Nos últimos dias, muito se falou sobre a MP 1.150/22, conhecida como MP da Mata Atlântica. Com efeito, a polêmica veio à tona após a Câmara dos Deputados inserir “jabutis” no texto originário, desvirtuando o objetivo de proteger o meio ambiente.
Para entender passo a passo como isso se deu, Migalhas foi ouvir uma referência em Direito Ambiental, o advogado Édis Milaré, fundador do Milaré Advogados. Para ele, esses “jabutis” são de um retrocesso sem conta. “Os nossos representantes maiores estão esquecendo o valor que esse bioma tem para todos os brasileiros”, afirmou.
Tramitação
A MP da Mata Atlântica foi editada no final de 2022, ainda no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Originalmente, a medida tratava somente da prorrogação por 180 dias do prazo para que proprietários de imóveis rurais aderissem ao PRA - Programa de Regularização Ambiental.
Com a prorrogação do prazo, a pedido de ruralistas, foram suspensas multas por desmatamento ilegal e o início do reflorestamento das áreas afetadas ficou adiado.
Em 30 de março deste ano, o texto foi analisado na Câmara dos Deputados pela primeira vez. Na ocasião, os parlamentares aprovaram emendas de plenário – os chamados “jabutis” – propostas pelo deputado ruralista Sergio Souza. Esses trechos inseridos afrouxavam a lei da Mata Atlântica (lei 11.428/06).
O texto aprovado pelos deputados permite, por exemplo, o desmatamento de área onde haverá implantação de linhas de transmissão de energia elétrica, de gasoduto ou de sistemas de abastecimento público de água, sem necessidade de estudo prévio de impacto ambiental ou compensação de qualquer natureza. Dispensa ainda a captura, coleta e transporte de animais silvestres, garantida apenas sua afugentação.
Prevê também, dentre outros pontos, que a vegetação secundária em estágio médio de regeneração poderá ser derrubada para fins de utilidade pública mesmo quando houver alternativa técnica ou de outro local para o empreendimento.
A MP, então, foi ao Senado. Em 16 de maio, depois de muita discussão, os senadores excluíram da proposta todos os pontos que promoviam mudanças na lei da Mata Atlântica. Na avaliação dos senadores, regimentalmente, os “jabutis” não poderiam permanecer no texto por serem estranhos ao objetivo inicial da medida provisória.
Diante das mudanças, o texto voltou novamente à Câmara. Na última quarta-feira, 24 de maio, a Casa Legislativa “ignorou” as exclusões feitas pelos senadores e retornou o texto anterior dos deputados. Agora, a MP será enviada à sanção presidencial.
“Desastre”
Milaré, que classifica o texto dos deputados como “desastroso”, explica que o presidente Lula pode vetar a MP. Todavia, ele lembra que a última palavra é da Câmara, que pode derrubar o veto presidencial e retornar com os “jabutis” novamente.
Caso isso aconteça, seria necessário recorrer ao STF.
“Nós estamos em uma situação bastante complicada, muito sensível. De um retrocesso ambiental sem conta.”
Assista ao vídeo:
MP da Mata Atlântica no Supremo
Paralelamente, os senadores Alessandro Vieira, Otto Alencar, Eliziane Gama e Jorge Kajuru contestaram os “jabutis” inseridos no texto da MP no Supremo Tribunal Federal. O relator do caso, ministro André Mendonça, deu prazo de 10 dias para que Arthur Lira se manifeste.
Após receber as informações, Mendonça decidirá se vai suspender a tramitação da MP, conforme defendem os senadores. O deputado Sergio de Souza, relator da matéria na Câmara, também deverá prestar informações ao ministro.
"Eventual controle judicial deve, em respeito ao princípio da separação dos poderes, revestir-se do mais alto grau de excepcionalidade e cautela. Disso resulta a adoção, no presente caso, da prudência judicial, no sentido de ouvir, previamente, as autoridades coatoras, antes de qualquer decisão sobre o objeto do litígio."
Dia Nacional do Meio Ambiente
Nesta segunda-feira, 5, comemora-se o Dia Nacional do Meio Ambiente. Aproveitando a efeméride, perguntamos a Édis Milaré qual é o papel do Judiciário na defesa do meio ambiente.
Na avaliação do advogado, o Judiciário precisa fazer da proteção do meio ambiente alguma coisa sua também.
“Judiciário precisa lembrar que ele dá a última palavra nas reivindicações da sociedade quando ela se vê prejudicada e ele precisa, em matéria ambiental, fazer dessa questão uma coisa sua.”
Ele observa que o STF, detentor da última palavra, não tem agido por ativismo judicial, mas sim por protagonismo. “O Poder Judiciário não age por conta própria, ele tem que ser provocado”, defende.
“Podemos gostar ou não gostar do Supremo por razões que cada um tem a sua, mas a verdade é que lá é a última tábua de salvação que nós temos. Eu diria que o Judiciário, e o STF em particular, em matéria ambiental tem cumprido a sua missão.”
Confira: