Migalhas Quentes

Souza Cruz pode manter provadores de cigarro

Atividade, sendo lícita e regulamentada, não poderia ser proibida.

22/2/2013

Por maioria de votos, a Souza Cruz S. A. obteve, no TST, decisão que lhe permite manter trabalhadores no chamado "painel sensorial" de avaliação de cigarros. A SDI-1 reformou condenação que impôs à empresa a obrigação de se abster de contratar trabalhadores para esta atividade.

A maioria dos ministros seguiu a divergência aberta pelo ministro Ives Gandra Martins Filho, no sentido de que a atividade, sendo lícita e regulamentada, não poderia ser proibida. Também por maioria, a indenização por dano moral coletivo fixada pela Justiça do Trabalho da 1ª Região, no valor de R$ 1 mi, foi confirmada.

O recurso de embargos julgado pela SDI-1 teve origem como ACP proposta em 2003 pelo MPT a partir de ação individual movida por um ex-empregado da Souza Cruz que cobrou, na Justiça Comum, indenização por problemas de saúde decorrentes de vários anos no "painel sensorial". A 15ª vara do Trabalho do RJ condenou a empresa a deixar de contratar os provadores, a prestar-lhes assistência médica por 30 anos e a pagar indenização por danos morais difusos e coletivos. A condenação foi mantida pelo TRT da 1ª região. A 7ª turma do TST manteve a proibição, mas afastou a indenização. Tanto a empresa quanto o MPT interpuseram então embargos à SDI-1 – a primeira buscando suspender a proibição, e o MPT defendendo o restabelecimento da indenização.

Para o MPT, o termo "painel sensorial" é apenas um "nome fantasia" para o que, na prática, seria "uma brigada de provadores de tabaco", que provam cigarros da Souza Cruz e dos concorrentes com a finalidade de aprimorar o produto comercialmente.

Ao contestar a ACP, a Souza Cruz defendeu que a avaliação de cigarros é essencial para garantir a uniformidade do produto, e a técnica do painel sensorial é usada internacionalmente. A proibição, imposta somente a ela e não às empresas concorrentes, afetaria sua posição no mercado. Para o advogado da empresa, a legislação brasileira não opta pela proibição quando há risco na atividade, e sim pelo acréscimo remuneratório.Destacou, entre outros aspectos, que a adesão ao painel sensorial é voluntária e restrita aos maiores de idade e fumantes. Além disso, não integra o contrato de emprego, e tem natureza jurídica de prestação de serviços.

Nas razões de embargos, a empresa sustentou que a proibição, na prática, enquadrou a atividade como insalubre sem a observância dos requisitos previstos na CLT (artigos 189 e 195) e sem que ela conste da Norma Regulamentadora 15 do MTE. Outro argumento foi o de que atividade é reconhecida pelo MTE no Catálogo Brasileiro de Ocupações nas classificações 1246-10 (blender de cigarros) e 8422-35 (degustador de charutos).

Julgamento

Os embargos começaram a ser julgados em agosto de 2012. O relator, ministro Augusto César Leite de Carvalho, votou no sentido de não conhecer do recurso da Souza Cruz, mantendo a proibição, e dar provimento ao do MPT, restabelecendo a indenização por dano moral coletivo. No seu entendimento, portanto, não apenas os trabalhadores, mas também "a empresa que os contrata para experimentar cigarros em recinto fechado, em detrimento da Lei Antifumo e dos preceitos constitucionais e supralegais já referidos, expõe-se à sanção legal", afirmou.

Ainda na primeira sessão de julgamento, o ministro Ives Gandra Martins Filho briu a divergência que seria seguida pela maioria. Ele acolheu os argumentos da Souza Cruz de que o painel sensorial, essencial para a empresa realizar o controle de qualidade de sua produção, não pode ser desempenhado por máquinas. "Não se conseguirá dar padrão de qualidade sem a atividade humana", observou. O ministro destacou também o fato de o provador ser voluntário, exercer a atividade durante meia hora pela manhã e meia hora à tarde, e ser fumante, uma das condições impostas pela empresa. "Este empregado está sendo mais prejudicado por desenvolver a atividade?", questionou. "O prejuízo já existe pelo fato de ele ser fumante".

Ele traçou um paralelo com a atividade dos mergulhadores de plataformas de petróleo, "sujeitos a condições muito piores" que a dos provadores de cigarro – um dos argumentos levantados pela Souza Cruz em sua defesa. "É uma atividade nociva – tanto que é grande o número de mortes é elevado e os mergulhadores se aposentam aos 40 anos devido ao desgaste da profissão -, mas aceita, porque é necessária para a operação de manutenção das plataformas", comparou.

Na mesma sessão, o ministro José Roberto Freire Pimenta seguiu o voto do relator. O ministro Vieira de Mello Filho quarto a votar, apresentou voto alternativo, no sentido de fixar condições para o exercício da atividade: os provadores trabalhariam no painel sensorial por seis meses, com uma semana de intervalo a cada três semanas. Ao fim de seis meses, ficariam afastados durante três, podendo optar por retornar ou não à atividade. Na sequência, o julgamento foi interrompido por pedido da ministra Delaíde Miranda Arantes, que, no retorno de vista, seguiu o relator. Na mesma sessão, em 4/10/12, houve novo pedido de vista regimental, desta vez formulado pelo presidente do TST, ministro João Oreste Dalazen.

Ao trazer o processo de volta à SDI-1, em 13/12/2012, o presidente acompanhou a divergência no sentido de permitir a atividade, e o relator em relação à indenização por dano moral coletivo. Votaram ainda integralmente com a divergência a ministra Cristina Peduzzi, vice-presidente do TST, e o ministro Brito Pereira. O ministro Lelio Bentes foi o único que votou integralmente com o relator. Para ele, não se podem ignorar os problemas de saúde causados ao trabalhador.

Na sessão desta quinta-feia, 21, da SDI-1, o ministro Alberto Bresciani, que tinha pedido vista, acompanhou o do relator. A última ministra a votar, Dora Maria da Costa, seguiu a divergência.

Ao fim do julgamento, o ministro Levenhagen reformulou seu voto para seguir integralmente a divergência, afastando a obrigação de não fazer. Ficaram vencidos, portanto, o ministro relator, Augusto César Leite de Carvalho, e os ministros José Roberto Freire Pimenta, Delaíde Miranda Arantes, Alberto Bresciani e Lelio Bentes Corrêa. Seguiram a divergência os ministros Dalazen, Cristina Peduzzi, Brito Pereira, Dora Costa e Barros Levenhagen.

Com relação aos embargos do Ministério Público, prevaleceu o voto do relator, que restabeleceu a indenização por dano moral coletivo. Ficaram vencidos os ministros Ives Gandra Filho, Cristina Peduzzi, Vieira de Mello Filho, Dora Maria da Costa, Barros Levenhagen e Brito Pereira. O acórdão será redigido pelo ministro Dalazen, cujo voto desempatou o julgamento deste ponto. Não participaram os ministros Aloysio Corrêa da Veiga e Rernato de Lacerda Paiva.

Os advogados Luciano de Castilho e Fernando Abdala, da banca Abdala, Castilho & Fernandes Advogados Associados, representaram a Souza Cruz no caso, em parceria com a Advocacia Russomano.

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