A 8ª turma Cível do TJ/DF manteve decisão que negou pedido de pensão alimentícia feito por advogado a ex-esposa e, ainda, condenou o autor ao pagamento de multa por litigância de má fé, tendo em vista que o homem perseguiu reiteradamente à ex-esposa por meio de "ações e incidentes judiciais repetitivos, infundados e temerários".
Consta no processo que as partes se casaram em 11/6/2014, sob o regime de separação obrigatória de bens, e separaram-se de fato em dezembro de 2016. O divórcio foi decretado em 8/2/2017.
No recurso, o advogado alega que o arbitramento de alimentos entre cônjuges é necessário para a recuperação do equilíbrio socioeconômico. Narra que, após o término da relação, tentou se reinserir no mercado de trabalho, mas “sofreu monstruoso decréscimo patrimonial" e realizou empréstimos que consumiram suas reservas financeiras e sua previdência complementar. Informa que os relatórios da e-Financeira são inservíveis para aferir sua suposta capacidade econômica, pois apresentam “severa distorção quantitativa dos valores informados”. Afirma que um banco emitiu documento reconhecendo que os valores informados estão em duplicidade.
Passados mais de seis anos do início da ação, a mulher menciona a existência de “verdadeiro assédio processual” promovido pelo advogado. Ao analisar o caso, o desembargador relator esclareceu que a obrigação alimentar entre cônjuges decorre do dever de mútua assistência e pode permanecer após o rompimento do vínculo conjugal, desde que comprovada a dependência de uma parte em relação à outra.
Além disso, em razão do caráter excepcional, o pagamento da pensão entre ex-cônjuges só deve ser autorizado quando comprovado que o alimentando não dispõe de meios próprios para manter a sua subsistência. O colegiado concluiu que não é o caso do advogado.
Com relação aos relatórios da e-Financeira, o julgador observou que “por mais que o apelante insista na existência de duplicidade das informações ali prestadas e pugne pela sua análise com redução de 50%, ainda assim, os valores encontrados são incompatíveis com a natureza excepcional e provisória da prestação de alimentos entre ex-cônjuges”.
De acordo com o relator, além de a alteração da capacidade socioeconômica dos cônjuges ser comum ao fim das relações conjugais, o direito de reclamar os alimentos deve se pautar tanto na necessidade do alimentando, como na ausência de autonomia financeira para prover a própria subsistência, “aspectos não demonstrados pelo apelante, que, vale repetir, era advogado experiente, com escritório próprio, e empresário à época da separação”.
Além disso, a turma advertiu o advogado e seus advogados de que todos os sujeitos do processo devem cooperar para que se obtenha, em tempo razoável, a adequada prestação jurisdicional. De maneira que, apesar de ter se reinserido no mercado de trabalho em novembro de 2017, o advogado insistiu na condenação da ré a pagar-lhe alimentos. Bem como, durante o trâmite do processo, apresentou inúmeras petições sobre matérias estranhas à lide, mesmo após a decisão que determinou o prosseguimento do feito apenas em relação ao pedido de alimentos entre ex-cônjuges. Restou evidenciado que o advogado interpôs pelo menos seis agravos de instrumento, dois deles sobre os mesmos fatos.
Dessa forma, os desembargadores avaliaram que o homem procedeu de modo temerário durante o trâmite processual e, por esse motivo, foi aplicada multa de 5% sobre o valor da ação, por litigância de má-fé, em favor da mulher.
“A perseguição reiterada à ex-esposa, invadindo sua esfera de liberdade e privacidade (stalking) por meio de ações e incidentes judiciais repetitivos, infundados e temerários, aptos a lhe causar inquietação e dano emocional, por prejudicar sua liberdade de determinação e degradar sua integridade psicológica, perturbando sua paz existencial e impedindo, assim, o exercício da felicidade, que são direitos fundamentais intrínsecos à pessoa humana, tipifica, em tese, assédio processual.”
Com relação ao assédio processual, o processo foi encaminhado ao MP/DF, autoridade competente, para providências. “A remessa dos autos ao MP não é criminalização indireta nem intimidação ao exercício do direito de acesso à Justiça, mas indispensável proteção jurídica à pessoa perseguida, evitando-se que o abuso do direito de ação, com argumentação manifestamente pretextuosa, seja causa de pedir de processos judiciais repetitivos e temerários, o que pode caracterizar, em tese, crime de perseguição e violência psicológica contra a mulher, sem prejuízo de outra classificação penal a ser dada, privativamente, pelo Ministério Público”.
O processo está em segredo de Justiça.
Informações: TJ/DF.