O STF começou a julgar pedidos de indenização por danos morais propostos por magistrados contra jornal e jornalistas por reportagem relacionada aos valores recebidos de forma supostamente ilegal pelos juízes e promotores do Paraná. Até o momento, votou a ministra Rosa Weber, relatora, para quem é legítima a divulgação de salários recebidos por servidores.
O caso está em plenário virtual com data prevista para terminar dia 29.
A reclamação foi apresentada pela Editora Gazeta do Povo e por cincos jornalistas/editores envolvidos nas matérias, ressaltando o interesse público da sociedade na livre circulação das informações e do direito de informação sem autocensura.
Na reportagem, indicou-se a remuneração especificamente recebida por cada um dos magistrados do Estado do Paraná em 2015, que em muitos casos foi muito superior ao teto constitucional. A reportagem levava o título "Os meritíssimos construíram um triplex com o nosso dinheiro".
A primeira matéria foi publicada em 15 de fevereiro de 2016 em sua edição online e, na sequência, na edição impressa do dia seguinte, houve a reportagem que tinha por objetivo expor e debater o sentido do "teto constitucional", em contraste com a remuneração recebida por juízes e promotores de Justiça do Paraná.
Na terceira edição, foi publicada coluna opinativa que aprofundou e contextualizava a discussão. Tanto a reportagem como a coluna opinativa foram acompanhadas de charges, que ilustravam o sentido da crítica e do debate empreendidos pela reportagem.
Segundo os autos, depois da matéria, multiplicaram-se ações indenizatórias em diversas comarcas, com texto padronizado. Em razão da grande quantidade de audiências designadas, a editora estava arcando com os custos de deslocamento dos réus e advogados e da remuneração dos profissionais envolvidos.
Ainda em 2016, a ministra Rosa Weber suspendeu liminarmente todas a ações movidas pelos magistrados contra o jornal e os jornalistas após o surgimento de um áudio em que o autor de uma das ações afirmava que alguns juízes foram mobilizados para ingressar com ações, cogitando-se que o número alcançaria 200 magistrados.
Interesse público
Agora, analisando o caso em plenário virtual, a ministra ressaltou que quando em confronto o direito à honra e à imagem das pessoas com o interesse público, a preservação da livre manifestação do pensamento guarda proeminência com relação aos requerimentos de proteção do interesse individual.
S. Exa. ressaltou que o STF já decidiu, inclusive sob a sistemática de repercussão geral, que a divulgação nominal e detalhada de salários recebidos por servidores não viola a intimidade ou a vida privada, uma vez que os dados são de interesse público, tendo sido registrado que "sendo legítima a publicação, dela não decorre dano moral indenizável".
Segundo Rosa, ficou evidenciado o manejo coordenado de inúmeras ações de indenização idênticas. A ministra analisou sentença condenatória em uma das ações em que foi imputado aos jornalistas o dever de reparar suposto dano decorrente de publicação de matéria jornalística, sob o fundamento de que "ultrapassado o dever de simplesmente informar e narrar fatos".
Para a ministra, tal raciocínio decisório, além de frontalmente contrário aos preceitos basilares da Constituição, ofende o que já foi decidido pelo STF.
"Com efeito, consoante os precedentes paradigmáticos, o papel da imprensa não se reduz a aspecto meramente informativo e imparcial. Ou seja, o direito de crítica compõe o regular exercício do direito de informação. Além disso, é firme a orientação desta Suprema Corte, no sentido de que legítima a divulgação de salários recebidos por servidores."
A ministra ainda observou que foi exercitado o direito de resposta e, assim, não haveria razão para imposição de indenização.
Diante disso, votou para cassar a decisão condenatória e extinguir as demais ações indenizatórias, inclusive a que houve a sentença.
Veja o voto da relatora.
- Processo: Rcl 23.899