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O olhar econômico de Euclides da Cunha

1929, 2009 – Oitenta anos separam as duas maiores crises econômicas que o mundo já viu. Ambas protagonizadas pelos EUA e irradiadas para todos os demais países, como num efeito dominó.

22/6/2009

O olhar econômico de Euclides da Cunha

O mundo em crise

Atento observador do cenário internacional, Euclides da Cunha não deixou de notar, muitos anos antes, que uma crise econômica se desenhava no mundo.

Com efeito, como veremos abaixo, ele já tratava das questões que desembocaram na crise de 1929.

Aliás, Euclides da Cunha participou ativamente de um dos agravadores da condição econômica brasileira desse período. De fato, a Guerra de Canudos deixou sequelas na combalida economia tupiniquim.

1929, 2009

Oitenta anos separam as duas maiores crises econômicas que o mundo já viu. E ambas protagonizadas pelos EUA. Se a atual crise econômica mundial configura-se a crise do crédito – causada pelo agravamento da situação de inadimplência no segmento de hipotecas de risco – a de 1929 ficou conhecida como a crise da superprodução.

Canudos

O Brasil dos primeiros anos da República era um país com estrutura econômica arcaica, baseada apenas no café, e um retrógrado sistema financeiro. Para mudar o cenário, Rui Barbosa, que era à época ministro da fazenda, adotou medidas para estimular a industrialização e o desenvolvimento do país. Esse período, chamado de encilhamento, durou de 1889 a 1892.

Assim, foram abertas linhas de crédito para investimentos, fazendo crescer demasiadamente a oferta monetária sem que houvesse preocupação com a relação lastro-ouro, o que terminou por gerar grande inflação. "A moeda se depreciava cada vez mais. (...) A situação para o governo foi se tornando insustentável, pois ele precisava pagar, em moeda estrangeira, os juros das dívidas externas"1.

"A todas essas dificuldades, veio acrescentar-se a campanha militar dos Canudos, que gerou novos gastos."2

Em momentos de dificuldade econômica, tudo o que o governo não precisava era ter de empreender dinheiro em campanhas militares. Entretanto, havia em 1896-1897 o incômodo arraial de Canudos. Não foi possível fugir à luta, e os gastos com as expedições agravaram ainda mais a situação nacional.

A crise de 1929

Os primeiros anos da República são marcados, também, pela ascensão oligárquica. O Brasil ainda era um país fundamentalmente agrícola e o produto base era o café. E assim foi até que, em 1906, fizeram-se sentir os primeiro sinais de superprodução, que culminaria numa grande crise para o país. Sobre os produtores de café, o economista R. Haddock Lobo observa que eles "argumentavam mais ou menos da seguinte maneira: ‘desde que podemos impor os preços, e desde que o café constitui a base de nossa economia, claro está que, quanto mais caro for vendido, mais rico ficará o país"3.

Entretanto, não se considerava que quase todo o café exportado pelo Brasil era de qualidade inferior ao de diversos países. Não demorou muito e os concorrentes perturbaram o escoamento das colheitas brasileiras.

O governo interveio no mercado continuamente até 1929 : "precisamente nesse momento, inúmeras plantações (iniciadas na fase da alta) atingiram sua capacidade máxima de produção, e verificou-se grande excesso de nossos estoques sobre o que era possível exportar"4. O que se seguiu foi uma grande queda do preço do café e dos recursos estrangeiros no país – desastre nacional.

Digno de nota é que em 1909, 20 anos antes da crise estourar, Euclides da Cunha já dizia que "o excesso da produção agrícola [..] sendo o traço mais vivo da atividade contemporânea [...] gera um desequilíbrio crescente, de efeitos tão funestos, que ameaçam desfechar na anomalia de uma sociedade prejudicada pelo seu próprio desenvolvimento"5

E não é que desfecharam...

Na próxima matéria, vamos mergulhar na lógica jurídica que prevalecia no arraial de Canudos e entender como eram tratadas as relações de trabalho na época.

É amanhã, no Migalhas !

________________

1LOBO, R. Haddock. História econômica e administrativa do Brasil. 5ª edição. São Paulo: Melhoramentos: 1959. p. 1333-134.

2LOBO, R. Haddock. História econômica e administrativa do Brasil. 5ª edição. São Paulo: Melhoramentos: 1959. p. 1333-134.

3LOBO, R. Haddock. História econômica e administrativa do Brasil. 5ª edição. São Paulo: Melhoramentos: 1959. p. 144.

4LOBO, R. Haddock. História econômica e administrativa do Brasil. 5ª edição. São Paulo: Melhoramentos: 1959. p. 144.

5 CUNHA, Euclides da. À Margem da História. Portugal - Porto: Editora Lello Brasileira S.A., 1967. p. 157.

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