As associações de moradores alcançam cada vez mais espaço nos condomínios horizontais e loteamentos, em uma constante busca por maior segurança e pela conservação do patrimônio particular. Tratam-se, em geral, de proprietários ou residentes de um determinado limite geográfico que envidam esforços para introduzir melhoramentos em sua infraestrutura, preservar interesses convergentes e implementar benfeitorias nem sempre garantidas pelo Poder Público.
Apesar de a ideia inicial remeter à união e ao espírito de coletividade de determinada comunidade, muito se discute acerca da legitimidade de tais associações, notadamente no que tange à cobrança de mensalidades para a manutenção de suas atividades e à execução do objeto por elas proposto. Muitas vezes, as referidas associações referem-se ao trabalho por elas desenvolvido como sendo de administração de “condomínio atípico”, o que agrava as discussões.
Os condomínios existentes em nosso ordenamento jurídico são os estabelecidos pela Lei n° 4.591/1964 e pelo artigo 1.314 do Código Civil, sendo que “fora daí o que existe é o uso vulgar da expressão, como no caso em que moradores de um mesmo local resolvem associar-se para cuidar de interesses comuns”1. Nesse sentido, inexistindo o caráter legal de condomínio, não é possível exigir de quem não seja associado, nem tenha aderido ao ato que instituiu o encargo, o pagamento de taxas de manutenção e melhoria2.
Por outro lado, deve-se levar em conta que, enfatizando o sentido de comunhão dos condomínios atípicos e o princípio constitucional da solidariedade3, não seria coerente que aquele que não deseja participar da associação seja diretamente beneficiado com a valorização do seu imóvel. Nas palavras do antigo Ministro Waldemar Zveiter4 - e entendimento já compartilhado pela Ministra Nancy Andrighi5-: não se afigura justo, nem jurídico, que um participante, aproveitando-se do "esforço" dessa comunhão e beneficiando-se dos serviços e das benfeitorias realizadas e suportadas pelos outros condôminos, dela não participe contributivamente.
Malgrado o entendimento predominante do Superior Tribunal de Justiça seja quanto a validade da cobrança de mensalidade apenas dos associados, posição esta notadamente defendida pela 2ª Câmara, o Tribunal de Justiça de São Paulo vem decidindo em sentido contrário, ou seja, pela exigibilidade do pagamento das mensalidades também dos moradores não associados, em virtude da vedação ao enriquecimento ilícito existente na legislação pátria.
De acordo com o entendimento do Tribunal paulista, as contribuições dos proprietários de loteamentos e condomínios atípicos são necessárias para a sua manutenção, sendo legítima a exigência de participação pecuniária independentemente de o dono do lote ser associado ou não da entidade coletiva6. Assim, por se tratar de serviços prestados e usufruídos por todos os moradores/proprietários de determinado limite geográfico, a obrigação se aplica a todos os beneficiários7 independentemente do ânimo associativo.
No mesmo sentido, a Procuradoria Geral da República8 entendeu que o cerne da questão estaria vinculado à existência de interesse comum de moradores em implementarem infraestrutura e serviços em benefício de uma coletividade, independentemente de tratar-se de condomínio nos termos estritos da lei. Assim, não obstante o direito constitucional à livre associação, não seria razoável que o interesse particular daquele que se recusa a contribuir prevaleça sob o interesse coletivo.
Em conclusão, resta claro que a questão da obrigatoriedade ou não do pagamento de mensalidade pelos moradores de condomínios horizontais e loteamentos não está pacificada nos Tribunais Estaduais e Superiores. Contudo, cabe o alerta para aqueles que eventualmente possam ser demandados judicialmente ao pagamento das mencionadas “taxas de manutenção e contribuição”, uma vez que a sua exigibilidade poderá vir a ser confirmada a qualquer tempo em razão dos precedentes existentes.
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1 Resp n. 51912, Min. Rel. Eduardo Ribeiro, Terceira Turma, Julgado em 29/08/1994 DJe 10/10/1994.
2 AgRg nos EDcl no REsp 1279017/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/04/2012, DJe 17/04/2012
3 Art. 3O, inc. I, CF/1988.
4 REsp 139.952/RJ, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/1999, DJ 19/04/1999, p. 134
5 AgRg no REsp 490.419/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/06/2003, DJ 30/06/2003, p. 248
6 Apel. 0036664-67.2009.8.26.0405, Des. Relator Roberto Maia, 10ª Câmara de Direito Privado, TJSP, Pub. D. O 14/02/2014
7 Apel. 0002703-07.2006.8.26.0126, Des. Relator José Joaquim dos Santos, 2ª Câmara de Direito Privado, TJSP, Pub. D.O 13/02/2014.
8 Procurador Janot Monteiro de Barros. Parecer Procuradoria Geral da República no Recurso Extraordinário n. 695.911. , Pub. D.O 18/04/2013.
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* Carolina Barros Pires dos Santos é advogada do escritório Chenut Oliveira Santiago Sociedade de Advogados.