O juiz de Direito Frederico Vasconcelos de Carvalho, de Manga/MG, extinguiu uma ação sem resolução de mérito ao constatar que a demanda foi proposta sem autorização legal da autora.
“Em outras palavras, a subscrição do instrumento deu-se ilegalmente, pois quem de fato movimentou a máquina judiciária não foi a parte autora, e sim o escritório de advocacia”, disse o magistrado.
Entenda o caso
Na ação contra um banco, a autora buscava a restituição, em dobro, dos valores descontados de seu benefício previdenciário, sustentando que não firmou nenhum contrato de empréstimo consignado. Requereu, ainda, a condenação da financeira por danos morais.
Durante o trâmite do processo e considerando o “exorbitante” número de ações propostas pelo mesmo advogado na comarca, o juiz determinou a intimação pessoal da parte autora para que, dentre outras diligências, ratificasse a outorga de procuração.
Foi então que ela afirmou que não sabe informar se assinou a procuração. Disse, ainda, que não tem conhecimento de nenhuma ação judicial e que não conhece o advogado em questão, que apenas o viu uma única vez. Por fim, ressaltou que não sabia que ele era advogado.
Na sentença, o juiz salientou que a procuração regularmente outorgada é pressuposto processual de validade. “Sua ausência reclama a não resolução do mérito”, pontuou.
“Percebe-se, pois, que a parte autora não propôs este feito, mas apenas o advogado o fez sem autorização legal. Em outras palavras, a subscrição do instrumento deu-se ilegalmente, pois quem de fato movimentou a máquina judiciária não foi a parte autora, e sim o escritório de advocacia.”
Diante da constatação de que a parte autora não outorgou procuração ao advogado, o magistrado vislumbrou ausência de pressuposto processual para a constituição válida da relação processual.
“Outrossim, a inicial configura-se inepta, pois traz alegações genéricas e sem especificidades do caso concreto, já que supostamente diz respeito a contratos individuais, ensejando, por conseguinte a extinção do processo.”
O juiz ressaltou, também, que o fato repercute tanto na esfera judicial quanto na esfera administrativa, pois há indícios de que o advogado, em tese, desrespeitou princípios da profissão.
“É de relevo anotar que desde 22.07.2019, quando da instalação da plataforma do PJe nesta Comarca, foram distribuídas nesta Vara Judicial, pelo Dr. (...), mais de 540 (quinhentos e quarenta) ações declaratórias de inexistência de empréstimos consignados, o que corresponde mais da metade do acervo do PJe da 2ª Vara da Comarca de Manga.”
O magistrado salientou que, na maioria dos casos, a mesma parte autora ingressa com uma ação para cada contrato que discute, distribuindo múltiplas ações judiciais, cujos conflitos poderiam ser discutidos em uma única demanda.
“Frise-se, ainda, que os pedidos são repetitivos e estranhamente requerem a dispensa de audiência de conciliação e instrução, quiçá para a parte não ser confrontada acerca da ilicitude da contratação. Essa situação vem acontecendo em várias Comarcas como Manga, Iturama e Campina Verde, bem como em Juízos dos Tribunais dos Estados do Paraná e do Mato Grosso do Sul.”
Por fim, registrou o julgador que é dever do magistrado combater situações que configurem eventual ajuizamento de feitos predatórios, sobretudo diante da certificada ilicitude de outorga de procuração, como é o caso dos autos.
Por esses motivos, condenou o advogado no pagamento das custas e despesas processuais e oficiou o Conselho de Ética da OAB/MG, para conhecimento e apuração de eventual infração disciplinar, e o NUMOPEDE - Núcleo de Monitoramento do Perfil de Demandas, para ciência dos presentes autos e eventual adoção de medidas em nível estadual.
- Processo: 5000066-42.2020.8.13.0393
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