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Suspenso julgamento sobre omissão do Legislativo para criminalizar homofobia

Voto do ministro Celso de Mello, relator da ADO 26, tomou toda sessão desta quinta-feira e deverá ser concluído na próxima sessão.

14/2/2019

Os ministros do STF deram continuidade, nesta quinta-feira, 14, ao julgamento sobre duas ações que tratam de suposta omissão do Congresso Nacional em votar projeto de lei que efetive a criminalização para atos de homofobia e transfobia.

Na sessão de ontem, Celso de Mello iniciou seu voto, considerado histórico por seus pares. No entanto, não foi concluído em razão do horário. Além de defender o direito das pessoas gays e trans, o ministro rejeitou a possibilidade de, por via judicial, o STF tipificar o crime de homotransfobia e a preliminar quanto a possibilidade de o Estado indenizar vítimas, enquanto a conduta não for criminalizada pelo Congresso.  O julgamento foi suspenso e será retomado na próxima sessão. 

As ações

Na ADO 26, o Partido Popular Socialista (PPS) pede que o STF declare a omissão do Congresso Nacional por não ter elaborado legislação criminal que puna todas as formas de homofobia e de transfobia. Segundo o partido, a conduta pode ser enquadrada como racismo, pois implica inferiorização da população LGBT, ou como discriminação atentatória a direitos e a liberdades fundamentais. A pretensão é exigir que os parlamentares votem lei sobre a questão, especialmente em relação a ofensas, homicídios, agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual ou pela identidade de gênero da vítima. O relator da ADO 26 é o ministro Celso de Mello, decano do Tribunal.

A Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) é a autora do MI 4.733. Assim como na ADO 26, a entidade pede o reconhecimento de que a homofobia e a transfobia se enquadram no conceito de racismo ou, subsidiariamente, que sejam entendidas como discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais. Com fundamento nos incisos XLI e XLII do artigo 5º da Constituição Federal, a ABGLT sustenta que a demora do Congresso Nacional é inconstitucional, tendo em vista o dever de editar legislação criminal sobre a matéria. O ministro Edson Fachin é o relator da ação.

Com a palavra, o relator

O julgamento foi retomado com o voto do ministro Celso de Mello, o qual ressaltou a complexidade do tema, dividindo seu voto em dezoito tópicos, sendo lidos na sessão de hoje os onze primeiros. Durante seu voto, o ministro fez uma longa defesa dos direitos LGBTQ+; entendeu que o Congresso foi omisso frente aos atos de homofobia e transfobia; entendeu que não cabe ao Estado indenizar as vítimas de tais condutas enquanto o Congresso não legisla sobre o tema e que não compete ao STF tornar crimes esses atos.

O ministro afirmou que a orientação sexual e a identidade de gênero são essenciais para a dignidade e a huminidade de cada pessoa, não devendo ser motivo de discriminação ou abuso. Ele disse que grupos, motivados por profundo preconceito, vêm disseminando ódio contra a comunidade gay e trans, buscando impedir o debate público sobre a homossexualidade e transexualidade.

Em determinado momento de seu voto, Celso de Mello, sem citar diretamente a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, disse que modos de pensar como "meninos vestem azul, meninas vestem rosa" impõem uma "inaceitável restrição" às liberdades fundamentais das pessoas, submetendo-as a um padrão incompatível com o pluralismo de uma sociedade democrática. 

"Em outras palavras, ser homem ou ser mulher não é um dado natural, mas ao contrário, é um dado performático e social". 

Durante seu voto, o ministro relembrou decisão do STF que reconheceu a união homoafetiva e também a decisão que autorizou que transexuais procedessem a alteração de nome e gênero no registro civil sem necessidade de cirurgia. Sobre o assunto, Celso de Mello afirmou:

"Sim, senhores ministros, pessoas transgêneros são iguais titulares de direitos humanos, como qualquer outro ser que vive em qualquer formação social e em particular no Estado brasileiro."

Celso de Mello entendeu que não seria viável conhecer do pleito que requeria que o Estado indenizasse as vítimas de homofobia e transfobia, ao que foi seguido por unanimidade pelos ministros. Ele também afirmou que não há como atender ao pedido de que o Supremo, por ele mesmo, tipifique a homofobia. Para ele, a referida pretensão veicula clara restrição ao postulado constitucional separação dos poderes.

O relator citou inúmeros autores que debatem sobre o tema, dentre eles Simone de Beauvoir e Oscar Wilde. Também retomou fatos históricos da coroa portuguesa, em que as ordenações do reino eram marcadas por "evidente hostilidade" aos atos homossexuais, considerando-os como pecado nefando. Celso de Mello explicou que, em certa época histórica, a sodomia era considerada pecado e o pecado, naquela sociedade, era considerado crime. "O discurso persecutório às práticas homoeróticas recrudesce", afirmou.

 O ministro considerou que o Congresso Nacional é omisso ao não editar norma penal contra atos de discriminação praticados em razão da orientação sexual ou identidade de gênero da vítima. Argumentou também que a CF estabelece ao legislador a obrigação de editar lei punindo criminalmente qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais. Para ele, as omissões do Estado não podem ser toleradas, pois ela "evidencia o inaceitável desprezo das autoridades pelos Direitos Humanos".

"Preconceito, discriminação, exclusão e até mesmo punições: eis o extenso e cruel itinerário que tem sido percorrido pela comunidade LGBT."

 

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