Quando um bem importado com isenção de impostos é locado antes dos cinco anos previsto no artigo 137 do decreto 91.030/85, os tributos devem ser pagos e são de responsabilidade originária do importador e não do locador. A decisão é da 1ª turma do STJ, em disputa entre uma empresa médica e a Fazenda nacional.
O ministro Francisco Falcão, relator do processo, concluiu haver solidariedade entre o locador e o importador, pois o locador teria interesse comum na situação. "Não obstante, ao lançar o auto de infração, a fazenda nacional não incluiu o responsável tributário principal (o importador), atacando diretamente o locatário", destacou o ministro.
O relator afirmou que o artigo 121 do CTN - Código Tributário Nacional explicita que o sujeito passivo da obrigação é o responsável pelo pagamento do tributo. Já que o responsável pelo imposto de importação é o importador e sendo dele a responsabilidade pela burla à isenção, é contra ele que dever ser emitido o auto de infração.
Falcão apontou que o STJ já reconheceu que a responsabilidade tributária deve ser atribuída ao contribuinte de fato, autor do desvio, e não ao terceiro de boa-fé, como na hipótese dos autos, em que o locador não tem como verificar a origem fiscal do aparelho.
A possibilidade de a Fazenda indicar responsável solidário foi reconhecida pelo ministro Falcão. Entretanto, ele observou, o importador é parte legítima para responder pelo tributo e, por isso, deve constar no auto de infração. "Tanto é assim que o artigo 134 do CTN expressamente dispõe que, nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente os que intervieram ou se omitiram", afirmou.
Considerando que o caso não tratava de solidariedade estrita, a turma seguiu o voto do relator para dar provimento ao recurso especial da empresa, anulando o débito fiscal, de forma que o recurso da Fazenda ficou prejudicado.
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Processo relacioando: REsp 1.294.061
Veja a íntegra do acórdão.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.294.061 - PE (2011/0280430-6)
RELATOR: MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
RECORRENTE: URO UNIDADE DE UROLOGIA LTDA
ADVOGADO: JOAQUIM CORREIA DE CARVALHO JUNIOR E OUTRO(S)
RECORRENTE: FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
RECORRIDO: OS MESMOS
EMENTA
IMPORTAÇÃO DE APARELHO DE ULTRA-SOM DIAGNÓSTICO. LOCAÇÃO SUBSEQUENTE. AUTO DE INFRAÇÃO QUE NÃO INDICA O IMPORTADOR. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA SOLIDÁRIA. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA IRREGULAR.
I - O locatário do bem importado com a especial isenção do artigo 149, III, do Decreto 91.030/85 (Regulamento Aduaneiro) foi responsabilizado pelo Fisco, com supedâneo no artigo 124, I, do CTN. Na hipótese estaria configurada a solidariedade de fato, porquanto estaria o recorrente enquadrado nos termos do artigo primeiro, haja vista que possui interesse comum na situação. Não obstante, ao lançar o auto de infração a Fazenda Nacional não incluiu o responsável tributário principal, atacando diretamente o locatário, que assumiu a responsabilidade em face de seu especial interesse na situação.
II - Conforme explicita o artigo 121 do CTN, o sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento do Tributo. Assim, devendo o tributo de importação ser pago pelo importador decorre que é dele a obrigação principal de pagar pelo tributo e, sendo dele, da mesma forma, a responsabilidade por burlar a isenção e ter contra si auto de infração sob este título. Não se desconhece a possibilidade da Fazenda Nacional indicar responsável solidário, in casu, solidariedade de fato, entretanto, sendo certa a legitimidade do importador para responder pelo tributo, deve ele constar no auto de infração que serve de supedâneo ao crédito tributário. Tanto é assim que o artigo 134 do CTN expressamente dispõe que, nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este aqueles que intervieram ou que se omitiram.
III - Este Superior Tribunal de Justiça, em outras oportunidades, já reconheceu que a responsabilidade tributária deve ser atribuída ao contribuinte de fato, autor do desvio, e não terceiro de boa-fé, como na hipótese dos autos em que o locador não tem a possibilidade de verificar a origem fiscal do aparelho. Precedente: EDcl no AgRg no REsp nº 706.254/RO, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe de 06/05/2008.
