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STF: Lei de improbidade não retroage em decisão transitada em julgado

Sobre o tema, foi fixada tese pelos ministros.

18/8/2022

Nesta quinta-feira, 18, o STF decidiu pela não retroatividade da lei de improbidade administrativa (lei 14.230/21) para os casos já encerrados, com decisão transitada em julgado. Todavia, para atos de improbidade culposos praticados antes da lei que não tenham condenação transitada em julgado, o Supremo formou maioria pela retroatividade da norma.

Quanto a prescrição intercorrente e geral, o plenário entendeu que a lei é irretroativa. Segundo a Corte, deve-se aplicar os novos marcos temporais estabelecidos pela norma apenas a partir da publicação da lei em 26/10/21.

Sobre o tema, foi fixada a seguinte tese: 

1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;
2) A norma benéfica da lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVIDA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;
3) A nova lei 14.230/21 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente.
4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.

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Na primeira sessão, proferiram voto o relator, Alexandre de Moraes, e o ministro André Mendonça, que abriu divergência. O voto divergente, no entanto, alcança apenas alguns aspectos. 

Na segunda sessão, votaram os ministros Nunes Marques, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli.

Nesta tarde, votaram as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e os ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski.

Nova lei

Sancionada em 2021, a nova legislação acabou com o crime de improbidade administrativa culposo e alterou, de cinco para oito anos, o prazo de prescricional para os atos de improbidade.

No tocante às questões de improbidade dolosas, nada se alterou. Desse modo, atos anteriores ou posteriores à norma continuam sendo punidos da mesma forma.

Voto do relator

Em sessão anterior, o relator, ministro Alexandre de Moraes, primeiro a votar, entendeu que a lei não retroage para atingir casos com decisões definitivas (transitadas em julgado).

Segundo Moraes, a partir da lei 14.230/21, a configuração de atos de improbidade exige a intenção de agir (dolo) do agente, e a retirada da modalidade culposa (não intencional) é uma opção legislativa legítima. Para ele, a norma mais benéfica relacionada às condutas culposas não retroage para aplicação no caso de decisões definitivas e processos em fase de execução das penas.

Na visão do ministro, a revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa não é retroatividade e, consequentemente, não tem incidência em relação a eficácia da coisa julgada e nem durante o processo de execução das penas e seus incidentes.

O relator concluiu que, por ausência de expressa previsão legal e sob pena de desrespeito à constitucionalização das regras rígidas da administração pública e de responsabilização dos agentes públicos corruptos, o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica não tem aplicação para responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa.

Por fim, o ministro também votou para negar a aplicação dos novos prazos de prescrição a casos anteriores à norma. De acordo com o relator, o encurtamento do prazo por alteração da lei não pode prejudicar a atuação do Estado, uma que vez, à época, atuou de forma regular.

O ministro Luiz Fux acompanhou o voto do relator. 

Irretroatividade total

Na sessão passada, o ministro Edson Fachin abriu divergência por entender pela irretroatividade total da lei. Segundo S. Exa., as ações de improbidade têm natureza civil, e, portanto, deve ser levada em consideração a lei em vigor na época em que ocorreram os fatos ou em que foram instalados os procedimentos.

No entendimento do ministro, a norma não pode retroagir nem mesmo para beneficiar pessoas denunciadas por condutas culposas, que deixaram de ser consideradas ilícitas. Na ocasião, o ministro Luís Roberto Barroso acompanhou o entendimento.

Na sessão plenária de hoje, a ministra Rosa Weber votou na mesma vertente da divergência inaugurada por Fachin. Em sua visão, a regra da irretroatividade presente na CF/88 deve refletir na legislação infraconstitucional, “dando prevalência a tutela da segurança jurídica, no resguardo às garantias do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada”.

No mesmo entendimento, a ministra Cármen Lúcia votou pela irretroatividade total da norma. Segundo ela, “a jurisprudência do STF e a doutrina afirmam que os casos de improbidade não são de Direito Penal. E, como a lei de improbidade não é uma lei Penal, desse modo, não retroagirá”.

Retroatividade 

Na primeira sessão de julgamento sobre o tema, o ministro André Mendonça divergiu do relator em determinados pontos. Na vertente defendida por S. Exa., como a distinção entre atos intencionais e não intencionais para a imputação de responsabilização jurídica é oriunda do direito penal, não é possível afastar a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica, inclusive, para as decisões definitivas.

Contudo, para Mendonça, a aplicação do princípio vale apenas para os casos de responsabilização exclusivamente por ato não intencional (culposo) e desde que o sentenciado ajuíze uma ação rescisória. O ministro Ricardo Lewandowski, nesse aspecto, acompanhou o entendimento.

O ministro Nunes Marques considera que, como tem caráter penal, a norma pode ser aplicada retroativamente para beneficiar o réu. Por esse motivo, não faz sentido a aplicação da lei anterior, mais rigorosa, para as condutas culposas, que deixaram de ser consideradas delituosas com a nova redação. Para ele, a aplicação retroativa da lei não significará anistia geral das ações de improbidade. 

O ministro Dias Toffoli concorda que, como a lei tem aspectos de natureza penal, as alterações podem retroagir para beneficiar os réus de ações em tramitação. Em seu entendimento, como a ilicitude deixou de existir, a retroatividade pode atingir, inclusive, pessoas sentenciadas em ações com decisão definitiva. Nesses casos, basta que o juiz responsável pela execução da sentença reconheça a superveniência da lei que aboliu a ilicitude e decrete sua absolvição.

Nesta tarde, o ministro Gilmar Mendes também votou na sessão plenária de hoje. O decano pontuou que devido a “proximidade ontológica dos regimes jurídicos de combate a atos de improbidade administrativa e de persecução criminal (com sanções de grau similar de gravidade), impõe-se a incidência da garantia da retroatividade da norma sancionadora mais benéfica”.

Caso concreto

No caso concreto, por unanimidade, o colegiado reconheceu a prescrição e restabeleceu sentença que absolvera uma procuradora em uma ação civil pública na qual o INSS buscava o ressarcimento de prejuízos supostamente ocorridos em razão de sua atuação. A procuradora atuou entre 1994 e 1999, e a ação foi proposta em 2006, quando a prescrição prevista na lei era de cinco anos.

Considerações

Representante da autora do recurso julgado pelo STF, o advogado Francisco Zardo, do escritório Dotti Advogados, analisou o resultado do julgamento.

“Por unanimidade, o Supremo deu provimento ao recurso e extinguiu a ação. O consenso no plenário demonstra a manifesta injustiça da acusação.
Em relação à tese, em boa hora o STF aboliu a improbidade na modalidade culposa, reservando a lei de improbidade para sua vocação, que é o combate à corrupção, não aos gestores públicos honestos.
A decisão protege aqueles gestores que, embora possam ter cometido erros, agiram de boa-fé, com vistas ao interesse público e sem alcançar qualquer proveito próprio.”

Presidente da ANAPE - Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, Vicente Braga, que representou a OAB no julgamento e fez a sustentação oral no STF em nome da entidade, comentou o resultado.

“O Supremo compreendeu que deve ser aplicada a nova lei a todos os casos em andamento. Essa nova legislação deixa de considerar como improbidade os atos culposos, aqueles cometidos sem intenção, corrigindo uma grave distorção que terminava por igualar erros técnicos a desvios de conduta. Trata-se de uma decisão importante do STF no sentido de aplicar a lei, proteger os cidadãos e os interesses do Estado.”

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