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Lima Barreto, um escritor a ser explorado

Escritor brasileiro retratou as contradições do Brasil do Segundo Império e início da República

26/11/2014

Afonso Henriques de Lima Barreto nasceu no Rio de Janeiro, em 13 de maio de 1881, filho do tipógrafo da Imprensa Nacional João Henriques e da professora Amália Augusta, ambos mulatos. A mãe, escrava liberta, morreu precocemente, quando o filho tinha seis anos de idade. Embora tenha vivido boa parte de sua vida após o fim da escravidão – a abolição ocorreu em 1888, no dia de seu aniversário de sete anos –, as marcas por ela deixada, especialmente o preconceito racial e a difícil inserção de negros e mulatos na sociedade brasileira, nunca deixaram de ocupar o centro de sua obra literária.

Teve como padrinho o Visconde de Ouro Preto, senador do Império, a quem deveu os estudos secundários e os primeiros anos na Escola Politécnica.

Principais obras

Em 1900, o escritor deu início aos registros do Diário íntimo, com impressões sobre a cidade e a vida urbana do Rio de Janeiro. Sua colaboração regular na imprensa começa em 1905, com as reportagens para o Correio da Manhã sobre a demolição do Morro do Castelo, no centro do Rio, apontadas por alguns críticos como um dos marcos inaugurais do jornalismo literário brasileiro.

Na mesma época, começa a escrever a primeira versão de Clara dos Anjos, livro que seria publicado apenas postumamente, e elabora os prefácios de dois romances: Recordações do escrivão Isaías Caminha e Vida e morte de M. J.Gonzaga de Sá (que será publicado mais tarde).

Recordações do escrivão Isaías Caminha sai em folhetim na nascente revista Floreal, em 1907, e em livro em 1909. No romance, o jornal Correio da Manhã e seu diretor de redação são retratados de maneira impiedosa, e Lima Barreto "tem então seu nome proscrito na grande imprensa carioca", conforme informações de seu atual editor. O escritor passa a trabalhar e publicar crônicas, contos e peças satíricas em veículos como O Diabo, Careta, Brás Cubas, O Malho e Correio da Noite. Colaborou também com o ABC, periódico de orientação marxista e revolucionária.

Em 1911, escreve e publica Triste fim de Policarpo Quaresma em folhetim do Jornal do Comércio. Publicou ainda Numa e ninfa (1915), Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá (1919), Histórias e sonhos (1920). Postumamente saem Os bruzundangas e as crônicas de Bagatelas e Feiras e mafuás.

Contra o formalismo, pela comunicabilidade – um autêntico pré-modernista

Lima Barreto pertenceu ao grupo de escritores reunidos em torno da revista Floreal, marcada por um programa de contraponto aos círculos literários fechados e convencionais da época. Inspirado por algumas máximas de Tolstoi, que além de seus romances ganhava notoriedade por algumas lições teóricas acerca do papel da literatura, o grupo propalava “absoluta autenticidade”.

Dentro desse quadro, a forma escolhida por Lima Barreto para seus escritos e por muitos apontada como desleixada, reflete exatamente a visão de arte esposada pelo escritor, que se opunha conscientemente à “arte pela arte”, ao preciosismo formal da linguagem, à padronização convencional dos personagens.

Papel da literatura

A finalidade da escrita literária foi uma preocupação constante de Lima Barreto. Na célebre conferência O destino da literatura, preparada para ser proferida na cidade de Mirassol, no interior paulista, mas obstada por uma bebedeira do autor, incapaz de controlar a ansiedade e fugir ao vício (conta-nos a História que o escritor estava na cidade exatamente para tentar um tratamento contra o alcoolismo, aconselhado pelo médico e amigo Ranulpho Prata), posteriormente publicada na revista Sousa Cruz, em 1921, Lima Barreto defende-a como instrumento de difusão de ideias, na medida em que sensibiliza o leitor para argumentos que pela racionalidade não seriam apreendidos.

Para explicá-lo, toma o clássico russo Crime e Castigo como exemplo: a tese de que nenhum homicídio é justificável, nem mesmo aquele perpetrado por Raskolnikoff, embora sórdidos os meios de vida da vítima, e nobres os ideais do criminoso, é apreendida pelo leitor graças à sensibilização possibilitada pela narrativa literária empreendida por Dostoievski. Assim, depois de resumir a trama, o autor conclui:

“Mas esta pura ideia, só como ideia, tem fraco poder sobre a nossa conduta, assim expressa sob essa forma seca que os antigos chamavam de argumentos (...). É preciso que esse argumento se transforme em sentimento; e a arte, a literatura salutar tem o poder de fazê-lo, de transformar a ideia, o preceito, a regra, em sentimento; e, mais do que isso, torná-lo assimilável à memória, incorporá-lo ao leitor, com auxílio dos seus recursos próprios, com auxílio de sua técnica.”

Recepção tardia - obra fala ao momento atual

Lima Barreto morreu no Rio de Janeiro, no dia 1o de novembro de 1922, aos 41 anos de idade. Pouquíssimo reconhecido em vida, a recepção a sua obra vem aumentando, na esteira das lições segundo as quais o decurso do tempo permite uma melhor interação entre autor, meio e leitor.

Ao brasileiro de hoje, há muito o que encontrar em Lima Barreto.

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