Apesar disso, segundo Zamataro, a norma é pouco aplicada pelo Poder Judiciário e ineficaz – tendo em vista que não há ferramentas suficientes para a constatação da alienação parental – e carece de medidas mais severas para a punição.
"A lei 12.318 carece de medidas mais severas para a punição do alienador considerando a importância do que se está em risco, ou seja, a integridade moral do menor ou adolescente. De fato, verifica-se que essa lei possui um caráter mais educativo do que sancionatório questionando-se, via de consequência, a sua eficácia."
Confira a íntegra.
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Migalhas entrevista
Quais foram as principais contribuições trazidas pela lei de alienação parental, em 2010, ao Direito de Família e à sociedade brasileira? A lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010, surgiu de uma necessidade urgente de se conferir maiores poderes, aos juízes, a fim de se definir um sistema procedimental para identificar a alienação parental e consequentemente preservar os direitos fundamentais das crianças e adolescentes, vítimas de abusos causados por seus responsáveis, de forma a punir ou inibir eventuais descumprimentos dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes da tutela ou da guarda do menor.
De fato, essa lei contribuiu no sentido de estabelecer medidas que podem ser adotadas pelo juiz para enfrentar essa questão, a fim de evitar maiores prejuízos às partes envolvidas e sequelas graves ou irreversíveis ao menor vítima da alienação parental.
Outro aspecto positivo da lei é o seu caráter preventivo, pois não é necessário que haja um efetivo repúdio da criança em manter um relacionamento saudável com seu genitor, basta que sejam constatados atos e comportamentos do genitor ou guardião com o intuito de prejudicar a relação parental. Por outro lado, qualquer manifestação de repúdio do menor em relação ao genitor somente será considerada se houver um contexto de alienação parental.
Desde então, como o Judiciário tem se posicionado e aplicado a lei de alienação parental? Apesar desse assunto já ter chegado aos nossos Tribunais Superiores, essa lei, ainda, é pouco aplicada pelo Poder Judiciário.
Isso decorre, principalmente, da falta de conhecimento específico, acerca da SAP (Síndrome de Alienação Parental), e abrange não só advogados, como juízes, promotores, psicólogos e assistentes sociais.
Todavia, ocorrendo indícios da prática de atos de alienação parental, o juiz determinará a realização de perícia, após a oitiva do Ministério Público. O laudo pericial deverá conter uma ampla avaliação psicológica compreendendo, inclusive, entrevistas pessoais com todos os envolvidos, históricos de relacionamento do casal e da separação, exames de documentos, avaliação da personalidade dos envolvidos, cronologia de incidentes que possam demonstrar a ocorrência da alienação, bem como exame e avaliação do forma como a criança ou adolescente manifesta-se acerca das acusações contra o seu genitor.
Restando caracterizada a prática da alienação parental, caberá ao juiz a possibilidade de aplicar as sanções previstas nos incisos I a VI do artigo 6º da Lei nº 12.318/2010 : I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador; IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental.
O que mudou neste quadro com a sanção no fim do ano passado da lei 13.058/14, que tornou a guarda compartilhada obrigatória? Muitos doutrinadores entendem que a guarda compartilhada visa inibir a síndrome da alienação parental, que emerge, em regra, diante da não aceitação de um dos cônjuges da separação, sendo este, na grande maioria das vezes, o genitor responsável, que passa a utilizar-se de falsas memórias para afastar o menor ou adolescente de seu outro genitor. Essas falsas memórias são constantemente ditas ao filho de forma que o mesmo passa a acreditar na veracidade dos fatos alegados pelo alienador.
Na guarda compartilhada as responsabilidades são divididas entre o pai e a mãe, o que acaba minimizando os conflitos, pois nesses casos os genitores terão que chegar a um consenso.
Embora um dos genitores viva em lar separado do seu filho, a guarda compartilhada favorece o acompanhamento do desenvolvimento do menor ou adolescente com menos traumas, proporcionando a continuidade da relação, retirando assim a ideia da guarda vista como posse.
A guarda compartilhada proporciona uma relação de igualdade entre ambos os genitores, eliminando todos os possíveis conflitos decorrentes das demais modalidades de guarda e da síndrome da alienação parental.
Nesse caso, ambos os genitores se fazem mais presentes na vida dos filhos, dificultando a prática desta síndrome, pois os pais podem encontrar os menores com uma maior frequência, não apenas em visitas combinadas.
Todavia, não se trata de um posicionamento majoritário. Muitos doutrinadores entendem que quando os genitores não conseguem manter uma convivência saudável, face à ocorrência de inúmeros conflitos, na maioria das vezes, oriundos de distúrbios e/ou desequilíbrios emocionais esse modelo de guarda certamente acabará por piorar a situação vivida pelos menores e/ou adolescentes gerando complicações ainda maiores.
A guarda compartilhada segue o mesmo preceito do melhor interesse da criança e só será cabível quando houver total acordo, entre os responsáveis, sobre todas as questões relativas ao menor ou adolescente. Depende também da maturidade do relacionamento, bom convívio e muitas vezes o livre acesso às residências durante a alternância entre elas. Isso não acontece em casos de alienação parental.
A legislação atual é suficiente para coibir este tipo de ocorrência? Pesquisas realizadas em várias comarcas demonstram que essa legislação ainda é ineficaz, na prática, face à estrutura atual do Poder Judiciário que, ainda, não apresenta ferramentas suficientes para a constatação da alienação parental.
De fato, nosso Poder Judiciário sofre com a ausência de profissionais nas áreas de psicologia e psiquiatria, sem contar os assistentes sociais e o despreparo de grande parte dos órgãos de proteção a criança e adolescente.
A meu ver Lei nº 12.318 carece de medidas mais severas para a punição do alienador considerando a importância do que se está em risco, ou seja, a integridade moral do menor ou adolescente.
De fato, verifica-se que essa lei possui um caráter mais educativo do que sancionatório questionando-se, via de consequência, a sua eficácia.
Quais melhorias ainda podem ser desenvolvidas neste sentido, com vistas à proteção da saúde psíquica da criança? As consequências oriundas da prática de alienação parental são gravíssimas. Podem variar desde a apresentação de distúrbios psicológicos, como depressão, ansiedade e pânico até à prática de suicídio.
Logo, a inexistência de medidas punitivas que, de fato, possam coibir a ocorrência e/ou reincidência da alienação parental é preocupante.
Assim sendo, a adoção de medidas punitivas mais severas há que ser considerada como um ponto de partida na tentativa de se inibir essa ocorrência.
Ainda, dentre as melhorias que ainda podem ser desenvolvidas com vistas à proteção da saúde psíquica da criança e/ou adolescente podemos citar, também, a necessidade de uma maior publicidade da Lei nº 12.318, a qual, ainda, é pouco conhecida por muitos pais, operadores do direito e também por entidades de proteção à criança e o adolescente.
Por fim, resta evidente a necessidade do nosso próprio Poder Judiciário adaptar-se a essa realidade, seja por meio de uma reestruturação que permita a existência de profissionais capacitados que possam não só avaliar, caso a caso, as hipóteses de alienação parental, como aplicar as devidas medidas preventivas e/ou punitivas que forem cabíveis.