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Defensoria Pública processa Estado de SP por dificultar aborto legal

Segundo instituição, desinformação e baixa capacitação dos agentes de saúde dificultam acesso de vítimas de violência sexual à interrupção da gestação.

7/11/2023

A DPE/SP, via NUDEM – Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres, ajuizou ação civil pública contra o Estado de São Paulo alegando insuficiência na prestação de informações em canais de comunicação oficiais a respeito do aborto legal, além de falta de capacitação de hospitais e profissionais para a realização do procedimento. A Defensoria requer que o ente federativo seja compelido a divulgar informações de forma adequada e a capacitar seus profissionais.

Transparência

Consta da inicial que, em descumprimento do dever de transparência ativa, as páginas virtuais da Secretaria Estadual de Saúde do Estado de São Paulo não trazem informações precisas acerca do aborto legal. Segundo a DPE/SP, a desinformação é responsável por dificultar o acesso ao procedimento e fere direitos fundamentais das mulheres, como a autonomia, dignidade, saúde e cidadania.

A instituição afirma que tentou contatar a Secretaria bandeirante pedindo esclarecimentos, fornecendo recomendações e tentando marcar reuniões, mas não foi respondida. Assim, avaliou que não haveria alternativa senão o acionamento do judiciário contra o Estado.

A Defensoria sustenta a tese de que, ausente informações do exercício ao direito à saúde sexual e produtiva, há inobservância do próprio direito à saúde. 

Não há livre exercício dos direitos sexuais e reprodutivos sem informação adequada. A ausência de informação vulnera o exercício da cidadania plena de mulheres. A publicização de informações acima mencionadas é de suma importância também para o monitoramento, avaliação e verificação da adequação da disponibilidade dos serviços de aborto legal”, informa a inicial.

Realidade dos hospitais

Dados constantes da inicial revelam que o NUDEM visitou a partir de março 2023 ao menos 10 hospitais cadastrados como aptos a realizarem aborto legal. A DPE/SP estima que esses hospitais correspondam a 50% do total de autorizados a realizar o procedimento no Estado. 

Após as visitas, a Defensoria concluiu que esses locais servem de referência para um conjunto considerável de municípios, mas, ainda assim, poucos procedimentos foram realizados. A instituição entende que a desinformação pode estar relacionada à baixa na interrupção da gravidez.

A DPE/SP apurou que os profissionais do SUS indicaram dois principais obstáculos para o funcionamento do aborto legal no Brasil: baixa disponibilidade de profissionais para a realização do procedimento e baixa capacitação da equipe, que desconhece a legislação. 

As visitas do NUDEM aos hospitais levaram o núcleo a concluir que praticamente nenhum deles realiza capacitação e formação dos profissionais, seja a respeito da legislação, seja quanto às técnicas para realizar o procedimento. A instituição identificou, por exemplo, um número elevado de hospitais que realizam o procedimento pela curetagem – a qual não é recomendada pela OMS há mais de 10 anos. 

Também foi constatado que os profissionais têm dúvidas acerca da existência ou não de limite gestacional para a realização do aborto.

A falta de informações claras e transparentes aos profissionais tem como consequência o surgimento de um cenário de insegurança para as mulheres e meninas e para os profissionais de saúde, que muitas vezes, sem uma orientação precisa e fundamentada na melhor evidência científica, acabam incorrendo na prática de má prestação do serviço de saúde”, revela a instituição.

DPE/SP identificou abismo informacional e de capacitação para realização de aborto legal em hospitais públicos do Estado de SP.(Imagem: Freepik)

Desinformação

A Defensoria ainda alega que nos últimos anos várias portarias do ministério da Saúde que regulavam a interrupção da gestação em caso de violência sexual foram revogadas, provocando confusão informacional entre os agentes de saúde.

A pasta, por exemplo, publicou em 2022 um documento no qual afirmava que “todo aborto é crime e que o procedimento de abortamento somente pode ser realizado até a 22ª semana gestacional e após isso deve-se realizar o parto pré-maturo”.

O material foi retirado de circulação, mas, a DPE/SP afirma que as informações ali contidas e propagadas podem ter impactado a rotina dos prestadores de serviço de saúde, gerando cenário de “coerção e medo”. 

Para a defensoria é necessário que o Estado informe os profissionais com cursos que explicitem o modo de atendimento em casos de violência sexual, conforme novos posicionamentos técnicos do ministério da Saúde e evidências científicas do tema. 

Respaldo normativo

A legislação pátria autoriza o aborto em três situações: se não há outro meio para salvar a vida da gestante (art. 128, I do CP), em caso de gravidez decorrente de violência sexual (art. 128, II, CP) e em casos de anencefalia (ADPF 54).

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Além da previsão Constitucional da saúde como direito fundamental e dos permissivos legais do aborto, a DPE/SP indica a lei orgânica do SUS (lei Federal 8.080/90), a lei do minuto seguinte (lei Federal 12.845/13), e o decreto Federal 7.958/13 como fundamentos da ação. 

Pedidos

A DPE/SP, no mérito, requereu a procedência da ACP para que o Estado de São Paulo seja compelido a, em suma:

Veja a inicial na íntegra.

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