Pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, do STF, interrompeu julgamento virtual que analisava a necessidade de autorização judicial para legitimar gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, ou por terceiro presente à conversa, apta a instruir Aime - Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. O caso tem repercussão geral reconhecida.
Antes da suspensão do julgamento, seis ministros já haviam proferido seus votos. Tanto Gilmar Mendes quanto o ministro Alexandre acompanharam a argumentação do relator, ministro Dias Toffoli. Conforme a visão do relator, o uso de gravações ambientais clandestinas, mesmo se realizadas por um dos envolvidos, é considerado ilegal em processos eleitorais, com exceção quando a gravação ocorre em locais públicos de acesso irrestrito.
Já os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Cármen Lúcia divergiram do entendimento.
O caso
O recurso foi interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra acórdão do TSE, que, ao analisar uma Aime, entendeu que a gravação ambiental somente é viável mediante autorização judicial, sendo regra a proteção à privacidade, direito fundamental estabelecido na Constituição Federal. Ainda em 2012, o TSE excepcionou esse entendimento para considerar lícitas as gravações ocorridas em ambientes abertos.
No entanto, no caso concreto, o TSE observou que duas gravações ambientais fundamentaram a condenação de uma das partes. A primeira gravação foi realizada no interior de um automóvel e, na segunda, não houve a identificação do respectivo local, afastando, assim, a aplicação da exceção.
Tese do MPE
Para o Ministério Público, a gravação ambiental pode ser admitida como meio de prova, independentemente de autorização judicial. O autor do recurso considera que, conforme decisão do STF, a gravação ambiental de conversa por um dos interlocutores não estaria relacionada à interceptação de conversa por terceiros a ela estranhos. Salienta que esse entendimento seria aplicável também na seara eleitoral na qual “encontram-se em jogo interesses maiores, coletivos, os quais deveriam se sobrepor a quaisquer interesses particulares menores”.
O MPE assinala que o fundamento segundo o qual a gravação ambiental somente seria legítima se utilizada em defesa do candidato, nunca para acusá-lo da prática de um ilícito eleitoral, conflita com a jurisprudência do Supremo, segundo a qual a gravação ambiental pode ser utilizada não apenas pela defesa, mas também em prol da persecução penal.
Assim, argumenta que a questão não é de inviolabilidade das comunicações, “e sim proteção da privacidade e da própria honra, que não constitui direito absoluto, devendo ceder em prol do interesse público”.
Voto do relator
Ministro Toffoli, relator, votou por negar provimento ao recurso e sugeriu a seguinte tese de repercussão geral, a qual deverá ser aplicada a partir das eleições de 2022, em homenagem ao princípio da segurança jurídica e ao disposto no art. 16 da CF:
"- No processo eleitoral, é ilícita a prova colhida por meio de gravação ambiental clandestina, sem autorização judicial e com violação à privacidade e à intimidade dos interlocutores, ainda que realizada por um dos participantes, sem o conhecimento dos demais.
- A exceção à regra da ilicitude da gravação ambiental feita sem o conhecimento de um dos interlocutores e sem autorização judicial ocorre na hipótese de registro de fato ocorrido em local público desprovido de qualquer controle de acesso, pois, nesse caso, não há violação à intimidade ou quebra da expectativa de privacidade."
No entendimento de Toffoli, a gravação ambiental em espaço privado, considerado o acirrado ambiente das disputas político-eleitorais, "reveste-se de intenções espúrias e deriva de um arranjo prévio para a indução ou a instigação de um flagrante preparado, o que enseja a imprestabilidade desse meio de prova no âmbito do processo eleitoral, pois, para além do induzimento ao ilícito por parte de um dos interlocutores, há a violação da intimidade e da privacidade".
Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes acompanharam o relator.
Divergência
Ministro Luís Roberto Barroso inaugurou a divergência. Eis a tese proposta:
“Diante de ilícito de natureza eleitoral, não havendo indução ou indício de flagrante preparado, é válida a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, em ambiente público ou privado.”
Edson Fachin e Cármen Lúcia seguiram a divergência.
- Processo: RE 1.040.515
Leia o voto do relator e da divergência.