Migalhas Quentes

Pesquisa nacional revela perfil da magistratura brasileira

Veja na íntegra.

11/2/2019

“Quem somos – A magistratura que queremos” é o título da pesquisa nacional realizada pela AMB e que traça o perfil da magistratura brasileira. Dos professores Luiz Werneck Vianna, Maria Alice Rezende de Carvalho e Marcelo Baumann Burgos, com a coordenação da Comissão Científica da Associação a cargo do ministro do STJ Luis Felipe Salomão, a pesquisa contou com quase 4 mil respostas, entre juízes ativos e inativos.

Os juízes responderam quase 200 questões dedicadas a aspectos que foram desde os de natureza biográfica e funcional até os mais diretamente voltados ao Poder Judiciário, suas relações com os demais poderes e com a sociedade.

 

Queda da participação feminina

Um dos temas que recebeu atenção especial na pesquisa foi o da feminização da magistratura, questão destacada na pesquisa anterior, realizada duas décadas atrás (“O perfil do magistrado brasileiro”).

A pesquisa revela que o período de maior entrada das mulheres na magistratura se dá entre 1990 e 1999 e entre 2000 e 2009, confirmando a tendência sugerida pela primeira pesquisa. Nesses dois intervalos de tempo, as mulheres chegaram a representar, respectivamente, 38% e 41% do total de juízes ingressantes no 1º grau da carreira.

Nos últimos anos, porém, entre 2010 e 2018, o percentual de ingresso de mulheres caiu para cerca de 34%, evolução também percebida pela recente pesquisa do CNJ (2018). Portanto, no que se refere à tendência à feminização, o movimento ascensional em flecha que havia sido detectado há vinte anos, vem perdendo sua força desde 2010.

Envelhecimento da magistratura

Os dados revelam que hoje, entre os juízes de 1º grau, somente 2,1% dos respondentes têm até 30 anos de idade, em contraste com os dados obtidos na pesquisa anterior, em que esse segmento alcançava quase 13%. Caso se eleve a idade de corte, tem-se que, hoje, entre os juízes de 1º grau, 31% têm até 40 anos e 31,6%, 51 anos ou mais – percentuais bem abaixo daqueles encontrados há duas décadas, em que mais da metade dos magistrados tinha até 40 anos, e apenas 15,9%, 51 anos ou mais.

Assim, a conclusão do estudo é que a magistratura envelheceu. O quadro encontrado para os juízes de 2º grau confirma essa avaliação, já que nos anos de 1990 apenas 27% tinham 61 anos ou mais, em contraposição aos números recentes, em que quase a metade dos juízes de 2º grau estão acima dos 61 anos de idade.

Não ao elitismo

Para os autores, o aspecto mais interessante nas pesquisas diz respeito à origem familiar dos magistrados: "Afinal, uma ocupação que, no Ocidente desenvolvido, é predominantemente vincada por setores da elite, conhece, no Brasil, uma peculiaridade."

Se observada a escolarização de pais e mães de magistrados de 1º e de 2º graus, se verifica que mais da metade deles têm curso superior completo. No outro extremo, cerca de 29% dos pais de juízes de 1º grau e 33,3%, dos de 2º grau têm escolaridade baixa. Um pouco menos escolarizadas, as mães dos magistrados acompanham essa distribuição. A perspectiva, portanto, de que o recrutamento de juízes se dá apenas nos estratos mais altos da sociedade não se confirma no caso brasileiro, percebendo-se, alternativamente, um cenário de recrutamento plural

Os professores explicam que, quando observada a cartela de ocupações exercidas pelos pais, os dados falam mais de uma continuidade do que de uma mudança significativa do perfil da magistratura. Quase a metade dos juízes segue sendo de origem popular: 23% dos juízes de 1º grau e 28% dos de 2º grau são filhos de pais pertencentes ao escalão básico do serviço público ou de trabalhadores autônomos, como pedreiros ou caminhoneiros; e 22% e 15%, respectivamente, são filhos de pais pertencentes ao escalão intermediário, como bancários e corretores.

Já 41,5% dos avós paternos e 38% dos avós maternos dos juízes de 1º grau desempenhavam atividades típicas do escalão básico – o que, somado ao percentual de juízes que afirmaram desconhecer a ocupação de seus avós, poderia atingir índices ainda mais elevados.

Autorretrato

Uma das questões que os juízes brasileiros responderam foi sobre o que seria um bom magistrado. Juízes de 1º e 2º graus apontaram predominantemente três alternativas, nesta ordem:

1- o juiz que “presta um serviço jurisdicional célere”;

2 - o juiz que “profere decisões bem fundamentadas”; e

3 - o juiz que “atua objetivando a segurança jurídica”.

Quanto à identidade do Poder Judiciário, os magistrados valorizaram três características, a saber: “controle da probidade administrativa interna e externa”, “defesa da ordem pública” e “defesa dos direitos humanos e controle da violência estatal”.

Ritos, símbolos e mecanismos de controle interno

As respostas dos juízes na pesquisa apontam a valorização do uso da linguagem formal, porém com forte preocupação quanto à sua comunicabilidade, e do uso de vestimenta adequada, embora não exclusivamente a toga - cerca de 50% dos juízes de 1º grau e quase 90% dos juízes de 2º grau concordam pouco ou muito com a preservação do seu uso nas audiências. 

Acerca da polêmica relativa à limitação de mandatos para os ministros do STF, os magistrados se dividem; e também se dizem frontalmente contrários à indicação para os tribunais por meio do Quinto constitucional: para quase 90% dos juízes de 1º grau o “sistema de ingresso pelo Quinto Constitucional não mais se justifica e deve ser suprimido”, percentual bem menor entre os juízes de 2º grau: 63,4%.

Justiça criminal

Uma bateria de questões tratou de temas relativos à justiça criminal. Entre os juízes de 1º grau, mais de 90% concordam pouco ou muito com as seguintes afirmações: “o sistema penitenciário deve aplicar metodologias de valorização humana”; “o sistema de vídeo conferência para realização de interrogatório e instrução do processo deve ser integrado ao sistema processual penal”; e “as medidas cautelares, no âmbito criminal, somente podem ser aplicadas pelo(a) magistrado(a)”.

A única assertiva que não contou com adesão tão esmagadora quanto as anteriores, restringindo-se a 50% dos juízes, é a de que “a audiência de custódia é um importante mecanismo de garantia processual do acusado e deve ser aperfeiçoada”. Entre os juízes de 2° grau, contudo, a concordância com essa assertiva é bem superior: cerca de 80%. 

Tema polêmico e proposta do atual ministro da Justiça Sérgio Moro, o "plea bargain", a pesquisa indagou aos magistrados se "o sistema de plea bargain (transação penal) deve ser incorporado ao CPP, desde que haja parti cipação do(a) magistrado(a)". 89% concordam muito ou pouco com a mudança.

 

 

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