A lei 14.112/20, responsável por renovar as disposições da legislação que cuida dos procedimentos de recuperação e falência de empresários e sociedades empresárias1, trouxe em seu escopo mudanças significativas em relação à legislação pretérita, ainda mais no que concerne aos métodos alternativos de resolução de conflitos.
Embora o estímulo à utilização de tais métodos já ter sido matéria pacificada no ordenamento jurídico brasileiro, a redação original da lei 11.101/05 (LRJF) não previa a aplicação destes institutos aos processos de recuperação e falência, mantendo-se silente nesse aspecto.
Agora, sob a vigência da nova lei, as disposições sobre as conciliações e mediações nos processos de recuperação judicial estão expressamente previstas e incluídas na Seção II-A da LRJF, dispondo sobre o estímulo aos meios alternativos antes e durante o processo de recuperação judicial, inclusive, no âmbito de recursos em segundo grau de jurisdição e nos Tribunais Superiores.
As conciliações e mediações também podem ser admitidas, antecipadamente ou incidentalmente:
- nas fases pré-processual e processual, em que houver disputas entre sócios e acionistas de sociedade em dificuldade ou em recuperação, bem como nos litígios que envolverem credores não sujeitos à recuperação judicial e credores extraconcursais;
- nos conflitos que envolverem concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial e órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais;
- nas hipóteses de haver créditos extraconcursais contra empresas em recuperação judicial durante período de vigência de estado de calamidade pública, a fim de permitir a continuidade da prestação de serviços essenciais;
- na hipótese de negociação de dívidas e respectivas formas de pagamento entre a empresa em dificuldade e seus credores, em caráter antecedente ao ajuizamento de pedido de recuperação judicial.
Entretanto, conforme o art. 20-B, § 2º, ficam vedadas as conciliações e mediações que versem sobre a natureza jurídica e a classificação de créditos, bem como sobre critérios de votação em assembleia-geral de credores.
A lei 14.112/20 também prevê a possibilidade das audiências de conciliação e mediação serem realizadas virtualmente, desde que o tribunal competente ou a câmara especializada possua os meios adequados para sua realização. Havendo acordo entre as partes, o juiz competente deverá realizar a homologação para que as partes cumpram com o estabelecido.
Todavia, nos casos de conciliação ou mediação pré-processual, cabe a ressalva que se houver pedido de recuperação judicial em até 360 dias do acordo firmado, o credor terá reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito desses procedimentos, segundo art. 20-C, caput e parágrafo único.
Os artigos da nova lei, além de incentivarem a aplicação, também reforçam a eficácia dos meios alternativos. A título de exemplo, no artigo 6º, § 9º, há também a previsão de que “o processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção de arbitragem, não impedindo ou suspendendo a instauração de procedimento arbitral”. Isso impõe ao administrador judicial a obrigação de respeitar a convenção de arbitragem, que deve prosseguir até o estabelecimento de quantia certa, não se sujeitando ao período legal de suspensão das ações contra a empresa devedora, por 180 dias (stay period)2.
A nova normativa, portanto, alinha-se com os ideais do Estado de promover, sempre que possível, a pacificação dos conflitos, oferecendo a todos, pessoas físicas e jurídicas, métodos alternativos que auxiliem na busca de soluções consensuais, de forma célere e segura.
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1- Lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005.
2- Artigo 6º, § 4º, da Lei 14.112, de 24 de dezembro de 2020.