Dilermando de Assis apresenta sua defesa
Um dos vários tiros disparados por Dilermando de Assis atingiu mortalmente Euclides da Cunha.
Da Redação
quarta-feira, 1 de julho de 2009
Atualizado em 15 de fevereiro de 2021 10:30
Um dos vários tiros disparados por Dilermando de Assis atingiu mortalmente Euclides da Cunha - na região infraclavicular direita, lesando-lhe o pulmão. Esse ferimento foi dado como "causa eficiente" da morte do escritor e o crime foi tido como "impelido por motivo reprovado". O jovem tenente recebeu o libelo crime acusatório e o prazo para elaborar sua defesa.
Dilermando tratou, então, de preparar-se. Buscou a ajuda do renomado advogado Evaristo de Moraes e alegou se tratar de um crime em legítima defesa, explorando o temperamento impulsivo de Euclides da Cunha.
Analise os autos, leitor, para formar seu juízo de convencimento.
-
O libelo crime acusatório
Por libelo crime acusatório diz a Justiça como autora, por seu Promotor contra o réu Dilermando Cândido de Assis, por este ou na melhor forma de direito.
E. S. N.
P. que na manhã de 15 de agosto do ano próximo passado (1909), na casa n° 214 da Estrada Real de Santa Cruz, o réu disparou vários tiros de revólver contra o Dr. Eclides da Cunha, um dos quais lhe fez, na região infraclavicular direita, o ferimento descrito no auto de exame cadavérico de fls. 39, que lesou-lhe o pulmão direito;
P. que este ferimento por sua natureza e sede, foi causa eficiente da morte do ofendido;
E. que o réu praticou o crime impelido por motivo reprovado;
Nestes termos,
E, que o presente libelo seja válido e afinal julgado provado para o efeito de ser o réu condenado no grau máximo do art. 294 § 2° do Código Penal, visto ocorrer a circunstância agravante do art. 39 § 50 do mesmo Código.
E.C.
Que se procedam as diligências legais, especialmente a intimação das testemunhas do sumário para deporem no plenário.
Rio de Janeiro, 17 de janeiro de 1910.
Francisco Cesario Alvirn
5° Promotor Público
-
A contrariedade ao libelo crime acusatório
Contrariando o libelo de fls. 255
diz, como R.,
Dilermando Cândido de Assis
contra a Justiça, A.
por esta ou melhor forma de Direito
E. S. N.
1° P que A. pretende obter a condenação do R. no grau máximo do art. 294 § 2°, do Código Penal, porque (diz) "na manhã de 15 de agosto do ano próximo passado (1909) na casa n° 214 da Estrada Real de Santa Cruz, o R. disparou vários tiros de revólver contra o Dr. Euclides da Cunha, um dos quais lhe fez, na região infraclavicular direita, o ferimento descrito no auto de exame cadavérico de fls. 39, que lesou-lhe o pulmão direito, sendo esse ferimento, por sua natureza e sede causa da morte do ofendido; havendo o crime sido cometido por motivo reprovado".
Entretanto
2° P. que os atos praticados pelo R. o foram sob pressão de uma forma do "estado de necessidade", em legítima defesa própria e de outrem, visto como, achando-se na sua citada residência, foi inopinadamente agredido, a tiros de revólver pelo Dr. Euclides da Cunha, que também atirou contra o irmão do R. Dinorah Cândido de Assis, tendo sido ambos feridos antes de o ter sido o mesmo Dr. Euclides.
E, também,
3° E que o temperamento impulsivo do Dr. Euclides da Cunha o levou, mais de uma vez, e com intermitência de depressão e apatia, a cometer violências contra as pessoas; vivendo, outrossim, em contínua luta com a mulher e os filhos, ao ponto de ser sua casa um verdadeiro inferno.
Por demais,
4° E não ter sido (como se propalou e ainda erradamente se sustenta) protegido desde infância, nem educado a expensas do Dr. Euclides, pois seus pais deixaram algum pecúlio, tendo tido o R. tutor zeloso, que dele cuidou, ministrando os necessários recursos, após o falecimento da mãe do R., em data de 30 de abril de 1904 (documentos juntos).
Quanto ao seu proceder,
5° E que foi sempre digno, desde o tempo em que cursou o Seminário Episcopal, em São Paulo, até a presente data, merecendo boas notas no seu curso da Escola Militar, consideração de seus mestres e colegas, bem como agasalho honroso na sociedade, perante a qual demonstrou, mais de uma vez, seus sentimentos generosos (documentos juntos).
Finalmente,
6° P. que a presente contrariedade deve ser recebida e afinal julgada provada para o efeito de ser o R. absolvido, reconhecida em seu favor a justificativa prevista no art. 32 § 2°, combinado com o art. 34 do Código Penal.
Requer-se, a bem da verdade, intimação da 1 a testemunha abaixo arrolada, a fim de depor acerca do 4° provará, bem como expedição de precatória para intimação da 2ª e 3ª testemunhas, a fim de deporem acerca do 3° provará, salvo ao R. o direito de com a devida antecedência, alterar o rol de testemunhas.
Justiça!
Testemunhas:
1ª Alberto Saraiva da Fonseca, encontrado na Companhia de Loterias Nacionais, da qual é presidente, nesta cidade.
2ª Dr. Julio Bueno, cidade de Muzambinho (Minas).
3ª Tenente Coronel Antonio Pedro de Azambuja Cortines - cidade de Sena.
Madureira - (Alto Juruá).
Rio, fevereiro
Evaristo de Moraes
(com 12 documentos devidamente selados)
_____________
Qual seu veredito, migalheiro? Dilermando é culpado ou inocente? Ocupe a cadeira de jurado e, amanhã, entre na sala secreta deste poderoso rotativo para dar seu voto.
_____________