TJ/RS
Decisão proferida em sessão da 7ª Câmara Cível, sob relatoria da Desa. Maria Berenice Dias, em caso de interceptação telefônica do devedor de alimentos.Leia abaixo na íntegra:
EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA DO DEVEDOR DE ALIMENTOS. CABIMENTO.
Tentada a localização do executado de todas as formas, residindo este <_st13a_personname productid="em outro Estado" w:st="on">em outro Estado e arrastando-se a execução por quase dois anos, mostra-se cabível a interceptação telefônica do devedor de alimentos.
Se por um lado a Carta Magna protege o direito à intimidade, também abarcou o princípio da proteção integral a crianças e adolescentes. Assim, ponderando-se os dois princípios sobrepõe-se o direito à vida dos alimentados. A própria possibilidade da prisão civil no caso de dívida alimentar evidencia tal assertiva.
Tal medida dispõe inclusive de cunho pedagógico para que outros devedores de alimentos não mais se utilizem de subterfúgios para safarem-se da obrigação.
Agravo provido.AGRAVO DE INSTRUMENTO - SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Nº 70018683508 - COMARCA DE PORTO ALEGRE
ALESSANDRA S.P.- AGRAVANTE
STEFAN J.S.P. - AGRAVANTE
ALOIS P. - AGRAVADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao agravo de instrumento interposto.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS E DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES.
Porto Alegre, 28 de março de 2007.
DES.ª MARIA BERENICE DIAS,
Presidenta e Relatora.RELATÓRIO
DES.ª MARIA BERENICE DIAS (PRESIDENTA E RELATORA)
Trata-se de agravo de instrumento interposto por Alessandra S. P. e Stefan J.S.P., representados por Rosimar S. em face da decisão da fl. 76, que, nos autos da execução de alimentos movida em face de Alois P., indeferiu o pedido de escuta e de quebra do sigilo telefônico do executado.
Alegam que o agravado após ser citado escondeu-se para impedir o cumprimento do mandado de prisão. Asseveram que a polícia paulista não tem efetivo suficiente para ficar em campana na moradia do agravado. Seguindo sugestão dos agentes, realizaram pedido de escuta telefônica com a finalidade de localizar o agravado. Salientam que não se trata de mera prisão administrativa, mas, de prisão judicial. Requerem o provimento do recurso para a determinação de escuta nos telefones do recorrido (fls. 2-8).
O Desembargador-Plantonista indeferiu o pedido liminar (fl. 79).
A parte agravada deixou de ser intimada para prestar contra-razões, uma vez não angularizada a relação processual.
A Procuradora de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (fls. 80-5).
É o relatório.
VOTOS
DES.ª MARIA BERENICE DIAS (PRESIDENTA E RELATORA)
Pretendem os recorrentes a reforma da decisão que indeferiu o pedido de escuta e de quebra do sigilo telefônico do executado.
Justificam que tal medida se faz necessária tão-somente para possibilitar a localização do foragido a fim de tornar eficaz a ordem de prisão.
A presente execução desenrola-se desde maio de 2005 (fl. 21), ou seja, há mais de 22 meses, tendo os alimentados sido pagos, pela última vez, no longínquo mês de março de 2004, exclusivamente com o objetivo
de afastar o cumprimento de um mandado de prisão.
O réu foi citado para o pagamento das prestações em atraso em janeiro de 2006 (fl. 31). Não tendo realizado o pagamento, nem justificado a impossibilidade de fazê-lo, teve sua prisão decretada em abril de 2006 (fl. 38), oportunidade em que a dívida alimentar já era superior ao montante de R$ 37.000,00 (fl. 67).
Compulsando os autos, verifica-se que a localização do recorrido foi tentada de todas as formas. Nem mesmo a louvável e diligente disposição da procuradora dos credores, que em mais de duas oportunidades foi até a Cidade de São Paulo, e, em companhia dos agentes da Delegacia de Capturas daquele Município, conseguiu obter sucesso para o cumprimento do mandado (fls. 44-45 e 52-53).
De acordo com o art. 5°, XII, regulamentado pela Lei n. 9.296/96, a interceptação telefônica somente pode ocorrer, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal e instrução penal.
Contudo, o presente caso trata de situação excepcional.
Se por um lado a Carta Magna protege o direito à intimidade, também abarcou o princípio da proteção integral a crianças e adolescentes, conforme tenho manifestado doutrinariamente:
O princípio não é uma recomendação ética, mas diretriz determinante nas relações da criança e do adolescente com seus pais, com sua família, com a sociedade e com o Estado. A maior vulnerabilidade e fragilidade dos cidadãos até os 18 anos, como pessoas em desenvolvimento, os faz destinatários de um tratamento especial. Daí a consagração do princípio da prioridade absoluta, de repercussão imediata sobre o comportamento da administração pública, na entrega, em condições de uso, às crianças e adolescentes, dos direitos fundamentais específicos que lhes são consagrados constitucionalmente. (Manual de Direito das Famílias. 3. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 57).
A matéria aqui tratada confronta duas questões de ordem constitucional que merecem ser sopesadas: de um lado está o direito à intimidade do devedor de alimentos, e, de outro, o princípio da proteção integral a crianças e adolescentes, a quem é destinada a verba alimentar.
Ocorrendo choque entre dois princípios constitucionais, é certo que impossível a aplicabilidade de ambos, um deverá necessariamente ser afastado, a partir de uma análise e interpretação sistemática do ordenamento jurídico relativamente ao caso concreto, aplicando-se a este o princípio da proporcionalidade.
A respeito ao princípio supracitados, merecem ser elencados os ensinamentos de Humberto Bergmann Ávila:
É exatamente do modo de solução da colisão de princípios que se induz o dever de proporcionalidade. Quando ocorre uma colisão de princípios é preciso verificar qual deles possui maior peso diante das circunstâncias concretas...
Assim, o dever de proporcionalidade estrutura-se em três elementos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Uma medida é adequada se o meio escolhido está apto para alcançar o resultado pretendido; necessária, se, todas as disponíveis e igualmente eficazes para atingir um fim, é a menos gravosa em relação aos direitos envolvidos; proporcional ou correspondente, se, relativamente ao fim perseguido, não restringir excessivamente os direitos envolvidos”. (A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo, n. 215, p. 158/159, jan./mar. 1999).Conforme bem posto pela Procuradora de Justiça, Drª Ida Sofia da Silveira (fl. 83): no caso dos autos, por ocorrer a violação do alimentante com relação às suas filhas menores, o direito à sua intimidade não pode se sobrepor de forma absoluta ao direito das meninas de receberem a verba alimentar.
Assim, patente a sobreposição do direito à vida dos alimentados em frente à intimidade do executado. A própria possibilidade da prisão civil no caso de dívida alimentar evidencia o caráter superior da verba alimentar, devendo sobrepor o direito do devedor à intimidade.
Oportuno destacar que o deferimento de tal medida possui inclusive cunho pedagógico para que outros devedores de alimentos não mais se utilizem de subterfúgios para inadimplirem a obrigação que lhes é imposta.
Por tais fundamentos, o provimento do agravo se impõe.
DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS - De acordo.
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES - De acordo.
DES.ª MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Agravo de Instrumento nº 70018683508, Comarca de Porto Alegre: "PROVERAM. UNÂNIME."
Julgador(a) de 1º Grau: NELSON JOSE GONZAGA
___________