O plenário do STF analisará a constitucionalidade do artigo 233 do CP, que tipifica como crime a prática de ato obsceno em local público, aberto ou exposto ao público. Os ministros irão julgar se o dispositivo é compatível com o princípio da reserva legal (ou taxatividade), previsto no inciso XXXIX do artigo 5º da CF, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal.
Em deliberação do plenário virtual, foi reconhecida a repercussão geral da matéria, tratada no RE 1093553, de relatoria do ministro Luiz Fux, no qual o MP/RS questiona decisão da Turma Recursal dos Juizados Especiais Criminais do estado que, no julgamento de apelação criminal, absolveu um cidadão flagrado masturbando-se em via pública, reconhecendo a atipicidade da conduta. Segundo o entendimento da Turma Recursal, o artigo 233 do CP viola o princípio constitucional da reserva legal por ser excessivamente aberto, sem determinar taxativamente quais seriam os atos obscenos.
O MP gaúcho apontou a repercussão geral da questão constitucional, alegando que o debate neste caso é capaz de influir concretamente e de maneira generalizada em uma grande quantidade de casos, notadamente porque a Turma Recursal Criminal do Rio Grande do Sul tem, rotineiramente, declarado a inconstitucionalidade de dispositivos de lei Federal, invadindo esfera de competência do Poder Legislativo.
Por isso, segundo o parquet, o debate ultrapassa o interesse das partes envolvidas na medida em que a declaração de atipicidade da conduta de ato obsceno provavelmente será tornará uma nova tendência no órgão julgador. Para reforçar este argumento, o MP enfatizou que, no estado, só há uma Turma competente para o julgamento de questões relacionadas à prática de delitos de menor potencial ofensivo, de forma que em breve os juízes de primeiro grau poderão passar a aplicar em seus julgados esta nova orientação, determinado o arquivamento de expedientes policiais envolvendo tais ocorrências.
Quanto ao mérito do recurso, o MP salientou que, ao declarar a inconstitucionalidade do artigo 233 do CP sem harmonizar a norma jurídica com o princípio constitucional tido por violado (por meio de interpretação conforme a Constituição, por exemplo), a decisão fragiliza a tutela penal do bem jurídico tutelado, violando o princípio constitucional em questão, na medida em que o emprego da expressão “ato obsceno” não representa a abertura do tipo penal em grau que não o torne compatível com o princípio da taxatividade.
O ministro Luiz Fux destacou ser inequívoca a repercussão geral da questão jurídica debatida no recurso. O relator salientou que, por ser o único órgão no Estado do RS com competência para processar e julgar recursos que versem sobre delitos de menor potencial ofensivo e, consequentemente, sobre o tipo penal em análise, as decisões da Turma Recursal dos Juizados Especiais Criminais, embora não possuam efeito vinculante, exercem “inequívoco efeito vinculativo”, orientando a atuação das demais autoridades, não apenas jurisdicionais, que operam no âmbito dos delitos em questão em território gaúcho.
Fux observou que recentes precedentes em que a Turma Recursal gaúcha declarou a atipicidade de condutas previstas no artigo 50 da lei das contravenções penais (contravenção de promover jogos de azar) e no artigo 305 do CTB (crime de fuga do local do acidente), mantidos pelo Órgão Especial do TJ/RS, o plenário do STF, em julgamentos virtuais realizados em 6/8/16 (tema 907 – constitucionalidade do artigo 305 do CTB) e 4/11/16 (tema 924 – tipicidade da conduta de estabelecer e explorar jogos de azar), reconheceu a repercussão geral das questões constitucionais discutidas nos recursos extraordinários paradigmas, respectivamente RE 971959 e RE 966177, ambos de sua relatoria.
A manifestação do relator foi seguida por maioria em deliberação no plenário virtual do STF, vencido o ministro Edson Fachin. O mérito do recurso será submetido a julgamento no Plenário da Corte, ainda sem data definida.
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Processo: RE 1093553