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Marco Aurélio vota contra prisão após condenação em 2ª instância

Após o voto e as sustentações orais, julgamento de ADCs sobre o tema foi suspenso.

1/9/2016

O STF iniciou nesta quinta-feira, 1º/9, o julgamento de duas ADCs, com pedido de liminar, que buscam reverter decisão recente da Corte que admitiu a execução da pena depois de decisão condenatória confirmada em segunda instância. Após o voto do relator, ministro Marco Aurélio, e das sustentações orais, o julgamento foi suspenso devido ao horário e deve ser retomado na semana que vem.

O ministro Marco Aurélio votou pelo deferimento das liminares, reconhecendo a constitucionalidade do artigo 283 do CPP, para que sejam suspensas todas as execuções provisórias determinadas após a decisão de 2ª instância. Contudo, considerando o princípio da eventualidade, o ministro também consignou voto no sentido de que, se não for este o entendimento majoritário da corte, seja então deferida a liminar para suspender a execução provisória de réu cuja culpa esteja sendo questionada no STJ, bem assim a libertação daqueles presos com alicerce em fundamentação diversa.

"São muitos os exemplos de pronunciamentos do Superior a revelarem a influência determinante em inúmeras oportunidades, considerado o regime do recurso especial e a interpretação do Direito Penal, sendo equivocado diminuir o papel exercido pelo Tribunal nesse campo. Tal como ao Supremo compete a guarda da Constituição Federal, cabe ao Superior Tribunal a palavra final sobre a vasta quantidade de controvérsias alusivas à disciplina criminal."

Em seu voto, ao citar o inciso LVII, do art. 5º, da CF, “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, o ministro destacou que a “literalidade do preceito não deixa margem para dúvidas”: "a culpa é pressuposto da reprimenda, e a constatação ocorre apenas com a preclusão maior".

"O dispositivo não abre campo a controvérsias semânticas. A Carta Federal consagrou a excepcionalidade da custódia no sistema penal brasileiro, sobretudo no tocante à supressão da liberdade anterior ao trânsito em julgado da decisão condenatória. A regra é apurar para, em execução de título judicial condenatório precluso na via da recorribilidade, prender. A exceção corre à conta de situações individualizadas nas quais se possa concluir pela incidência do disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal."

O ministro destacou que o princípio da não culpabilidade é garantia vinculada, pela CF, ao trânsito em julgado, "de modo que a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal não comporta questionamentos. O preceito consiste em reprodução de cláusula pétrea cujo núcleo essencial nem mesmo o poder constituinte derivado está autorizado a restringir."

Pedidos

As ações foram ajuizadas pelo Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Conselho Federal da OAB. Para o partido, a decisão pela qual o STF autorizou a prisão a após a condenação em 2ª instância é incompatível com o artigo 283 do CPP e, por este motivo, para fixar o parâmetro segundo o qual a condenação penal pode ser objeto de execução provisória, o STF teria que ter declarado sua inconstitucionalidade. A OAB, por sua vez, argumentou que a nova redação do dispositivo do CPP buscou harmonizar o direito processual penal ao ordenamento constitucional, espelhando e reforçando o princípio da presunção da inocência.

Sustentações orais

O julgamento das ADCs foi iniciado pelas sustentações orais. Falando pelo PEN, Kakay criticou posicionamento de parte da imprensa que afirmou que a causa defendida nas ADCs levava em consideração os “clientes privados” dos advogados. Ele destacou que a presença da defensoria no processo demonstra que ele “concorrerá naquilo que é dramático, que é na prisão antecipada de milhares de dezenas de milhares de pessoas” que não têem sequer a assistência de uma Defensoria Pública.

