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STF analisa ADPF das Favelas contra letalidade policial

Apresentada pelo PSB, a ação responde à demanda por políticas de segurança pública mais humana.

13/11/2024

Nesta quarta-feira, 13, STF começou a analisar, em sessão plenária, a chamada "ADPF das favelas". A ação visa a diminuição da letalidade policial no Estado do Rio de Janeiro.

A sessão desta tarde foi destinada às sustentações orais e oitiva de amici curiae. O julgamento foi suspenso para que os ministros possam refletir após as manifestações em plenário e será retomado oportunamente.

Caso

Trata-se de ação apresentada em 2019 pelo PSB pleiteando que o Estado do RJ apresente plano de redução de letalidade policial.

À época, o partido questionava a política de segurança pública adotada pelo então governador Wilson Witzel, do Rio de Janeiro.

Segundo a legenda, a política adotada estimula o conflito armado e "expõe os moradores de áreas conflagradas a profundas violações de seus direitos fundamentais". 

Estado de coisas inconstitucional

Em sustentação oral, o professor Daniel Sarmento, representando o PSB, defendeu que os pedidos na ADPF são essenciais para estender a democracia e o respeito à Constituição a áreas historicamente negligenciadas, como as favelas e periferias majoritariamente negras do Brasil. 

Sarmento destacou a desigualdade no tratamento da segurança pública, observando que, enquanto em bairros de elite a polícia respeita a inviolabilidade do domicílio, nas favelas, "a polícia entra como e quando quiser".

O professor enfatizou o racismo institucional ao citar que 87% das vítimas de mortes violentas em 2023 eram pessoas negras, com uma faixa etária predominantemente jovem — 54% entre 12 e 24 anos, e mais de três quartos com menos de 30 anos. 

Afirmou que em vez de oferecer educação e oportunidade, entrega-se bala, terror e morte, mencionando casos de jovens como Ágatha Félix, Eloá Passos, João Pedro Matos e Kethlen Romeu, vítimas de operações policiais, cuja única diferença era, segundo ele, "morar no CEP errado" ou, como descreveu Luiz Gama, "ter um defeito de cor".

Sarmento desmentiu as acusações de que a ADPF favoreceria facções criminosas no Rio de Janeiro. Ele criticou o governo do Rio de Janeiro por utilizar o STF como "bode expiatório" para sua incapacidade de combater a criminalidade organizada, destacando a relação entre violência policial, crime, milícias e corrupção. 

Para Sarmento, controlar mais a polícia, estabelecer monitoramento é enfrentar o crime e não o favorecer, ressaltando a necessidade de manter a supervisão das medidas cautelares determinadas pela ADPF, as quais têm reduzido significativamente a letalidade policial.

Segundo Sarmento, a situação no Rio de Janeiro ainda reflete um estado de coisas inconstitucional, com índices de letalidade policial 74% superiores à média nacional. A seu ver, sem o monitoramento, o Estado não demonstrará avanços consistentes, citando a chacina de 2021, em que 28 pessoas foram mortas na operação Except. 

Ele defendeu que a meta de redução de 70% na letalidade policial deve ser central, conforme as propostas do grupo de trabalho Polícia Cidadã e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Por fim, Sarmento refutou a fake news de que a ADPF impediria operações policiais, explicando que o PSB jamais pleiteou a proibição total das operações. 

O que foi solicitado, segundo ele, é que elas sigam o princípio da proporcionalidade, evitando operações rotineiras e banais que tornam a vida nas favelas "infernal".

Para ele, as ações policiais devem ser monitoradas pela sociedade civil, especialistas e pelo STF, enquanto agentes envolvidos em casos de letalidade policial devem ser temporariamente afastados para tratamento psicológico e treinamento adicional.

Veja trecho da sustentação:

Determinações cumpridas

Em defesa do Estado do Rio de Janeiro, o procurador-geral Renan Miguel Saad argumentou que a atual gestão do governo fluminense, ao contrário da anterior, respeita as decisões da Corte e trabalha para reduzir a letalidade policial.

