A Justiça Federal de SE, a fim de suprir a vontade do pai, permitiu a emissão de passaporte de um menor de quatro meses, vítima de violência doméstica, para que possa viajar com sua mãe para o Brasil. A tutela de urgência foi deferida pelo juiz Federal Ronivon de Aragão, titular da 2ª vara do Estado.
Segundo a ação, os genitores do requerente casaram-se nos Estados Unidos em 2018 e, desde então, a mulher vem sofrendo, juntamente com o filho de 4 meses, todo tipo de violência física e psicológica. A mãe da criança alega que ainda quando moravam nos Estados Unidos, seu esposo e pai do bebê, se negava a dar-lhes dinheiro para se manter, bem como a deixava trancada em casa por vários dias.
Ainda de acordo com o processo, o casal se mudou para a Bélgica em 2019, onde nasceu o filho do casal. Segundo a requerente, o pai do menor, veterano de guerra, passou a dizer que poderia matá-la a qualquer momento, dizendo que por ser das Forças Armadas Americanas, “tinha mais poder do que ela e que ninguém na Bélgica sentiria sua falta, sempre deixado suas armas em local de fácil acesso, como forma de intimidá-la.”
Consta na ação que a situação de violência só cessou quando mãe e filho foram abrigados em um quarto de hotel/abrigo na Base Aérea americana e, “nesse sentido, ainda há indícios de que a integridade de ambos esteja ameaçada, uma vez que o prédio onde o genitor trabalha fica ao lado do abrigo onde o requerente e sua mãe se encontram.”
No entendimento do magistrado, a mãe demonstrou intenso sofrimento advindo das situações de violência vivenciadas ao longo do relacionamento e, isto, por óbvio, traz sequelas psicológicas (além das físicas, documentadas) ao menor.
“A situação da criança é bastante delicada, porque não pode permanecer indefinidamente na casa abrigo, onde está desde 24 de janeiro de 2020, e não tem nenhum outro local para ficar quando sair de lá. Sua única esperança de voltar a ter uma vida digna com sua mãe é retornando ao seu país de origem, uma vez que é o único Estado do qual é nacional (o bebê não possui nacionalidade americana nem belga).”
Segundo o juiz, diante do que foi exposto, verifica-se que, além de todo terror físico e psicológico a que submete o autor e sua representante, o genitor do menor se nega a: fazer o passaporte do filho; disponibilizar sua certidão de nascimento; registrar sua esposa (mãe e representante do requerente) como residente na Bélgica (documento traduzido juntado) e fazer a carteira militar do filho (tal carteira deve ser feita em até 30 dias após o nascimento). "Sobre a carteira militar, vale destacar um detalhe que ressaltará a crueldade da situação: de posse desta, o menor teria direito a atendimento médico dentro da base militar americana, inclusive para trata-se das sequelas da violência paterna."
O magistrado deferiu o pedido de expedição de passaporte ao considerar “a situação irregular em que se encontram mãe e filho em terras estrangeiras, nada obstante brasileiros natos, submetidos a uma condição de vida deplorável, restritos a um quarto de hotel, sem emprego (genitora) e além disso temendo virem a sofrer novas agressões físicas pelo requerido.”
Além disso, o juiz observa que a ausência de passaporte em nome do menor acarreta uma situação de "indocumentação", o que pode lhe causar profundas restrições no exercício dos direitos e prerrogativas de cidadania.
O processo corre em segredo de justiça.
O autor foi representado por Antônio Barreto, Taciana Barreto e Igor Mascarenhas, sócios do Mascarenhas, Barreto, Roneli e Perrusi Advogados.