IV - Conforme demonstrado o contribuinte originário, na hipótese dos autos, é o importador. Assim, a interpretação de tal dispositivo deixa clara a intenção do legislador de impor ao contribuinte principal a responsabilidade pela obrigação.
V - Em verdade está a se erigir uma nova forma de substituição tributária, porquanto de solidariedade, estritamente, não se trata, haja vista que não há devedor principal inscrito para a vinculação da solidariedade.
VI - Recurso especial da Empresa provido. Recurso especial da Fazenda Nacional Prejudicado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial da contribuinte e julgou prejudicado o recurso da Fazenda Nacional, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Napoleão Nunes Maia Filho e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator. Licenciado o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima.
Brasília (DF), 15 de março de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO: Trata-se de recursos especiais interpostos pela sociedade URO UNIDADE DE UROLOGIA LTDA, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, e pela FAZENDA NACIONAL, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que restou assim ementado, verbis:
TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DE PRODUTO INDUSTRIALIZADO. IPI E IMPOSTO de IMPORTAÇÃO. ISENÇÃO SUBJETIVA. LOCAÇÃO DO BEM ANTES DE DECORRIDOS CINCO ANOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DECISÃO ADMINISTRATIVA.
I - Quando a isenção for vinculada à qualidade do importador, a locação do bem, antes de decorridos cinco anos da efetiva importação, obriga ao prévio pagamento do imposto, a teor do art. 137 do Regulamento Aduaneiro, aprovado pelo Decreto nº 91.030/85.
II – É responsável solidária a pessoa que tenha interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, nos termos do art. 124, I, do CTN.
III - Existindo a solidariedade, o Fisco tem total liberdade para escolher de quem cobrar, podendo, pois, dirigir as suas ações contra todos ou apenas um dos devedores.
IV - Uma vez que o julgamento definitivo no âmbito administrativo foi no sentido de reconhecer o não cabimento de acréscimos moratórios antes da decisão da lide, por não estar ainda definitivamente constituído o crédito tributário, não pode o julgador agravar a situação do contribuinte, para fixar como termo inicial para a incidência de juros moratórios a data do vencimento do crédito tributário.
V – Apelação parcialmente provida.
Opostos embargos declaratórios, restaram rejeitados, com a seguinte ementa:
Processual Civil. Embargos declaratórios atacando omissão em decisão anterior que não teria apreciado a questão atinente à inexistência da figura da solidariedade à falta de outro contribuinte. Julgado embargado que enfrentou a matéria, asseverando que a solidariedade (igualmente a decorrente do CTN, Art. 124, I) não obriga seja feita a cobrança contra todos os devedores (ou responsáveis), senão que permite a cobrança contra qualquer um deles indistintamente; esta a razão pela qual a autuação fiscal pode ser feita contra um dos "solidários" apenas, sem que isso configure vicio de qualquer natureza, f. 350. Inocorrência de omissão, portanto, tanto que, nos novos aclaratórios a embargante se coloca contra a decisão atacada, ao textuar que tal não é possível, por contrário a texto expresso de lei, f. 360. Embargos declaratórios improvidos
São fatos do caso em apreço: a ora recorrente foi inscrita em Dívida Ativa, sendo-lhe atribuída a responsabilidade tributária para recolhimento de Imposto de Importação e de IPI incidentes sobre importação de bem, em regime de isenção, que fora locado antes do prazo de cinco anos previsto no art. 137 do Decreto 91.030/85, ante o uso irregular dos bens por entidade não beneficiada pelo regime. A fiscalização tributária autuou apenas a ora recorrente, responsável-locatária, para que recolhesse os valores devidos a título de IPI e II.
Sustenta a contribuinte que o juízo a quo ofendeu os arts. 535, I e II, do CPC; 124, 142 e 202, I, do CTN; e 896, parágrafo único, do Código Civil. Preliminarmente, pugna pela cassação do acórdão proferido no julgamento dos embargos declaratórios, pois o juízo embargado permaneceu omisso quanto aos argumentos levantados. No mérito, aponta que não existe solidariedade onde não há devedor principal da dívida. Afirma que a CDA é nula, pois não consta como devedor principal o locador do bem importado.
