Defensorias Públicas de 15 Estados emitiram nota técnica contra a nomeação de defensor público para representar "interesses do feto". De acordo com o texto, a atuação não tem qualquer respaldo legal.
As notas tiveram como ponto de partida dois casos recentes de meninas que sofreram estupros e engravidaram. Em ambos, por ordem da Justiça foram nomeados advogados para os fetos.
Por meio de seus Núcleos de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudems), as defensorias afirmam que os casos demonstram que a figura do “curador do feto” já é realidade nos processos judiciais, inclusive com atuação da Defensoria, “ainda que essa possibilidade não possua amparo legal”.
O texto é assinado por defensoras públicas dos Estados de SC, SP, PR, RR, RJ, MS, PI, MT, CE, BA, TO, RO, MG, GO e PB.
- Leia a íntegra da nota técnica.
As Defensorias citaram que a questão da “curadoria do feto” está posta em projeto de lei que tramita na Câmara e dispõe sobre o “Estatuto do Nascituro” – mas a alteração legislativa não foi feita, e a nomeação, hoje, é inadequada aos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil.
A conclusão da nota é de que a nomeação de defensor para o feto não tem qualquer amparo legal, constitucional e convencional, "sendo absolutamente incompatível com a missão constitucional atribuída à Defensoria Pública na promoção e defesa dos direitos humanos, haja vista que viola a dignidade de mulheres e meninas, reproduz violência, discriminação de gênero e gera vitimização secundária".
Casos
Em meados de junho de 2022, foi noticiado o escandaloso caso da menina de Santa Catarina, grávida aos 11 anos, que foi submetida a audiência e encorajada a desistir de aborto. Naquele caso, foi nomeado, por parte da Justiça, um advogado para tal “curatela”.
À época, noticiamos que juíza e MP induziram-na a manter gestação. À época, a juíza do caso comparou a proteção da saúde da criança com a proteção do feto.
Ao final de 2022, mais um caso ganhou as manchetes: uma menina do Piauí, hoje com 12 anos, já tem um bebê e está grávida do segundo. Houve discussão na Justiça sobre a possibilidade de aborto (permitido em 1ª instância, e proibido em 2ª), e nomeado curador para o feto.
Migalhas ouviu especialistas sobre o tema, que consideraram a nomeação de curador para o feto uma "aberração jurídica".