Neste trabalho serão estudados os aspectos referentes à capacidade das pessoas com deficiência, como era tratado e como passa a ser, em função das recentes alterações na legislação brasileira.
O grande desafio se dá quanto à observância da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU de 2007 (Decreto Federal 6.949/09), pela ruptura do modelo adotado no Brasil que, de certa forma, estigmatiza a pessoa com deficiência através da adoção de meios de efetiva inclusão da pessoa com deficiência na sociedade, garantindo a convivência entre os atores sociais com e sem deficiência.
Essa mudança paradigmática exigiu uma completa reformulação do sistema brasileiro, inclusive com a mudança do modelo exclusivamente biomédico da deficiência. As terminologias utilizadas na legislação e na área médica baseada exclusivamente no Código Internacional de Doenças – CID1, que serve de referência para as equipes multidisciplinares que emitem os laudos médicos nos atendimentos de pessoa com deficiência, foram alteradas para o Código Internacional das Funcionalidades – CIF2.
A aludida Convenção também introduz novo conceito de deficiência, considerando o modelo social baseado em direitos humanos. Assim, a deficiência não mais se encontra somente na pessoa, mas aparece na interação com fatores e barreiras existentes no ambiente, senão vejamos:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas (artigo 1º da Convenção – grifou-se).
Cumpre destacar que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU de 2007, conforme dispõe o artigo 5º, §3º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, por se tratar de convenção internacional sobre direitos humanos, e sendo aprovada em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, tem equivalência à emenda constitucional.
Neste ponto, cabe ressaltar que a Lei Brasileira de Inclusão (LBI)3 utiliza redação semelhante em seu artigo 2º. Destaca-se nas origens da Lei Federal 13.146/15, a homologação da Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência.
Trata-se do primeiro Projeto de Lei da Câmara dos Deputados a ser traduzido para Libras (Língua Brasileira de Sinais) durante sua discussão. Seu texto preliminar ficou sob consulta pública no portal "e-democracia", mantido pela Câmara dos Deputados, por cerca de seis meses. Por meio deste canal foram encaminhadas cerca de mil propostas. A consulta pública virtual no portal "e-democracia" foi feita de uma forma que pessoas com deficiência visual conseguissem acessar e também pudessem contribuir.
Por fim, foi sancionada no ano de 2015, após 15 anos de tramitação, com vigência a partir de 02 de janeiro de 2016 com mudanças em várias áreas. É um real avanço na inclusão de pessoas com deficiência na sociedade. Um dos principais pontos desta lei é o seu objetivo de "mudar a visão sobre o conceito de deficiência", que deixa então de ser atribuída à pessoa e passa a ser vista como consequência da falta de acessibilidade que não só o Estado, mas a sociedade como um todo apresenta.
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1 A sigla CID designa a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (em inglês: International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems – ICD) e fornece códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade de sintomas, aspectos anormais, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos ou doenças.
2 A sigla CIF é um sistema novo de classificação inserido na Família de Classificações Internacionais da Organização Mundial de Saúde (World Health Organization Family of International Classifications – WHO- FIC), constituindo o quadro de referência universal adotado pela OMS para descrever, avaliar e medir a saúde e a incapacidade quer ao nível individual quer ao nível da população.
3 Lei Federal 13.146/15.
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*Caio Silva de Sousa é bacharel em Direito, professor de Direito Constitucional, Direito Processual Civil. Mestrando em Direito Público e Evolução Social. Secretário Geral da Comissão de Defesa de Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB/RJ e advogado.