A 2ª turma do STJ concluiu julgamento do caso que trata da morte do pedreiro Amarildo, assassinado por PMs na favela da Rocinha em 2013. O Estado do RJ foi condenado a indenizar a companheira e filhos em R$ 500 mil cada e aos irmãos da vítima em R$ 100 mil cada, por dano moral. Ao STJ, a defesa dos familiares pede indenização à sobrinha e o Estado a redução do valor.
Faltava apenas o voto da ministra Assussete Magalhães, que tinha pedido vista. O julgamento já tinha maioria para manter a indenização, o relator já estava acompanhado de dois ministros contra uma divergência. O pedido da ministra foi no sentido de analisar o valor indenisatório pleiteado. A ministra buscou comparar os valores concedidos em casos de indenização por morte, decididos pela 1ª e 3ª turma, por entender que no caso em questão indenização estava acima da média.
"O caso dos autos, todavia, destoa de outras situações representadas. A tortura, com posterior ocultação do cadáver por forças policiais, não faz ou não deveria fazer eparte dos riscos da vida em sociedade. O esperado é que, ao ser abordado por policiais, o cidadão tem os seus direitos respeitados e sua integridade física preservada."
Nesse sentido, a ministra Assusete Magalhães interpretou que a reparação não pode ser comparada com a jurisprudência de indenização por morte como acidentes de trânsito, pois suas peculiaridades destoa, em gravidade, da média dos casos apreciados pelo STJ.
"O valor da indenização fixada na origem, ainda que seja superior àquela encontrada na maioria dos casos, não se mostra, a meu ver, desarrazoável."
Para tanto, acompanhou o relator, ministro Francisco Falcão, confirmando a maioria.
O caso
O caso trata da morte de Amarildo, morto por PMs, na favela da Rocinha, em 2013. Em 14/7, o ajudante de pedreiro, de 42 anos, foi levado por policiais à UPP da Rocinha. Desde então, o trabalhador não foi mais visto. Nenhuma das câmeras próximas à UPP registrou a saída de Amarildo, mas há imagens dele entrando num carro da polícia para ser levado para a averiguação.
Seu sumiço provocou várias manifestações dos moradores da comunidade e teve repercussão internacional.
O Estado do RJ foi condenado a indenizar a companheira e filhos em R$ 500 mil cada e aos irmãos da vítima em R$ 100 mil cada, por dano moral.
Ao STJ, a defesa dos familiares recorre para que seja reconhecido direito a indenização à sobrinha de Amarildo. Já o Estado recorre pela redução do valor arbitrado e contra o reconhecimento de dano presumido aos irmãos do pedreiro.
O advogado João Tancredo, representante da família, sustentou oralmente ressaltando que o corpo da vítima nunca foi localizado, semelhante às lembranças da Ditadura militar, que "é a pior que se tem".
"Não fazer o sepultamento de um ente querido é um dos maiores sofrimentos que se pode ter. O Tribunal da Cidadania não pode permitir que sejamos conhecidos como o país da barbárie."
Indenização mantida
O relator, ministro Francisco Falcão, não conheceu do recurso da família e conheceu parcialmente o do Estado. Na extensão conhecida, desproveu. O ministro destacou julgados do STJ com valor semelhante de indenização em que as turmas do STJ não conheceram do recurso.
Em divergência, o ministro Og Fernandes ressaltou que o valor da indenização é bem acima da média do fixado pelo STJ. Diante disso, considerou que o montante deveria ser reduzido, acolhendo em parte os argumentos do Estado.
Para o ministro, deveria ser fixado, para a companheira da vítima, o valor de 300 salários-mínimos, e para cada um dos filhos 200 salários-mínimos. O ministro entendeu que o valor de 50 salários-mínimos para cada um dos irmãos seja o mais adequado, ao se levar em conta o critério global da indenização em conjunto com a autonomia do valor indenizável.
Indenização reduzida
O ministro calculou que o valor global da indenização com a proposta alcança o montante de quase R$ 2 milhões, sem atualização.
"Não se está a falar da dor dos familiares, isso não há preço. Porém, posso garantir que a quantia mencionada eu nunca vi, somos integrantes da classe média, assalariados, e me parece adequada para o conjunto."
Assim, não conheceu do recurso dos familiares e conheceu parcialmente do recurso do Estado para reduzir o valor da indenização.
Ministro Herman Benjamin concordou que os valores são elevados, mas ressaltou que são elevados pois é uma situação extremamente peculiar.
O ministro Mauro Campbell Marques salientou que a família não teve nem direito ao luto. Para S. Exa., o tribunal a quo presou por represar os deveres inerentes ao trabalho policial e reformar a confiança desse aparato policial naquela comunidade, "aí está a gravidade do fato".
"Nós tivemos lamentavelmente esta guerra urbana que sofre o RJ, outros casos, como de Tim Lopes. A singularidade deste aso, no entanto, está no programa de unidade de polícia pacificadora em que o Estado opta por quase represar o óbvio. É dever do aparato policial dar confiança à população. Não é e não pode ser aparato policial matar."
Acompanharam o relator o ministro Herman Benjamin, Mauro Campbell e Assussete Magalhães.
Processo: AREsp 1.829.272