Conheça os mandamentos do arraial
Estima-se que Canudos veio a ter uma população de mais de 20 mil almas. Sertanejos pobres e crédulos em busca de uma vida melhor.
Imaginem, migalheiros, o que significava para um único homem liderar tanta gente.
Para Antônio Maciel, o Conselheiro – que já havia sido solicitador ou requerente no fórum (clique aqui) – a única forma de conduzir o povo era inexoravelmente aplicar as leis1 que ele própria ditava. Legislador e juiz.
Os crimes graves, Antônio Conselheiro os entregava às autoridades da comarca de Monte Santo. Mas os delitos correcionais ele os punia lá, e a seu modo2.
Confira os 5 mandamentos do Conselheiro:
1- Aceitarás o castigo devido pelas faltas que cometeres
2- Não faltarás aos cultos religiosos
3- Não beberás
4- Defraudarás em prol do arraial
5- Guerrearás para fazer de teu irmão o maioral entre os povos
Veja abaixo como lobrigamos no relato de Euclides da Cunha cada um destes mandamentos :
1 - "Na cadeia ali paradoxalmente instituída [...] viam-se, diariamente, presos".
2 - "Presos que haviam cometido a leve falta de alguns homicídios os que haviam perpetrado o crime abominável de faltar às rezas".
3 - "O uso da aguardente, por exemplo, era delito sério. Ai! do dipsomaníaco incorrigível que rompesse o interdito imposto!"
4 - "Toda sorte de tropelias eram permitidas, desde que aumentassem o patrimônio da grei [...] Em dilatado raio em torno de Canudos, talavam-se fazendas, saqueavam-se lugarejos, conquistavam-se cidades!"
5 - "Alguns fiéis abastados tinham veleidades políticas [...] Canudos fazia-se, então, provisoriamente, o quartel das guardas pretorianas dos Capangas, que de lá partiam, trilhando rumos prefixos, para reforçarem, a pau e a tiro, a soberania popular."
À primeira vista, pode-se ter a impressão de uma completa inversão de conceito sobre o que seja crime – condenando a falta às reuniões religiosas bem como o uso da aguardente, e apoiando toda a sorte de violência e extorsão – mas tratava-se, antes de qualquer coisa, de garantir a obediência e a ordem. Feito isso, todo o resto se justificava em prol da prosperidade do arraial. E era com esses objetivos em mente que o Conselheiro aplicava a lei. Basicamente, diga-se, a lei da sobrevivência.
Na próxima matéria, você vai saber quem foi o juiz de Direito que fez detonar a guerra de Canudos (isso mesmo!) e vai conhecer também aspectos bárbaros do tratamento dado aos prisioneiros de guerra pelo exército republicano.
Esperamos por você!
1 CUNHA, Euclides da. Os Sertões. 23ª edição. Rio de Janeiro: Editora Paulo de Azevedo Ltda. 1954. p. 171-172.
2 NOGUEIRA, Ataliba Nogueira. Antônio Conselheiro e Canudos. Volume 335. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 1974. p. 11
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