Nesta sexta-feira, 6, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu demitir Silvio Almeida do cargo de ministro dos Direitos Humanos e Cidadania. A decisão foi tomada após o presidente convocar reunião no Palácio do Planalto, no início da noite, em meio às graves denúncias de assédio sexual contra o agora ex-ministro.
A nota afirma que "o presidente considera insustentável a manutenção do ministro no cargo considerando a natureza das acusações de assédio sexual" e reiterou seu compromisso com os Direitos Humanos: "nenhuma forma de violência contra as mulheres será tolerada".
Em entrevista na manhã desta sexta-feira, Lula já tinha declarado que não seria possível a continuidade no governo de "alguém acusado de assédio".
A Polícia Federal confirmou que vai investigar as denúncias, e a Comissão de Ética Pública da Presidência da República também abriu procedimento preliminar para esclarecer os fatos.
Entenda
O caso veio à tona nesta quinta-feira, 5, após a publicação de uma matéria pelo site Metrópoles, na coluna de Guilherme Amado. Segundo o jornalista, Silvio Almeida teria assediado Anielle Franco no ano passado. As acusações incluem toques inapropriados nas pernas, beijos não consentidos e uso de expressões chulas com teor sexual.
Em resposta às denúncias, o ministro Silvio Almeida solicitou à vara criminal de Brasília que o movimento Me Too Brasil esclareça as acusações. O pedido levanta questões sobre a competência da organização para investigar fatos que envolvem autoridades públicas com prerrogativa de função, como é o caso do ministro.
Em nota oficial, a organização Me Too Brasil confirmou ter recebido as denúncias contra o ministro e declarou que as vítimas foram atendidas por meio dos canais de atendimento da entidade, recebendo acolhimento psicológico e jurídico. A organização ressaltou que, como em outros casos envolvendo figuras públicas poderosas, as vítimas enfrentaram dificuldades em obter apoio institucional para a validação de suas acusações.
A nota também destacou o papel do Me Too Brasil na defesa das vítimas de violência sexual e na quebra de ciclos de impunidade que, segundo a organização, muitas vezes protegem agressores em posições de poder.
“A denúncia pública expõe comportamentos abusivos que, por vezes, são acobertados por instituições ou redes de influência. Para o Me Too Brasil, todas as vítimas são tratadas com o mesmo respeito, neutralidade e imparcialidade, com uma abordagem baseada nos traumas das vítimas”, diz a nota.
Resposta do ministro
Silvio Almeida repudiou as acusações e, em vídeo publicado em suas redes sociais, afirmou que a "denunciação caluniosa" precisa ser investigada com rigor.
O ministro mencionou sua esposa e filha de um ano no vídeo e afirmou que solicitou à CGU e à PGR que investiguem as alegações. Ele também enfatizou que não irá transigir com sua honra e classificou as acusações como parte de uma campanha orquestrada para manchar sua imagem.
Manifestações
Após a prisão do ministro, a ministra da Igualdade Racial Anielle Franco publicou nota nas redes sociais. "Não é aceitável relativizar ou diminuir episódios de violência", afirmou.
"Reconhecer a gravidade dessa prática e agir imediatamente é o procedimento correto, por isso ressalto a ação contundente do presidente Lula e agradeço a todas as manifestações de apoio e solidariedade que recebi."
Anielle Franco também afirmou que "tentativas de culpabilizar, desqualificar, constranger, ou pressionar vítimas a falar em momentos de dor e vulnerabilidade também não cabem, pois só alimentam o ciclo de violência".
Veja a íntegra:
Nota Pública - 06/09/2024
Hoje eu venho aqui como mulher negra, mãe de meninas, filha, irmã, além de Ministra de Estado da Igualdade Racial.
Eu conheço na pele os desafios de acessar e permanecer em um espaço de poder para construir um país mais justo e menos desigual.
Desde 2018, dedico minha vida para que todas as mulheres e pessoas negras possam estar em qualquer lugar sem serem interrompidas.
Não é aceitável relativizar ou diminuir episódios de violência. Reconhecer a gravidade dessa prática e agir imediatamente é o procedimento correto, por isso ressalto a ação contundente do presidente Lula e agradeço a todas as manifestações de apoio e solidariedade que recebi.
Tentativas de culpabilizar, desqualificar, constranger, ou pressionar vítimas a falar em momentos de dor e vulnerabilidade também não cabem, pois só alimentam o ciclo de violência.
Peço que respeitem meu espaço e meu direito à privacidade. Contribuirei com as apurações, sempre que acionada.
Sabemos o quanto mulheres e meninas sofrem todos os dias com assédios em seus trabalhos, nos transportes, nas escolas, dentro de casa. E posso afirmar até aqui, que o enfrentamento a toda e qualquer prática de violência é um compromisso permanente deste governo.
Sigo firme nos passos que me trouxeram até aqui, confiante nos valores que me movem e na minha missão de trabalhar por um Brasil justo e seguro pra todas as pessoas.
Anielle Franco
Ministra da Igualdade Racial
Silvio Almeida também se manifestou. Em nota publicada no Instagram, o ex-ministro disse que pediu a Lula que o demitisse para conceder liberdade e isenção às apurações, e que irá provar sua inocência.
Veja a íntegra:
Nesta sexta-feira (6), em conversa com o Presidente Lula, pedi para que ele me demitisse a fim de conceder liberdade e isenção às apurações, que deverão ser realizadas com o rigor necessário e que possam respaldar e acolher toda e qualquer vítima de violência. Será uma oportunidade para que eu prove a minha inocência e me reconstrua.
Ao longo de 1 ano e 8 meses à frente do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, reconstruímos a política de direitos humanos no Brasil. Acumulamos vitórias e conquistas durante essa jornada que jamais serão apagadas.
A luta histórica do povo brasileiro e sua libertação são maiores que as aspirações e necessidades individuais. As conquistas civilizatórias percebidas pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) correm risco de erosão imediata, o que me obriga a ir ao encontro das lutas pelas quais dediquei minha vida inteira.
Não colocarei em risco o progresso alcançado em defesa do povo invisibilizado, vítima de um massacre ininterrupto, pobre, favelado e à margem do processo civilizatório. A segurança e proteção da mulher, sua emancipação e a valorização das suas subjetividades são a força motriz e a potência reformadora e proeminente que o país precisa.
É preciso combater a violência sexual fortalecendo estratégias compromissadas com um amplo espectro de proteção às vítimas. Critérios de averiguação, meios e modos de apurações transparentes, submetidos à controle social e com efetiva participação do sistema de justiça serão a chave para efetivar políticas de proteção à violência estimulada por padrões heteronormativos.
Em razão da minha luta e dos compromissos que permeiam minha trajetória, declaro que incentivarei indistintamente a realização de criteriosas investigações. Os esforços empreendidos para que tenhamos um país mais justo e igualitário são frutos de lutas coletivas e não podem sucumbir a desejos individuais.
Sou o maior interessado em provar a minha inocência. Que os fatos sejam postos para que eu possa me defender dentro do processo legal.
Silvio Almeida