Antônio, conselheiro jurídico
Que Antônio Conselheiro foi a figura carismática que atuou como líder messiânico no episódio de Canudos não é novidade. O que escapa a muitos, entretanto, é a atuação de Antônio Vicente Mendes Maciel - filho do comerciante Vicente Mendes Maciel e de Maria Joaquina de Jeus - como solicitador ou requerente no fórum.
Da Redação
terça-feira, 23 de junho de 2009
Atualizado em 15 de agosto de 2022 09:10
Antônio, conselheiro jurídico
A trajetória do líder de Canudos pelo mundo do Direito
Que Antônio Conselheiro foi a figura carismática que atuou como líder messiânico no episódio de Canudos não é novidade.
O que escapa a muitos, entretanto, é a atuação de Antônio Vicente Mendes Maciel (nome de batismo de Antônio Conselheiro) - filho do comerciante Vicente Mendes Maciel e de Maria Joaquina de Jesus - como solicitador ou requerente no fórum.
Isso mesmo, migalheiro, Antônio Conselheiro foi "auxiliar de advogado, habilitado por lei para requerer em juízo ou promover o andamento das ações", como explica o dicionário Aurélio o verbete "solicitador".
Nos dias de hoje, fatalmente ele seria um migalheiro.
Mas voltando à realidade, o fato é que depois da morte do pai, Antônio Maciel casa-se e encerra o negócio herdado, vivendo, em poucos anos, em diversas vilas e povoados, adotando diversas profissões.
"Em 1859, mudando-se para Sobral, emprega-se como caixeiro. Demora-se, porém, pouco ali. Segue para Campo Grande, onde desempenha as funções modestas de escrivão de Juiz de Paz. Daí, sem grande demora, se desloca para Ipu. Faz-se solicitador, ou requerente no fórum"1.
Outros relatos, como o de Manuel Benício - escritor no Jornal do Commercio, no Rio de Janeiro, durante a guerra de Canudos - confirmam a história contada por Euclides da Cunha, atribuindo a Antônio Conselheiro o título de "advogado dos pobres", pois trabalhara como advogado provisionado, quer dizer, sem diploma, no fórum local de Campo Grande e posteriormente como solicitador em Ipu.2
Ataliba Nogueira não deixa de notar, ainda, o progresso profissional na vida de Antônio Conselheiro, já que "foi ascendendo a profissões mais elevadas, escrivão, solicitador, advogado"3.
Toda essa peregrinação na vida de Antônio Maciel foi marcada por lutas particulares (as brigas de família na cidade natal, traição da esposa, seu trabalho no comércio, no fórum etc.), lutas que forjaram o homem que se tornaria o Conselheiro de Canudos.
Sabemos que foi um "conselheiro" não apenas pelo teor religioso que habitava seus discursos, mas porque sua palavra continha a lei - certamente herança de sua "atuação jurídica".
Na próxima matéria, vamos mergulhar na lógica jurídica que prevalecia no arraial de Canudos e entender como eram tratadas as relações de trabalho na época.
Viaje conosco pela história !
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A lei e a atividade de solicitador
Pela lei 5.390, de 23 de fevereiro de 1968, os alunos da 4ª e 5ª séries de direito podiam se inscrever na OAB, na categoria de solicitador acadêmico :
Art. 1º Aos alunos das Faculdades de Direito, oficiais ou fiscalizadas pelo Governo Federal, matriculados ou que venham a matricular-se até o ano letivo de 1968, na 4ª e 5ª séries do curso de Direito, é assegurado o direito à inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, na categoria de Solicitador Acadêmico, ficando dispensados dos requisitos de estágio profissional e de Exame da Ordem para a ulterior admissão nos quadros daquela entidade.
Mas a lei 5.390/68 foi revogada em 1994, pela lei 8.906, no dia 4 de julho. De acordo com ela :
Art. 1º São atividades privativas de advocacia :
I - a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;
II - as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.
Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
§ 2º O estagiário de advocacia, regularmente inscrito, pode praticar os atos previstos no art. 1º, na forma do regimento geral, em conjunto com advogado e sob responsabilidade deste.
Art. 9º Para inscrição como estagiário é necessário :
I - preencher os requisitos mencionados nos incisos I, III, V, VI e VII do art. 8º (Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário: I - capacidade civil; II - diploma ou certidão de graduação em direito, obtido em instituição de ensino oficialmente autorizada e credenciada; III - título de eleitor e quitação do serviço militar, se brasileiro; IV - aprovação em Exame de Ordem; V - não exercer atividade incompatível com a advocacia; VI - idoneidade moral; VII - prestar compromisso perante o conselho.)
II - ter sido admitido em estágio profissional de advocacia.
§ 1º O estágio profissional de advocacia, com duração de dois anos, realizado nos últimos anos do curso jurídico, pode ser mantido pelas respectivas instituições de ensino superior pelos Conselhos da OAB, ou por setores, órgãos jurídicos e escritórios de advocacia credenciados pela OAB, sendo obrigatório o estudo deste Estatuto e do Código de Ética e Disciplina.
§ 2º A inscrição do estagiário é feita no Conselho Seccional em cujo território se localize seu curso jurídico.
§ 3º O aluno de curso jurídico que exerça atividade incompatível com a advocacia pode freqüentar o estágio ministrado pela respectiva instituição de ensino superior, para fins de aprendizagem, vedada a inscrição na OAB.
§ 4º O estágio profissional poderá ser cumprido por bacharel em Direito que queira se inscrever na Ordem.
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1 CUNHA, Euclides da. Os Sertões. 23ª edição. Rio de Janeiro: Editora Paulo de Azevedo Ltda. 1954. p. 141.
2 BENÍCIO, Manuel. O rei dos jagunços: crônica histórica e de costumes sertanejos sobre os acontecimentos de Canudos. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1997.
3 NOGUEIRA, Ataliba. Antônio Conselheiro e Canudos. São Paulo: brasiliana: 1974. p. 5
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