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CBF e Federação Paulista conseguem afastar condenação de R$ 24 milhões por “Máfia do Apito”

3ª turma do STJ entendeu que dano moral coletivo não restou configurado.

27/10/2020

A 3ª turma do STJ excluiu condenação por dano moral coletivo contra a CBF e a Federação Paulista de Futebol pelos eventos decorrentes da chamada “Máfia do Apito”, esquema de árbitros que fraudou o resultado de partidas dos campeonatos brasileiro e paulista, em 2005.

O TJ/SP havia fixado a condenação da CBF em R$ 20 mi e a condenação da Federação Paulista de Futebol em R$ 4 mi, além de condenar, também, os árbitros envolvidos, no bojo de ação civil pública do MP/SP.

A decisão da turma foi por maioria de votos, vencidos Nancy Andrighi e Sanseverino. Os ministros Moura Ribeiro e Marco Aurélio Bellizze acompanharam o relator, ministro Ricardo Cueva.

(Imagem: Pixabay)

Ausência de dano moral coletivo

Conforme o relator, não estaria configurado o dano moral coletivo passível de indenização porque “não se antevê tamanha lesão à esfera patrimonial dos torcedores”. S. Exa. ressaltou que as adversidades sofridas por expectadores de modalidade esportiva até podem causar aborrecimentos, dissabores, contratempos, que vêm a desaparecer com o tempo, mas não interferem no bem estar.

O dano moral coletivo, compreendido como resultado de uma lesão à esfera extrapatrimonial, ocorre quando a conduta agride, de modo totalmente injusto e intolerável o ordenamento jurídico dos valores éticos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva.

Não basta mera infringência à lei ou contrato para caracterização do dano moral coletivo, é essencial que o ato praticado atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes do individualismo afetando, por sua gravidade, o círculo primordial de valores sociais.”

O relator recordou que os jogos fraudados foram anulados e novas partidas foram realizadas. Para Cueva, no meio futebolístico, os danos morais coletivos estariam configurados, por exemplo, em casos de violência praticados nos estádios que "causassem verdadeiro sentimento de temor", a ponto de impedir o comparecimento dos torcedores por falta de segurança, "ou mesmo no caso de fraude generalizada envolvendo árbitros, jogadores, dirigentes etc., capaz de quebrar substancialmente a confiança da torcida na lisura dos campeonatos".  

"Em dado momento, tanto a sentença como o acórdão recorrido invocam a paixão do brasileiro pelo futebol para fundamentar o abalo sofrido pelos torcedores e a respectiva necessidade de reparação do dano moral coletivo. Todavia, é justamente a paixão pelo futebol que impede o torcedor médio de se abater com situações como a dos autos e que o encoraja a seguir torcendo pelo seu time do coração."

Ao reforçar o entendimento na sessão desta terça-feira, 27, Cueva afirmou que apesar da gravidade dos fatos e da quebra da confiança na credibilidade dos jogos, “não me pareceu ser o caso de caracterização de dano moral coletivo”.

Não se tratou de fraude generalizada, de abalo sistêmico nos campeonatos, tanto que continuaram a existir, as pessoas continuaram a fluir aos estádios. É um episódio lamentável, censurável por todos os lados, mas meu receio é que, se nós vulgarizarmos o dano moral coletivo, teríamos que expandir essas hipóteses para outras situações em que não caracterizado.”

Corrente vencida

A divergência no julgamento foi inaugurada pela ministra Nancy, que em voto-vista reconheceu não apenas o dano moral coletivo como também a responsabilidade solidária das entidades esportivas.

Segundo a ministra, a derrota de time de futebol, ainda que atribuída a erro de arbitragem, não é apta, por si só, para causar sofrimento intenso ao torcedor médio, violando sua esfera de subjetividade e valores inerentes à sua personalidade, a ponto de causar dano moral.

Mas lembrando a importância do futebol, enquanto fenômeno cultural na sociedade brasileira (“indiscutivelmente uma paixão nacional”), Nancy  afirmou que “neste contexto a fraude ganha relevo e destaque”.

A manipulação dos resultados dos jogos da partida do campeonato brasileiro e paulista de 2005 viola a lisura e moralidade que se esperam no âmbito do desporto e das atividades de interesse público em geral. (...) O arbitramento das partidas com parcialidade para obter vantagens indevidas quebra a legítima expectativa dos torcedores e da sociedade em geral que o resultado reflita o mérito em campo.

A ministra destacou que é possível responsabilização do fornecedor independentemente de culpa quando verificado que do produto posto em circulação ou do serviço prestado decorreu dano ao consumidor, mesmo que do plano fático não seja evidente eventual dano ou falha ou erro de conduta atribuível ao fornecedor.

Não há se perquirir se houve ou não erro de conduta, nascendo o dever de indenizar da conversão do risco em abstrato em prejuízo concreto sofrido pelos torcedores, que no caso corresponde ao aviltamento da consciência coletiva, decorre do falseamento dos resultados.

De acordo com a ministra, um dos aspectos mais relevantes não foi observado: a fiel correspondência do resultado dos certames e a performance dos participantes.

A arbitragem é um dos elementos essenciais que compõe as competições, inserindo-se na cadeia de produção e riscos inerentes à atividade econômica de exploração de eventos esportivos. Ainda que as entidades não tenham participado do evento corrupto ou mesmo que não tivessem conhecimento de sua existência, devem responder solidariamente pelo dano moral coletivo.

O ministro Sanseverino, ao seguir a divergência, ressaltou que “foi um fato extremamente grave”, que “coloca em dúvida toda a lisura dos certames”.  

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