É constitucional a LC 179/21, que define os objetivos do Banco Central e dispõe sobre sua autonomia e sobre a nomeação e a exoneração de seu presidente e de seus diretores. Assim decidiu o plenário do STF na tarde desta quinta-feira, 26.
A maioria do colegiado (8x2) seguiu o entendimento de Luís Roberto Barroso, para quem a “democracia precisa de árbitros neutros. Instituições que não possam ser capturados pela política ordinária".
- Autonomia do BC
A ação foi proposta foi dois partidos políticos: PSOL e PT. As legendas questionam a contra a LC 179/21, que define os objetivos do Banco Central do Brasil e dispõe sobre sua autonomia.
A autonomia do BC é discutida no Congresso desde 1991. O objetivo fundamental é o controle da inflação e a estabilidade de preços, sem influências políticas. Além deste objetivo principal, o texto foi formulado visando zelar pela estabilidade e eficiência do sistema financeiro; suavizar as flutuações do nível de atividade econômica; e fomentar o pleno emprego.
De acordo com o texto:
O BC deixará de ser vinculado ao ministério da Economia;
- O presidente da República só poderá indicar o presidente do BC no 3º ano de governo (essa indicação passará pelo Senado);
- Os mandatos do presidente e dos diretores serão de quatro anos, com possibilidade de uma recondução;
- Os ocupantes desses cargos não poderão ser demitidos pelo Executivo;
- Desligamentos serão feitos pelo Senado.
Para os partidos, não se pode pensar em um Banco Central com objetivos distintos das políticas do governo Federal, "quanto mais em um país em desenvolvimento e repleto de demandas sociais, políticas e econômicas prementes".
Ademais, as agremiações ressaltam que a autoridade monetária tem "autonomia operacional", pois já possui a prerrogativa de definir os instrumentos que serão utilizados no cumprimento da política monetária predefinida.
O julgamento da matéria foi iniciado em plenário virtual; oportunidade em que o relator, ministro Lewandowski, declarou a inconsticionalidade formal da lei; Barroso votou por validar a autonomia do BC; Alexandre de Moraes pediu vista e Dias Toffoli pediu destaque.
- Matéria polêmica, inconstitucionalidade formal
Ricardo Lewandowski iniciou seu voto explicando que analisará apenas a formalidade da lei e não o seu mérito. O relator frisou que o tema é "extremamente polêmico, envolvendo opções contra e a favor da medida, todas elas claramente matizadas do ponto de vista político e ideológico".
Em seguida, o ministro considerou a lei inconstitucional do ponto de vista formal. O relator observou que o art. 6º da lei impugnada desvincula o BC de qualquer tipo de ministério; no entanto, logo em seguida, a norma diz que o Banco Central corresponderá a órgão setorial nos sistemas da Administração Pública Federal.
O relator concluiu, então, que o BC jamais deixou de fazer parte da Administração Pública. Para Lewandowski, não seria possível, por iniciativa parlamentar, subtrair do presidente da República o controle de algum órgão integrante da Administração Pública Federal.
A ministra Rosa Weber se limitou a analisar a formalidade da lei. Assim como o relator, a ministra considerou que a norma padece de inconstitucionaldadade formal.
- Constitucionalidade da lei
Por outro lado, Luís Roberto Barroso considerou válida a lei, afastando quaisquer alegações de inconstitucionalidades formais ou materiais. Para o ministro, a norma impugnada dá configuração a uma instituição de Estado, e não de governo, que tem relevante papel como um árbitro neutro, cuja atuação não deve estar sujeita a controle político unipessoal. "Uma democracia precisa de árbitros neutros. Instituições que não possam ser capturados pela política ordinária", afirmou.
Em breve manifestação, o ministro Dias Toffoli acompanhou a conclusão de Barroso pela constitucionalidade da lei. Toffoli registrou que é do Congresso Nacional a competência para deliberar sobre câmbio, moeda e sistema financeiro; ou seja, não há iniciativa restritiva ao Executivo.
No mesmo sentido, entendeu Nunes Marques. Inicialmente, o ministro afastou a alegação de inconstitucionalidade formal. Ao adentrar no mérito, Nunes Marques afirmou que a autonomia do banco central em outros países (citando a Alemanha como exemplo) é “essencial para a confiança nas relações internacionais, forte indicativo de transparência, responsabilidade e governança”. Com a independência garantida pela lei, o ministro entende que o Brasil será elevado a outro nível de confiança monetária.
Alexandre de Moraes começou seu voto afirmando que “não há dúvida” que o assunto é de competência privativa do presidente da República, já que o BC é um órgão do Executivo. No entanto, Moraes observou que o texto que o Congresso aprovou foi exatamente igual aquele que o presidente já havia apresentado, “sem tirar, nem pôr”.
“Se o que foi aprovado, foi o mesmo que foi enviado, respeitada está para matéria a iniciativa privativa.”
Da mesma forma, e em voto breve, votou o ministro Edson Fachin.
Para Cármen Lúcia, a lei impugnada não está viciada formalmente, porque foram suprida exigências constitucionais. Também a ministra não vislumbrou qualquer inconstitucionalidade material, porque este tema tem o espaço próprio de escolhas no ambiente parlamentar.
Para Gilmar Mendes e Luiz Fux, é “premente convir” que o texto da LC 179/21, da forma como sancionado e promulgado, foi debatido e aprovado nas duas casas do Congresso. Encerrando a votação, os ministros afastaram as inconstitucionalidades formais e materiais alegadas.
Autarquias Federais: Executivo tem a competência privativa?
Um debate foi suscitado na questão, porque cinco ministros (Lewandowski, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Edson Fachin e Cármen Lúcia) entendem que é de competência privativa da União a iniciativa para ingerir na administração das autarquias federais.
O relator do caso, Ricardo Lewandowski, levantou o “risco” que se pode abrir com o resultado do julgamento ao não ficar claro se o Legislativo pode ou não dispor sobre órgãos integrantes da Administração Pública Federal. Caso o Congresso queira, posteriormente, retirar a autonomia do BC, ou então, ingerir em outros órgãos, será possível? Não houve uma decisão peremptória sobre a questão.
- Processo: ADIn 6.696