Migalhas Quentes

Há 100 anos falecia o expoente do naturalismo Aluísio Azevedo

Romancista notabilizou-se pela construção crítica de tipos e situações da sociedade brasileira do século XIX.

21/1/2013

Precursor do naturalismo no Brasil, grande admirador de Émile Zola, o romancista Aluísio Azevedo notabilizou-se pela construção crítica de tipos e situações da sociedade brasileira do século XIX.

Assim, não escaparam de sua pena arguta e ácida as profissões tradicionais da época, incluindo as do Direito. Em um diálogo da obra "O Coruja", publicado inicialmente como folhetim, um dos personagens, Teobaldo, é questionado pelo amigo André (Coruja) sobre a definição da carreira a seguir.

"- Mas, afinal, é preciso que te decidas por alguma... . dizia-lhe o Coruja. - Se não saíres dessa hesitação, acabarás fatalmente por não estudares nada!

Teobaldo principiava sem dúvida a demorar muito a escolha de uma profissão. Ao sair da sua província vinha aparentemente resolvido a repetir na corte os preparatórios e seguir logo para a Academia de S. Paulo. O direito, porém, se lhe apresentava à trêfega fantasia com o insociável aspecto de um velho carregado de alfarrábios, tressandando a rapé, fanhoso, pedantesco, sem bigode e de óculos na testa.

- Abomino-o! exclamou ele a discutir com o amigo. - Aquilo nem é ciência: e uma coisa toda convencional... uma coisa arranjada segundo o capricho de quem a inventou! Nada possui de certo e determinado! No direito tudo admite sofismas; tudo se pode inverter; tudo está sujeito a mil e um alvarás e a duas mil e tantas reformas! Além disso, consta-me que ninguém pode se gabar de saber direito antes de lidar com ele pelo menos quarenta anos! Oh! bela carreira! bela carreira, que exige quase meio século de estudo para se ficar sabendo dalguma coisa dos seus mistérios!... E, demais, que diabo de vantagem oferece o tal direito?... A magistratura? Deus me defenda! A advocacia? Mas eu detesto os advogados!

- Por que? atalhou o Coruja.

- Ora! Qual é o papel de um advogado, qual é a sua missão? Defender os réus; muito bem! Mas, das duas uma - ou o réu não tem crime e nesse caso está defendido por si; ou o réu é um criminoso, e não menos será aquele que, por meio da eloquência e da astúcia de seu talento, conseguir provar que ele é um inocente!

- Isso é asneira!

- Pois qual é a missão do advogado, senão empregar meios e modos para alterar a favor do seu constituinte o juízo feito pelos jurados? Qual é a missão do advogado, senão convencer a quem supõe um homem estar tão inocente como no dia em que vestiu o seu primeiro par de calças?...

- Enganas-te, acudiu o Coruja; o advogado serve para muitas outras coisas; serve para evitar que um inocente sofra a pena que não merece; serve para...

- Ora qual! interrompeu Teobaldo. O advogado quase nunca se acha convencido da inocência do seu constituinte. Defende-o, porque a sua vida é defender os réus, e para isso lança mão de todos os recursos da oratória e serve-se de todos os laços e armadilhas da retórica!

- Mas...

- Ora! se o advogado, empregando esses meios, consegue dos jurados a absolvição do réu, é um homem pernicioso, porque faz com que aqueles se pronunciem, não pelo seu juízo calmo e refletido, mas sim dominados pelos efeitos sedutores de um bom discurso; e, se o advogado não consegue vencer a opinião dos jurados, será nesse caso um fiador inútil, visto que não adianta absolutamente nada do que estava feito!

- Pois, se o direito te inspira tal repugnância, escolhe então a medicina..."

Teobaldo que nos perdoe, mas o Direito é fundamental. Convictos de nossa crença, conclamamos nossos qualificados leitores - conhecedores como ninguém dos valores da Ciência da Convivência Humana - a defenderam-na honradamente.

Crie uma frase para o personagem Coruja em que expresse a sua visão, ilustre migalheiro, da importância do Direito para a sociedade - seja sob o prisma do juiz, do advogado, do estudioso, do promotor. As cinco melhores frases serão premiadas com um mimo migalheiro. Envie a frase para o e-mail migalhas@migalhas.com.br.

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Aluísio Azevedo

Foi com tenra idade que revelou grande interesse pelo desenho e pela pintura, que acabaria por auxiliá-lo na aquisição da técnica que empregará mais tarde ao caracterizar os personagens de seus romances. Em 1876, embarcou para o Rio de Janeiro, matriculando-se na Imperial Academia de Belas Artes, hoje Escola Nacional de Belas Artes. Para manter-se, fazia caricaturas para os jornais da época, como O Fígaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada. A partir desses “bonecos” que conservava sobre a mesa de trabalho, escrevia cenas de romances.

De volta a São Luís, com a morte do pai, em 1878, deu início à carreira de escritor. Quase todos os jornais da época tinham folhetins, e foi num deles que Aluísio passou a publicar seus romances. A princípio, eram obras menores, escritas apenas para garantir a sobrevivência. Depois, surgiu nova preocupação no universo de Aluísio: a observação e análise dos agrupamentos humanos, a degradação das casas de pensão e sua exploração pelo imigrante, principalmente o português. Dessa preocupação resultariam suas melhores obras, entre elas O Mulato (1881), Casa de pensão (1884) e O cortiço (1890). De 1882 a 1895 escreveu sem interrupção romances, contos e crônicas, além de peças de teatro em colaboração com Artur de Azevedo e Emílio Rouède.

Em 1895 ingressa na diplomacia, passando por Espanha, Japão, Inglaterra, Itália e Argentina. O autor soube aproveitar seus múltiplos talentos de jornalista, caricaturista e diplomata para a criação de romances no qual a coletividade aparece como personagem. E em Buenos Aires, seu último posto diplomático, faleceu há cem anos, a 21 de janeiro de 1913.

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Para brindar a fecunda produção intelectual deste autor, a Editora Migalhas lançou a obra "Migalhas de Aluísio Azevedo", uma seleção minuciosa de 665 frases, pensamentos e aforismos compilados a partir da obra completa do romancista, autor das célebres obras "O Mulato", "O Cortiço" e "Casa de Pensão".

Aluísio Azevedo, por meio de seus personagens, verdadeiros tipos sociais, serviu ao propósito de espelhar a realidade e aguçar a percepção do leitor para a crueza das relações sociais.

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