Migalhas Quentes

Crédito de cessão fiduciária suficientemente identificado é excluído de recuperação judicial

Precedente é da 3ª turma do STJ, em caso relatado pelo ministro Bellizze.

11/4/2019

A 3ª turma do STJ proveu recurso de instituição financeira para excluir crédito cedido fiduciariamente da recuperação judicial de empresas da indústria têxtil.

No caso em análise, as recuperandas argumentaram que não houvera, no teor do instrumento, a correta determinação dos títulos de crédito, objeto de cessão – e, com base nessa alegação, pretendiam submeter o crédito remanescente (R$ 137 mil) ao concurso recuperacional.

O TJ/SP entendeu que o crédito devia se sujeitar à recuperação sob o fundamento de que a cessão fiduciária não havia se aperfeiçoado, em razão de não haver individualização dos créditos oferecidos em garantia.

No recurso especial, o banco pediu o reconhecimento do aperfeiçoamento da garantia fiduciária e, consequentemente, da extraconcursalidade de seu crédito.

Sem previsão legal

O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator, assentou no voto que a exigência de especificação do título representativo do crédito, como requisito formal à conformação do negócio fiduciário, “além de não possuir previsão legal cede a uma questão de ordem prática incontornável”.

Por ocasião da realização da cessão fiduciária, afigura-se absolutamente possível que o título representativo do crédito cedido não tenha sido nem sequer emitido, a inviabilizar, desde logo, sua determinação no contrato.

O voto de S. Exa. registra ainda que a lei 10.931/04, que disciplina a cédula de crédito bancário, é expressa em admitir que a cessão fiduciária em garantia da cédula de crédito bancário recaia sobre um crédito futuro (a performar), “o que, per si, inviabiliza a especificação do correlato título (já que ainda não emitido)”.

Na hipótese dos autos, as disposições contratuais estabelecidas pelas partes não deixam nenhuma margem de dúvidas quanto à indicação dos créditos cedidos, representados por duplicatas físicas ou escriturais – sendo estas, por sua vez, representadas pelos correlatos borderôs, sob a forma escrita ou eletrônica -, os quais ingressarão, a esse título (em garantia fiduciária), em conta vinculada para esse exclusivo propósito.”

 

O ministro observou que, sendo os créditos cedidos identificáveis, estavam preenchidos os requisitos do art. 18, inc. IV, da lei 9.514/97.

Verificado, nesses termos, que a exigência legal compreende a especificação, no instrumento contratual, do crédito, e não do título que o representa, não se pode deixar de reconhecer, inclusive, que a compreensão externada pelo Tribunal de origem ignora a própria sistemática da duplicata virtual.

Bellizze explicou que a duplicata virtual é emitida sob a forma escritural, por lançamento em sistema eletrônico de escrituração, pela empresa credora da subjacente relação de compra e venda mercantil/prestação de serviços (no caso, as próprias recuperandas), responsável pela higidez da indicação.

É, portanto, a própria devedora fiduciante que alimenta o sistema, com a emissão da duplicata eletrônica, que corporifica uma venda mercantil ou uma prestação de serviços por ela realizada, cuja veracidade é de sua exclusiva responsabilidade, gerando a seu favor um crédito, a permitir a geração de um borderô (o qual contém, por referência, a respectiva duplicata), remetida ao sacado/devedor.

Já se pode antever o absoluto contrassenso de se reconhecer a inidoneidade desse documento em prol dos interesses daquele que é o próprio responsável por sua conformação. O pagamento do borderô, por sua vez, ingressa na conta vinculada, em garantia fiduciária ao mútuo bancário tomada pela empresa fiduciante, não pairando nenhuma dúvida quanto à detida especificação do crédito (e não do título que o representa), nos moldes exigidos pelo art. 18, IV, da Lei n. 9.514/1997.”

Dessa forma, o relator proveu o recurso para, reconhecido o pleno atendimento à exigência legal de especificação do crédito, objeto de cessão fiduciária, determinar a exclusão do crédito dos efeitos da recuperação judicial das empresas recorridas.

O banco foi representado pelo advogado Gabriel de Orleans e Bragança, sócio gestor da área de Solução de Conflitos do escritório Lobo de Rizzo Advogados. Para Gabriel, “a decisão forma importante precedente e certamente influenciará o posicionamento de outros Tribunais a respeito do tema, conferindo maior segurança ao mercado”.

__________

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Leia mais

Insolvência em Foco

A cessão fiduciária de recebíveis e a proteção aos bens essenciais durante o “stay period”

29/1/2019
Insolvência em Foco

Cessão fiduciária não registrada se submete à recuperação judicial?

17/7/2018
Migalhas de Peso

Reflexos da ausência de registro da cessão fiduciária de direitos sobre títulos de crédito na recuperação judicial

4/6/2018
Migalhas Quentes

Crédito de cessão fiduciária não se sujeita à recuperação judicial

17/11/2016

Notícias Mais Lidas

Juíza compara preposto contratado a ator e declara confissão de empresa

18/11/2024

Escritórios demitem estudantes da PUC após ofensas a cotistas da USP

18/11/2024

PF prende envolvidos em plano para matar Lula, Alckmin e Moraes

19/11/2024

Moraes torna pública decisão contra militares que tramaram sua morte

19/11/2024

CNJ aprova teleperícia e laudo eletrônico para agilizar casos do INSS

20/11/2024

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

A relativização do princípio da legalidade tributária na temática da sub-rogação no Funrural – ADIn 4395

19/11/2024