Delegado da Polícia Civil é condenado à prisão e à perda do cargo após dirigir bêbado e cometer os crimes de lesão corporal, calúnia, resistência, desacato e ameaça na cidade de Aurora/CE. Sentença é do juiz de Direito José Gilderlan Lins, da vara única de Aurora/CE, que ressaltou a gravidade das ações do delegado, sua prepotência e mau exemplo.
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No caso, o delegado dirigia sob o efeito de álcool quando colidiu com uma mureta. Em seguida, abordou um motociclista que passava pelo local, proferindo xingamentos e iniciando perseguição.
O motorista da moto caiu e, ao tentar recuperar o veículo, foi fisicamente atacado pelo delegado. Quando testemunhas tentaram intervir também foram atacadas, com tapas e socos.
A PM foi acionada e o delegado resistiu à abordagem, proferindo ameaças e calúnia contra os agentes policiais e urinando na viatura.
Na delegacia, as violências continuaram. Um advogado, que representava duas das vítimas, também foi alvo de ameaças e ofensas.
Além disso, a esposa do delegado, que estava grávida, passou mal durante o ocorrido e precisou ser socorrida pelo SAMU - Serviço de Atendimento Móvel de Urgência. O delegado atacou a profissional de saúde que atendia sua esposa, afirmando, em tom pejorativo, que a enfermeira não passava de uma "funcionária pública".
As investigações revelaram que o acusado também tentou coagir testemunhas a mudarem seus depoimentos acerca do ocorrido.
Defesa
Em sua defesa, o delegado afirmou que o motociclista era suspeito em um caso que investigava e disse que a colisão ocorreu quando ele tentou abordar o suspeito.
Também afirmou que ao descer do carro foi confundido e atacado por populares. Ele negou ter consumido bebida alcóolica, mas admitiu ter cometido excesso ao lidar com os policiais.
A defesa do delegado solicitou, ainda, a instauração de incidente de insanidade, argumentando que o estado mental do acusado poderia ter influenciado sua conduta.
Ao proferir a sentença, o magistrado avaliou que a ingestão de bebida alcoólica foi comprovada e foi a causa determinante para o acidente.
Quanto à alegação de insanidade, o juiz entendeu que "inexiste qualquer informação que leve a crer que a conduta atribuída ao requerente fora praticada à glosa de caso fortuito ou força maior, muito menos que a embriaguez fora completa e acidental".
Destacou que o delegado não tinha autoridade para abordar o motociclista, pois não exerce a função de guarda de trânsito.
"Em sua posição de autoridade pública (delegado de polícia), o réu, nas cidades em que atuou/atuava, tinha o dever de zelar pelo cumprimento da lei penal, mas, ao contrário, deu um péssimo exemplo [...].", afirmou o juiz.
Além disso, ressaltou a gravidade das agressões, mencionando que uma das pessoas agredidas desenvolveu inflamação no ouvido como consequência da violência.
“Também não há dúvidas que houve humilhação da funcionária pública, que se calou, diante dos gritos e frases abjetas vociferados pelo acusado, ditas com o propósito de humilhar a profissional, que assim se sentiu, tanto que, após o fato, pediu demissão do cargo que ocupava há 10 anos, e, até a audiência de instrução, encontrava-se abalada, em tratamento psicológico e psiquiátrico”, declarou o juiz.
Pena
O delegado foi condenado a nove anos, seis meses e cinco dias de prisão pelos crimes de lesão corporal, calúnia, ameaça, dirigir sob efeito de álcool, resistência à prisão e desacato.
"Os motivos das ações delituosas contra os servidores públicos (Policiais, Advogado e Servidora do SAMU), envolvendo crimes de calúnia, resistência, ameaça e desacato, derivaram da prepotência do Réu, que sistematicamente tentou descreditar o digno trabalho das vítimas, motivado por razões fúteis como blindagem subjetiva e arrogância. Portanto, em todos os crimes, existem fundamentos suficientes para a exasperação da pena."
A pena deverá ser cumprida, inicialmente, em regime semiaberto. O delegado poderá recorrer da decisão em liberdade.
O magistrado também determinou a perda imediata do cargo do delegado e o pagamento de R$ 67 mil em indenizações às vítimas, além da suspensão do direito de dirigir por dois anos.
- Processo: 0207041-83.2023.8.06.0293
Veja a sentença.