma, a ABCR - Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, representada pelo advogado Gustavo Gustavo Binenbojm, defendeu que a disposição é uma “cortesia com o chapéu alheio”. Segundo o causídico, a norma não poderia instituir um benefício em favor de empresas privadas que não têm obrigações legais de repassar as vantagens aos seus usuários, podendo apenas ampliar as margens de lucro. “Ao encarecer o serviço prestado pelas concessionárias de rodovias, necessariamente nos contratos futuros, terão que incrementar suas tarifas prejudicando os usuários”, afirmou.
- Processo: ADIn 6.482