A Corte Especial do STJ voltou a discutir nesta quarta-feira, 6, a restrição do foro privilegiado no Tribunal diante da decisão do STF, que restringiu o foro por prerrogativa de função dos parlamentares aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados à função desempenhada. Após voto-vista do ministro Luis Felipe Salomao, entendendo que a Corte poderia restringir o foro dos conselheiros dos tribunais de conta, pediu vista o ministro Felix Fischer.
Até que seja definida a questão, os ministros decidiram que a instrução processual de todas as ações penais que envolvem autoridades com foro por prerrogativa de função poderá ter continuidade.
O caso em que a Corte discutirá o foro é uma AP cujo réu é um conselheiro do TCE/DF, acusado por crime cometido enquanto ele ocupava mandato de deputado distrital. Hoje, o ministro Luis Felipe Salomão apresentou voto-vista no sentido de o STJ ser competente para analisar a questão. Logo após a decisão do STF sobre o foro, o ministro Salomão foi o primeiro a enviar para o 1º grau uma ação penal contra governador, aplicando o princípio da simetria.
Em seu voto hoje, ele reforçou que a Corte deveria aplicar o entendimento do Supremo e restringir o foro em relação aos conselheiros de tribunais de contas, uma vez que a questão de ordem foi arguida neste caso especificamente. De acordo com o voto dele, o foro por prerrogativa de função dos conselheiros ficaria restrito aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados à função desempenhada.
O voto do ministro foi o terceiro pela divergência, inaugurada pelo ministro Noronha e seguida pela ministra Maria Thereza, na sessão na qual foi iniciada a discussão da questão, em 16 de maio.
Relator, o ministro Mauro Campbell também votou na sessão do dia 16, entendendo que o princípio da simetria não poderia ser utilizado pelo STJ para aplicar o entendimento do Supremo sobre o foro. "O Princípio da Simetria surgiu para garantir o paralelismo que deve existir entre as Constituições Estaduais e a CF. Não é instituto apto para orientar na interpretação de artigos previstos no próprio texto constitucional. A sua finalidade não é dirimir controvérsias entre as normas da Constituição Federal e, sim, entre estas e os dispositivos das Constituições Estaduais."
O ministro apontou que se está diante de um caso de “pura interpretação constitucional” e “jamais” seria o caso de utilizar deste vetor interpretativo para, por arrastamento, subtrair competência de natureza constitucional originalmente delegada ao Supremo.
“Se está diante de um caso de pura interpretação constitucional, o que é competência do STF, e não do STJ, assim entendo que considerando a decisão do STF, não é aplicável ao caso concreto, por expressa determinação da Corte Suprema.”
Caso o STJ aplicasse o entendimento, para o ministro, estaria restringindo o direito ao juízo natural, previsto na Constituição, o que também é discussão exclusiva da competência do STF. Além disso, o ministro destacou que Supremo e Congresso, que são os competentes para tratar do assunto, já estão fazendo.
Campbell citou a PEC em tramite na Câmara dos Deputados, que prevê a restrição do foro, mantendo o benefício somente para os presidentes da República, do Senado, da Câmara e do STF, além do vice-presidente da República; e retira foro de juízes Federais, de membros do MP, de deputados, de senadores, de governadores, de desembargadores dos TJs, de membros dos tribunais de contas, dos TRFs, dos tribunais eleitorais e do trabalho e dos conselhos dos municípios.
Em conclusão, votou no sentido de que todos os feitos penais originários de competência da Corte Especial permaneçam em curso regular, enquanto se aguarda eventual deliberação do Supremo, que deve decidir se aprova súmula vinculante sore o tema, e do Congresso, quanto a eventual alteração.
Processos em fase de instrução
Após o pedido de vista do ministro Felix Fischer, o ministro Herman Benjamin trouxe uma outra questão de ordem, esta na AP 843, na qual é réu o governador de MG, Fernando Pimentel. O ministro questionou como ficaria a instrução processual dos feitos criminais em andamento nos gabinetes antes de uma definição sobre a restrição do foro.
Ele destacou que diversos casos em tramitação têm réus com mais de 70 anos, portanto com prazos prescricionais exíguos, além de interrogatórios e diligências já marcados. Dessa forma, segundo Herman Benjamin, seria preciso estabelecer uma orientação a ser seguida por todos os ministros, para evitar decisões conflitantes entre os relatores.
No entendimento da maioria, o prosseguimento da instrução não vai gerar prejuízos caso o tribunal venha futuramente a decidir pela delimitação do foro por prerrogativa de função e, com isso, remeta os processos às instâncias inferiores.
Os ministros que ficaram vencidos entendiam que seria melhor aguardar a definição sobre a restrição do foro para só então dar prosseguimento às ações, já que a realização de atos instrutórios neste momento poderia gerar nulidades processuais.
MPF
A manifestação do MPF entregue ao STJ sobre o tema foi diferente da feita no STF. Enquanto no Supremo a PGR defendeu a restrição do foro privilegiado para deputados e senadores, no Tribunal Superior o vice-procurador-geral da República Luciano Mariz Maia argumentou que os ministros da Corte são mais confiáveis para julgarem autoridades estaduais.
“A autoridade dos ministros do Superior Tribunal de Justiça transmite segurança e tranquilidade para investigados e denunciados, assim como para os cidadãos. É a garantia de que não temem nem se curvam ao Poder das elevadas autoridades nos estados membros ou no Distrito Federal. A confiança na autoridade de suas decisões é capaz de devolver paz social.”
Súmulas vinculantes
Após a decisão do plenário do STF, o ministro Dias Toffoli, do STF, encaminhou à ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte, uma proposta de edição de duas súmulas vinculantes que estendam a decisão da Corte sobre o foro por prerrogativa de função a outros cargos federais, estaduais, distritais e municipais. Veja abaixo:
Proposta de súmula: A competência por prerrogativa de foro, prevista na CF/88 para agentes públicos dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e do Ministério Público, compreende exclusivamente os crimes praticados no exercício e em razão do cargo ou da função pública.
Proposta de súmula: São inconstitucionais normas de Constituições Estaduais e da Lei Orgânica do DF que contemplam hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na Constituição Federal, vedada a invocação de simetria.
Veja a íntegra do voto do ministro Mauro Campbell.