Migalhas Quentes

Por violar lei, advogada tem contrato com cliente analfabeta anulado

Colegiado entendeu que mulher não cumpriu formalidade adicional utilizada em contratos com pessoas não alfabetizadas, conforme previsto no CC.

7/8/2023

A 3ª turma Cível do TJ/DF manteve, por unanimidade, decisão que anulou contrato de prestação de serviços advocatícios celebrados entre dois advogados e homem analfabeto. Os desembargadores concluíram que os réus não obedeceram requisitos do CC para assinatura de contrato com pessoas não alfabetizadas. 

O homem afirma que celebrou contrato com os advogados, em junho de 2019, para propor ação contra o INSS, com vistas a receber o benefício previdenciário, fruto de acidente de trabalho. Informa que é analfabeto, somente sabe assinar o próprio nome e não recebeu nenhuma via do referido contrato. Narra que, no curso do processo, a advogada ré informou que o outro réu não atuaria mais no caso e orientou o autor a assinar nova procuração e contrato, com poderes para que pudesse receber valores em seu nome. Declara que não havia testemunhas no momento da assinatura.

Advogada tem contrato com cliente não alfabetizado anulado por descumprir legislação.(Imagem: Freepik)

Além disso, a mulher teria garantido que seriam mantidas as mesmas cláusulas do contrato anterior, porém, com o auxílio de familiares, percebeu o documento foi datado com data retroativa e que o montante cobrado pelos serviços havia sido alterado e acrescido de 50% dos valores que lhe são devidos retroativamente pelo INSS.  

Por sua vez, os advogados alegaram que a relação entre eles e o homem teve início em 2017, embora a formalização do contrato tenha ocorrido apenas em 2019. Afirmam que nunca receberam pelos serviços prestados. Informam, ainda, que o contrato discutido foi lido em voz alta, na presença do autor e seus familiares, bem como de testemunhas que assinaram o documento. Por fim, consideram que não há motivos para anulação ou revisão de cláusula contratual, pois o valor acordado é proporcional ao trabalho realizado.  

No recurso, a advogada sustenta que a decisão de 1ª instância teria se baseado unicamente na ausência e requisitos previstos no Código Civil e desconsiderou outras circunstâncias que evidenciariam o integral conhecimento e assentimento do autor aos termos do negócio, como o fato de a carteira de identidade ou qualquer outro documento pessoal não conter a indicação de que ele seria pessoa não alfabetizada. Concluiu que seria um comportamento oportunista do homem.

Ao analisar o caso, a desembargadora relatora Ana Maria Ferreira da Silva, ressaltou que a advogada não cuidou de contestar diretamente a alegação do autor. Além disso, a julgadora ponderou que, no curso da relação contratual mantida com o cliente (supostamente iniciada em 2017), tinha plenas condições de identificar sua condição e adotar as providências e cautelas necessárias à prevenção de qualquer irregularidade. “Esse é um dos deveres atribuídos ao advogado pelo Código de Ética da OAB”.  

Reforçou ainda a necessidade de cumprimento de formalidade adicional, em contratos envolvendo pessoas não alfabetizadas, conforme previsto no CC. “Quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas”, explicou a magistrada. 

Segundo a relatora, não observar esses requisitos tem como consequência a nulidade do negócio jurídico. Assim, constatado o descumprimento da exigência legal, a Turma manteve a sentença e decretou a nulidade do contrato. 

Veja decisão.

Informações: TJ/DF

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