Por considerar inadequada a incidência da qualificadora de homicídio mediante pagamento ou promessa de recompensa, a 5ª turma do STJ decidiu redimensionar as penas de três réus condenados pela Chacina de Unaí. No episódio, ocorrido em 2004, três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho foram assassinados enquanto exerciam a fiscalização do trabalho rural no município de Unaí/MG. O voto condutor foi do ministro Ribeiro Dantas.
Com a retirada da qualificadora, o colegiado fixou a pena do proprietário rural Norberto Mânica, acusado de ser o mandante do crime, em 56 anos e três meses de reclusão. Já para os réus José Alberto de Castro e Hugo Alves Pimenta, denunciados por contratarem os pistoleiros que executaram os disparos contra os servidores, o colegiado fixou a pena em 41 anos e três meses e em 27 anos dereclusão, respectivamente.
De acordo com o MPF, os três auditores fiscais e o motorista do carro estavam próximos a uma fazenda quando foram vítimas de tiros disparados por assassinos profissionais. Os auditores morreram na hora, enquanto o motorista faleceu horas depois do crime.
Após a condenação do tribunal do júri, o TRF-1 fixou a pena dereclusão de Norberto Mânica em 65 anos e sete meses; a de José Alberto de Castro em 58 anos e dez meses; e a de Hugo Alves Pimenta, corréu beneficiado por ter sido colaborador, em 31 anos e seis meses. No acórdão, o TRF-1 manteve a qualificação do crime pelo pagamento de recompensa.
Qualificadora de paga não se aplica a mandantes do crime
Relator dos recursos especiais explicou que, segundo a jurisprudência mais recente do STJ, a qualificadora de paga se aplica apenas aos executores diretos do homicídio, porque são eles que recebem, efetivamente, o pagamento ou a promessa de recompensa para executar o crime.
"Como consequência, o mandante do delito não incorre na referida qualificadora, já que sua contribuição para o cometimento do homicídio em concurso de pessoas, na forma de autoria mediata, é a própria contratação e pagamento do assassinato."
Apesar dessa posição, o ministro reconheceu a existência de julgados do STJ em sentido contrário, porém o magistrado se baseou em entendimento da doutrina no sentido de que a qualificadora é voltada para aquele que obtém a recompensa pela execução do crime, ou seja, não poderia ser aplicada àquele que a oferece, pois sua motivação é diferente da prevista na qualificadora.
A qualificadora do artigo 121, parágrafo 2º, inciso I, do CPP, segundo o ministro:
"Diz respeito à motivação do agente, tendo a lei utilizado, ali, a técnica da interpretação analógica. Vale dizer: o homicídio é qualificado sempre que seu motivo for torpe, o que acontece exemplificativamente nas situações em que o crime é praticado mediante paga ou promessa de recompensa, ou por motivos assemelhados a estes."
Sem motivo para anulação
O relator lembrou que os executores diretos da chacina foram julgados em autos apartados, de modo que, no recurso analisado, está presente apenas o núcleo apontado pelo MP como mandante do crime. Por essa razão, para o ministro, a qualificadora de paga não poderia nem ter sido colocada como quesito para os jurados no julgamento desses réus.
Entretanto, o ministro considerou não ser necessária a anulação do júri como um todo, sendo suficiente a retirada da qualificadora ilicitamente considerada na dosimetria da pena.
"Sem a qualificadora da paga, a única circunstância que permanecerá a qualificar o homicídio será a do inciso V do artigo 121, parágrafo 2º, do CPP, o que impõe seu decote na segunda fase da aplicação da pena. Para além desse impacto no cálculo do apenamento, nenhuma outra consequência advirá da exclusão da qualificadora da paga."
Segundo o relator, situação distinta ocorreria se o vício tivesse ocorrido nos quesitos de autoria, de materialidade ou da absolvição, porque, nessas hipóteses, estaria prejudicada a compreensão da própria vontade popular quanto à condenação dos réus.
"Nesta ação penal, contrariamente, inexiste dúvida quanto à autoria e à materialidade do delito, estando clara, também, a opção dos jurados pela condenação. Como se não bastasse, permanece hígida uma das qualificadoras reconhecidas pelo júri, de maneira que tampouco se questiona o enquadramento das condutas dos recorrentes como homicídios qualificados."
- Processo: REsp 1.973.397
Informações: STJ.