Migalhas Quentes

Advogado não deve indenizar por argumentos utilizados em contrarrazões

TJ/RJ entendeu que não houve excesso do causídico no exercício da profissão.

28/3/2019

O TJ/RJ reformou sentença e julgou improcedente pedido de danos morais contra o advogado Eduardo Jardim Ferreira de Souza, do escritório CMartins Advogados, feito por um homem que se sentiu moralmente atingido pelo que o causídico escreveu em uma peça de contrarrazões, ao defender um cliente.

A controvérsia teve início em ação que o autor ajuizou ação em razão de falha no serviço prestado por operadora de TV a cabo. O pedido inicial foi julgado improcedente, razão pela qual o apelado interpôs recurso inominado, ao qual foi negado provimento. 

Ele sustentou que teria sido ofendido em sua honra e dignidade pelo advogado, que representando a operadora, ao oferecer contrarrazões, argumentou:

“Infelizmente, a indústria do dano moral aflige nossa sociedade, mais especificamente a sociedade jurídica. No caso deste recurso, a parte recorrente expõe claramente esta situação: teve o seu pleito prontamente atendido com o cumprimento espontâneo da decisão proferida pelo Juízo a quo, e mesmo assim atormenta as Instâncias Superiores intentando indenizações absurdas e incondizentes com o caso. E mais, em que pese o suposto dano moral sofrido pela recorrente, não há nada que possa justificar um pleito reformador autoral/recorrente. Resta incontroverso que a pretensão autoral nada mais é do que ganhar dinheiro fácil. Todavia seria mais correto que o apelante fizesse jus a essa quantia trabalhando de forma honesta, e não ingressando com ações desnecessárias sem qualquer fundamento. Tal atitude, contudo, deve ser amplamente reprimida pelo Judiciário. (...) Não há nos autos nenhuma prova de que a situação vivida pela parte autora trouxe lesão à sua honra, sofrimento ou angústia que pudessem justificar a indenização por danos extrapatrimoniais. Ao não demonstrar que sofreu, se angustiou ou teve sua honra maculada, a parte Recorrida não pode fazer jus à indenização moral”.

O desembargador Mario Assis Gonçalves, relator, destacou que a controvérsia se restringe em saber se houve eventual excesso do advogado no exercício da profissão. Ele pontuou que a CF/88, em seu art. 133, consagra a importância do advogado na administração da justiça, conferindo-lhe inviolabilidade por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. 

Tais prerrogativas, frisou o magistrado, têm como principal finalidade permitir ao advogado o exercício do seu mister com maior segurança, “considerando seu papel na luta pelos direitos e garantias individuais, muitas das vezes contra o arbítrio do próprio Poder Público. No mesmo sentido é o teor do art. 7º, § 2º, da lei 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil)”. 

“O advogado goza de uma situação jurídica de liberdade, necessária no combate às infrações legais e constitucionais, afigurando-se ilegítima qualquer possibilidade de perseguição.”

O magistrado salientou que essas prerrogativas, contudo, não devem ser interpretadas de forma absoluta, devendo ser flexibilizadas quando em confronto com outros direitos de igual grau hierárquico, a depender da análise do caso concreto. 

Na hipótese, porém, ele destacou não ter como como conceber, a partir das manifestações processuais indicadas pelo recorrido, nenhuma ofensa à sua honra, dignidade ou mesmo violação a qualquer outro direito de personalidade. “Antes, trata-se de exercício regular do direito de ampla defesa, garantia processual de índole constitucional.” 

“De fato, os termos utilizados pelo patrono no recurso inominado, de certo um pouco ásperos, não se distanciaram do exercício profissional, confundindo-se com os fatos e fundamentos da demanda.”

De acordo com o desembargador, não se verifica dolo de caluniar, difamar ou injuriar, não se podendo afirmar que a conduta do causídico tenha extrapolado os limites da lide. 

“Assim, entendo que as expressões utilizadas no recurso e reputadas como ofensivas decorreram do estrito exercício da advocacia pelo apelante e guardam nexo de causalidade com o objeto da discussão travada no processo originário.”

O voto foi acompanhado por unanimidade pela 3ª câmara Cível do TJ/RJ. A decisão, que reconheceu a atuação dentro dos padrões éticos do advogado, já transitou em julgado. 

Veja a íntegra da decisão

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