Sustenta a Fazenda Nacional que o juízo a quo violou o art. 161 do CTN. Aduz, em síntese, que os juros moratórios devem ser contados a partir do vencimento do crédito tributário.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO (RELATOR): RECURSO ESPECIAL DO CONTRIBUINTE
Quanto à omissão apontada, não a vislumbro, porquanto o Tribunal a quo, mesmo sem ter examinado individualmente cada um dos argumentos apresentados pelo vencido, adotou fundamentação suficiente para decidir de modo integral a questão controvertida.
Quanto ao mérito, o locatário do bem importado com a especial isenção do artigo 149, III, do Decreto 91.030/85 foi responsabilizado pela Fisco, com supedâneo no artigo 124, I, do CTN.
Na hipótese está configurada a solidariedade de fato, porquanto está o recorrente enquadrado nos termos do artigo primeiro, haja vista que possui interesse comum na situação.
Não obstante, ao lançar o auto de infração a Fazenda Nacional não incluiu o responsável tributário principal, atacando diretamente o locatário, que assumiu a responsabilidade em face de seu especial interesse na situação.
Todavia, conforme explicita o artigo 121 do CTN, o sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento do Tributo. Assim, devendo o tributo de importação ser pago pelo importador, decorre que é dele a obrigação principal de pagar pelo tributo e, sendo dele, da mesma forma, a responsabilidade por burlar a isenção e ter contra si auto de infração sob este título.
Não se desconhece a possibilidade da Fazenda Nacional indicar responsável solidário, in casu, solidariedade de fato, entretanto, sendo certa a legitimidade do importador para responder pelo tributo, deve ele constar no auto de infração que serve de supedâneo ao crédito tributário.
Tanto é assim que o artigo 134 do CTN expressamente dispõe que, nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este aqueles que intervieram ou que se omitiram.
Conforme demonstrado o contribuinte originário, na hipótese dos autos, é o importador.
Assim, a interpretação de tal dispositivo deixa clara a intenção do legislador impor ao contribuinte de direito a responsabilidade pela obrigação.
Este Superior Tribunal de Justiça, em outras oportunidades, já reconheceu que a responsabilidade tributária deve ser atribuída ao contribuinte de fato, autor do desvio, e não terceiro de boa-fé, como na hipótese dos autos em que o locador não tem a possibilidade de verificar a origem fiscal do aparelho.
Nesse diapasão, destaco o EDcl no AgRg no REsp nº 706.254/RO, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe de 06/05/2008, verbis:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – EFEITOS MODIFICATIVOS – CONSTATAÇÃO DE EQUÍVOCO QUANTO À TESE DEFENDIDA NO RECURSO ESPECIAL E QUANTO AO PREQUESTIONAMENTO DOS DISPOSITIVOS TIDOS COMO VIOLADOS – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA (ART. 155, § 2º, X, "b" da CF/88) – DESTINAÇÃO DA MERCADORIA – DESVIO – RESPONSABILIDADE DO COMPRADOR PELO PAGAMENTO DO TRIBUTO.
1. Acolhem-se os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para se conhecer do recurso especial, uma vez constatado o equívoco quanto à tese defendida pelo recorrente e quanto ao prequestionamento desta tese.
2. Posiciona-se esta Corte no sentido de reconhecer que, tratando-se de imunidade tributária condicionada à destinação da mercadoria, se dada destinação diversa responderá pelo tributo o responsável por esta destinação (o comprador) e não o vendedor de boa-fé.
3. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para se conhecer do recurso especial e lhe dar provimento.
Na hipótese dos autos, está a se erigir uma nova forma de substituição tributária, porquanto de solidariedade, estritamente, não se trata, haja vista que não há devedor principal inscrito para a vinculação da solidariedade.
Nesse contexto, deve ser anulado o débito fiscal.
Tais as razões expendidas, dou provimento ao recurso especial da empresa recorrente e julgo prejudicado o recurso especial da Fazenda Nacional.
É o voto.
Brasília (DF), 15 de março de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
Relator