Nesta segunda-feira, 27, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, palestrou durante o X Fórum Jurídico de Lisboa, realizado pelo IDP - Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa. O ministro abordou o tema “jurisdição constitucional e sistemas de Justiça nas democracias pluralistas”.
Durante sua exposição, Barroso apontou que o Poder Judiciário tem protagonismo no Brasil e são “raríssimos” casos de ativismo judicial.
“O ativismo é uma maneira proativa e expansiva de interpretar a Constituição. São raríssimos os casos de ativismo judicial no Brasil. O que existe no Brasil é um certo protagonismo do Poder Judiciário e do Supremo Tribunal Federal, pela razão singela de que tudo no Brasil chega ao Supremo Tribunal Federal em algum momento.”
Barroso separou sua apresentação em três partes: (i) conceitos essenciais e apresentação do cenário; (ii) a ascensão histórica dos tribunais constitucionais e a singularidade brasileira; (iii) tribunais constitucionais e recessão democrática no mundo atual.
Segundo o ministro, a democracia contemporânea é feita de votos, direitos e razões. Para Barroso, ela não se resume ao momento eleitoral e ao aspecto majoritário, mas pressupõe, também, o respeito às minorias e um debate público livre e robusto, legitimador das decisões tomadas a cada tempo.
“Tribunais constitucionais interpretam a Constituição. Constituições institucionalizam e limitam o poder. Não por acaso, sempre existe algum grau de tensão entre quem exerce o poder majoritário e quem tem o papel de limitá-lo. Portanto, é inevitável alguma tensão entre o Executivo e o tribunal constitucional.”
De acordo com S. Exa., nas democracias, essa tensão é absorvida de forma institucional e civilizada, ainda que com “algum choro e ranger de dentes”.
“Quem gosta da decisão diz que foi boa interpretação constitucional; quem não gosta reclama de ativismo judicial e de invasão da esfera dos outros Poderes. Assim é porque sempre foi, nos Estados Unidos, no Brasil, na África do Sul, em Israel e onde mais houver um tribunal independente.”
Judicialização x ativismo judicial
Em sua palestra, o ministro do STF também fez uma distinção entre judicialização de ativismo judicial.
Conforme afirmou Barroso, judicialização significa a possibilidade de se levar um tema ao Judiciário.
“É produto do arranjo institucional do país, dos direitos que consagra e das ações que permitem a sua tutela. A judicialização, portanto, é um fato.”
Já o ativismo judicial, segundo o ministro, é uma atitude, uma maneira proativa e expansiva de interpretar a Constituição, levando alguns princípios abstratos para reger situações que não foram expressamente contempladas, seja pelo constituinte seja pelo legislador.
Em seguida, Barroso elencou razões que levam, não ao ativismo – que é raro – mas ao protagonismo do STF.
Entre os motivos, o ministro cita uma Constituição extremamente abrangente e detalhada; o acesso amplo ao Supremo por meio de diversas ações diretas; um grande número de legitimados ativos, com direito de propositura de ações diretas; a ampla competência criminal originária e por habeas corpus do STF; e a transmissão dos julgamentos pela televisão aberta.
“Em suma: no Brasil existe uma judicialização ampla da vida, o Supremo Tribunal Federal, por isso mesmo, acaba tendo uma posição de protagonismo e de grande exposição pública. Como julga questões polêmicas com grande visibilidade, é objeto de avaliações muitas vezes duras da população, porque sempre há um grupo insatisfeito. Se você julga um conflito entre comunidades indígenas e fazendeiros, um desses grupos assumirá uma posição severamente crítica do decidido. Se você julga uma questão entre governo e ambientalistas em relação a alguma grande obra, ocorre o mesmo.”
Por fim, Barroso pontuou que, a despeito da judicialização ampla, são poucas as decisões que podem ser consideradas tecnicamente ativistas.
“Eu situaria nessa categoria, com destaque, a decisão que permitiu as uniões homoafetivas, abrindo caminho para o casamento de pessoas do mesmo sexo e a que criminalizou a homofobia. Decisões que impediram a posse de ministros de Estado e de outros agentes públicos também podem ser enquadradas nessa categoria.”
Assista a íntegra da palestra:
O evento
De 27 a 29 de junho de 2022 será realizado, em Portugal, o X Fórum Jurídico de Lisboa. Em sua décima edição, o evento tem como mote "Governance da Ordem Jurídica em Transformação". Também estarão em debate temas como liberdades individuais, crise da democracia na geopolítica global, transformações econômicas, meio ambiente, novas tecnologias e desafios do Estado regulador. O objetivo é promover o diálogo entre Brasil e Portugal a partir de uma perspectiva de governança em contínua transformação. O Congresso é realizado pelo IDP, pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito de Lisboa e pela FGV.