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STF: Maioria responsabiliza jornal por entrevistado que imputou crime

Ministros ainda não formaram maioria na tese de repercussão geral a ser fixada.

11/7/2023

Em plenário virtual, o STF julga recurso no qual se discute se jornal deve pagar indenização por danos morais em razão da publicação de entrevista que imputa prática de ato ilícito a determinada pessoa.

Já há maioria formada no sentido de condenar o veículo de comunicação a pagar indenização. Ministros consideraram que, à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação e a empresa jornalística deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.

Ainda não há maioria na tese de repercussão geral a ser fixada.

O julgamento deve ser encerrado no dia 7 de agosto.

STF discute liberdade de expressão e direito a indenização por danos morais.(Imagem: Freepik)

Entenda

O ex-deputado Federal Ricardo Zarattini Filho ajuizou ação contra jornal Diário de Pernambuco S.A., alegando que matéria jornalística lhe teria imputado falsamente o cometimento de crime. Enfatizou que nem ao menos lhe foi dado o direito de se manifestar a respeito da matéria, o que ofendeu sua honra, intimidade e privacidade.

Consta nos autos que em dezembro de 1968, quando foi preso em Recife pela prática de crime político, um delegado, sem qualquer prova ou indício, divulgou que o ex-parlamentar seria um dos responsáveis pelo atentado à bomba, ocorrido em 25 julho de 1966 no Aeroporto de Guararapes.

A 1ª instância julgou o pedido procedente. A decisão foi reformada pelo TJ/PE, que assentou a ausência do dever de indenizar por parte da empresa, ao entender que a publicação tratava de entrevista de terceiro e que o meio de comunicação deixou de se manifestar quanto ao conteúdo. 

Já no STJ, a 3ª turma julgou procedente o pedido de indenização, compreendendo que os direitos à informação e à livre manifestação do pensamento não possuem caráter absoluto.

Dessa decisão, o jornal interpôs o recurso extraordinário dirigido ao STF.

Liberdade de expressão

O relator, ministro aposentado Marco Aurélio, votou por reformar a decisão e julgar improcedente o pedido de indenização.  Para S. Exa. “à liberdade de expressão estabelece ambiente no qual, sem censura ou medo, várias opiniões e ideologias podem ser manifestadas e contrapostas, caracterizando processo de formação do pensamento da comunidade política”.

Ao analisar o caso concreto, o ministro não observou excessos na publicação realizada pelo jornal, na qual não foi emitida opinião que influenciasse os leitores. Para o ministro, em um Estado Democrático de Direito, a publicação de uma entrevista, por si só, não pode ser objeto de indenização e sim, quando a divulgação é feita de maneira abusiva e violenta. Neste sentido, S. Exa. fixou a seguinte tese:

"Empresa jornalística não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa."

A ministra Rosa Weber seguiu o voto do relator.

Divergências

O ministro Edson Fachin abriu a divergência. Para S. Exa., o regime jurídico de proteção da liberdade de expressão garante, por um lado, a impossibilidade de censura prévia, e, por outro, a possibilidade de que os direitos da personalidade se façam respeitar, a posteriori, através de responsabilização civil e penal.

No entendimento do ministro, a liberdade de imprensa goza de um regime de prevalência, sendo exigidas condições excepcionais para seu afastamento quando em conflito com outros princípios constitucionais. "Para além da configuração de culpa ou dolo do agente, é necessário também que as circunstâncias fáticas indiquem uma incomum necessidade de salvaguarda dos direitos da personalidade", completou.

Com estas considerações, S. Exa. defendeu a tese de que "somente é devida indenização por dano moral pela empresa jornalística quando, sem aplicar protocolos de busca pela verdade objetiva e sem propiciar oportunidade ao direito de resposta, reproduz unilateralmente acusação contra ex-dissidente político, imputando-lhe crime praticado durante regime de exceção".

Na análise do caso concreto, o ministro concluiu que o veículo não examinou o potencial lesivo da informação divulgada, nem tampouco empregou os mecanismos razoáveis de aferição da veracidade das informações. Por isso, negou provimento ao recurso. 

A ministra Cármen Lúcia seguiu a divergência.

Também em voto divergente, Alexandre de Moraes destacou que não se tratava de um fato inédito em que ainda se apuravam as responsabilidades; pelo contrário, sobreleva notar que o acontecimento já estava coberto pelo manto da anistia.

Para Moraes, o veículo de comunicação atuou com negligência ao publicar a entrevista concedida por terceiro, sem, ao menos, ouvir o imputado.

"Não merece relevo a circunstância de o jornal não ter emitido juízo de valor sobre as declarações do entrevistado, o silêncio, às vezes, pode ser mais eloquente do que muitas palavras. Não se está aqui a cuidar de censura prévia, mas sim de reconhecer a posteriori a responsabilidade civil da empresa jornalística."

Assim, votou por negar provimento ao RE, fixando a seguinte tese:

"A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, não permitindo qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas."

O voto de Moraes foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux.

Em uma terceira corrente, ministro Luís Roberto Barroso sugeriu a seguinte tese para o RE:

“Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) deixar de observar o dever de cuidado na apuração da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.”

No caso concreto, entendeu que a entrevista com a imputação da autoria de atentado foi publicada quase 30 anos após os fatos e havia, à época da publicação, diversos indícios concretos de que o ofendido não participara do crime.

“Além disso, não foi concedido direito de resposta nem feita qualquer ressalva a respeito de se tratar de imputação não comprovada e, no mínimo, controvertida. À luz da moldura fática estabelecida pelas instâncias de origem e dos parâmetros fixados, entendo que, excepcionalmente, deve haver a responsabilização do veículo.”

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