Afirmou que o cenário de crise de segurança pública que motivou a ADPF foi intensificado pelo comportamento exacerbado do antigo governante no uso da força, mas que a gestão atual se pauta pelo respeito às orientações do STF.

Saad criticou a imposição de metas e índices específicos para a segurança pública, alegando que o tema possui uma complexidade impossível de ser conduzida pela Corte com precisão.

Ele defendeu que o papel do STF é indicar parâmetros e que o governo do Rio os cumpriu, especialmente no quesito de planejamento, argumentando que a redução da letalidade policial se deu pela organização da atividade e não pela restrição ao uso da força.

O procurador questionou alguns pontos defendidos pelo PSB, considerando-os incompatíveis com a harmonia dos Poderes, como a exigência de afastar agentes envolvidos em confrontos armados para funções administrativas.

Segundo Saad, o que reduz as mortes é o planejamento e não a diminuição da atividade policial, e apontou que o monitoramento das ruas é mais eficiente para a segurança do que o uso de câmeras nos uniformes dos policiais.

Sobre o conceito de excepcionalidade nas operações policiais, Saad defendeu que este deve se aplicar ao uso de armamento e não às operações em si. Para ele, a aplicação errônea da excepcionalidade afastou a polícia da visão da comunidade e motivou a criminalidade, agravando o problema da violência em bairros do Rio.

O procurador também ressaltou que o problema do Rio de Janeiro é nacional e criticou a falta de atuação mais robusta da União no combate ao crime organizado, pedindo um pacto federativo para repartir responsabilidades com Estados e municípios.

Renan Miguel Saad finalizou afirmando que o Estado do Rio de Janeiro cumpriu todos os itens ordenados pelo STF. Embora exista divergência sobre o grau de cumprimento, ele enfatizou que é incorreto afirmar que o Estado não acatou as diretrizes da Corte.

Veja parte da fala:

Sangue de crianças negras

Durante o julgamento, o advogado Djefferson Amadeus de Souza Ferreira, representando o amicus curiae IDPN - Instituto de Defesa da População Negra, manifestou-se contra o racismo estrutural e a violência estatal que atinge o Rio de Janeiro declamando um poema.

Tramitação

Em junho de 2020, o relator, ministro Edson Fachin, determinou a suspensão de operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro, durante a pandemia, salvo em casos absolutamente excepcionais, que deveriam ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente e comunicadas ao MP/RJ.

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A decisão monocrática de Fachin foi confirmada pelo plenário do STF em agosto de 2020. 

Em dezembro de 2021, o plenário começou a julgar embargos contra a referida decisão. Ministro Edson Fachin e Alexandre de Moraes propuseram medidas para reduzir a letalidade policial. A diferença dos votos se deu na extensão das medidas - Alexandre de Moraes não referendou algumas propostas do relator. 

Em fevereiro 2022, os ministros confirmaram diversas medidas propostas por Edson Fachin, tais como (i) plano feito pelo Estado do RJ, em 90 dias, para a redução da letalidade policial; (ii) criação do Observatório Judicial sobre Polícia Cidadã e (iii) prioridade nas investigações de incidentes que tenham como vítimas crianças e adolescentes.  

Em dezembro daquele ano, Fachin determinou que o Estado do RJ apresentasse cronograma para instalação de câmeras em fardas e viaturas dos batalhões especiais das polícias (Bope e Core) e nas unidades policiais das áreas com maior índice de letalidade policial. 

Em maio de 2023, os embargos foram para plenário virtual. Naquela ocasião, Fachin proferiu voto em 11 determinações. Dentre elas:

À época, o debate foi interrompido por pedido de vista de Moraes. 

Vale lembrar que, no interregno, ocorreu a operação policial na Favela do Jacarezinho, que resultou em 28 mortes. 

Em 2024, Fachin, visitou o MP/RJ para analisar a atuação do órgão em políticas públicas de segurança e discutir o cumprimento das decisões da ADPF.

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