“Todos nós queremos o combate a corrupção e queremos a efetivação do processo penal. A pergunta que faço é que país queremos? Se queremos fazer esse combate com a garantia e a defesa dos direitos individuais – tão longamente e tão duramente insculpidos na Constituição, através de anos e anos de evolução da sociedade e da civilização, ou se queremos fazer, da forma como alguns querem, esquecendo e passando por cima dos direitos e garantias individuais. No primeiro caso, faremos o mesmo enfrentamento à corrupção, faremos certamente a aplicação do processo penal ao final, mas sairemos um pais maior e um país melhor e mais justo. Caso contrário, se começarmos a afastar os direitos constitucionais, e as garantias constitucionais, sairemos um pais obscurantista, embora estaríamos fazendo o mesmo enfrentamento.”

Em nome do Conselho Federal da OAB, sustentou o advogado Juliano Breda, que criticou a mudança de jurisprudência da Corte e ressaltou o pedido cautelar da OAB para que fossem suspensas todas as prisões que vem sendo decretadas com base no entendimento do STF.

“Todas as centenas de prisões determinadas a partir deste julgamento da casa em fevereiro foram tomadas com franco e absoluto desrespeito ao artigo 97 da CF e a conhecida súmula vinculante nº 10 desta Casa.”

Pela DPU, falou Gustavo Zortéa, citando que há diversos casos que, na pratica, iniciando a execução pela condenação de segunda instancia, o réu será submetido a excesso de execução se não vier a ser absolvido posteriormente.

O defensor público Rafael Munerrati, que sustentou pela Defensoria Pública de SP, reforçou que o cotidiano da atuação da Defensoria Pública no STJ demonstra que há um alto índice de alterações nos acórdãos criminais oriundos dos Tribunais de Justiça. No mesmo sentido, argumentou a defensoria do RJ, na voz de Thais dos Santos Lima, que trouxe estudo no qual ficou constado que em 41% dos recursos especiais da Defensoria Pública do RJ, que cuidavam de absolvição, atenuação de regime, redução da pena, ou até mesmo a substituição de uma pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, tiveram o resultado positivo. Segundo ela, dentre esses processos que tiveram o resultado positivo, mais da metade tratavam do regime inicial de cumprimento de pena.

Pelo IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, falou o advogado Thiago Bottin, o qual pontuou que o fato de o STF ter tomado a decisão em HC fez com que pessoas em uma mesma circunstância fossem tratadas de forma diferente, sugerindo um alto risco de violação ao princípio da isonomia.

Presidente da AASP, Leonardo Sica afirmou que desde o julgamento do HC instalou-se no sistema judicial brasileiro uma situação de "anomia, derivada do caos normativo". Ele lembrou que muitos cidadãos e advogados que já estão se defendendo em processos em cursos, se defendem com a "legítima expectativa normativa de que o artigo 283 do CPP seja cumprido".

O criminalista Fábio Tofic, presidente do IDDD - Instituto de Defesa do Direito de Defesa, lembrou que o Brasil ostenta a marca de ter uma das maiores populações carcerárias do mundo e que 40% dos presos são presos provisórios.

Em sua sustentação oral, José Horácio Ribeiro, representando o IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo, trouxe estudo que o Instituto realizou com a fez com a Associação Brasileira de Jurimetria, o qual revelou grande variação na taxa de negação de recursos no TJ/SP: de 16% a 81% conforme a câmara que os julga. A pesquisa classificou o resultado encontrado como "preocupante", por levar a uma "percepção de grande insegurança jurídica".

Sustentando pela IAB, o advogado Técio Lins e Silva destacou também que os interesses dos réus da Lava Jato nesse processo são insignificantes perto da população que será atingida pela decisão. "Tenho fundadas esperanças que esse julgamento, mesmo que na fase cautelar, seja favorável para proteger a população, esta clientela anônima, do sistema de justiça criminal."

Pela Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas, subiu à tribuna o advogado Elias Mattar Assad. E pelo instituro Ibero Americano De Direito Público, a advogada Vanessa Palomanes, também defendendo a constitucionalidade do artigo 283 do CPP.

Processos relacionados: ADCs 43 e 44

Veja a íntegra do voto do ministro Marco Aurélio.

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