Migalhas Quentes

STF decide que aborto no 1º trimestre não é crime

Entendimento inovador do ministro Barroso foi acompanhado por Fachin e Rosa.

29/11/2016

A 1ª turma do STF fixou nesta terça-feira, 29, a partir do voto do presidente, ministro Luís Roberto Barroso, que a criminalização do aborto no 1º trimestre da gestação viola diversos direitos fundamentais das mulheres – como a autonomia, a integridade física e psíquica, a igualdade de gênero e os direitos sexuais e reprodutivos –, bem como o princípio da proporcionalidade.

A partir de tal entendimento, o colegiado deferiu HC para afastar a prisão preventiva do médico e de outros réus envolvidos no caso.

Os ministros Marco Aurélio e Luiz Fux também afastaram a prisão, mas apenas por um fundamento processual (não preenchimento dos requisitos para prisão preventiva previstos no CPP), sem se pronunciarem sobre a questão do aborto.

Criminalização do aborto x direitos fundamentais

No voto, o ministro Barroso pondera acerca da interpretação conforme da Constituição com dispositivos do CP.

"A criminalização é incompatível com os seguintes direitos fundamentais: os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria." (grifos nossos)

Também considerou o presidente da turma o impacto da criminalização sobre as mulheres pobres, já que o tratamento criminal conferido pela lei brasileira "impede que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas privadas, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis". Dessa forma, lembrou S. Exa., "multiplicam-se os casos de automutilação, lesões graves e óbitos".

O ministro Barroso destacou no voto que praticamente nenhum país democrático e desenvolvido trata a interrupção da gestação no 1º trimestre como crime. Entre eles, elencou: EUA, Alemanha, Reino Unido, Canadá, França, Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália.

Consignou ainda o ministro Barroso que a tipificação penal viola o princípio da proporcionalidade por motivos que se cumulam, quais sejam:

"(i) ela constitui medida de duvidosa adequação para proteger o bem jurídico que pretende tutelar (vida do nascituro), por não produzir impacto relevante sobre o número de abortos praticados no país, apenas impedindo que sejam feitos de modo seguro;

(ii) é possível que o Estado evite a ocorrência de abortos por meios mais eficazes e menos lesivos do que a criminalização, tais como educação sexual, distribuição de contraceptivos e amparo à mulher que deseja ter o filho, mas se encontra em condições adversas;

(iii) a medida é desproporcional em sentido estrito, por gerar custos sociais (problemas de saúde pública e mortes) superiores aos seus benefícios." (grifos nossos)

A tese do ministro Barroso, de que a interrupção da gestação não deve ser punida criminalmente nos três meses iniciais da gravidez, foi seguida pelos ministros Rosa Weber e Edson Fachin.

A questão é polêmica e certamente vai causar grandes debates. Para se ter uma ideia, à noite, na Câmara dos Deputados, durante a votação das 10 medidas, os parlamentares se revezaram no microfone para dizer que a decisão é, na prática, "descriminalização" do aborto no país. "Está instituído o assassinato. É abominável essa decisão", afirmou o deputado Luiz Carlos Hauly.

Veja a íntegra do voto.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Leia mais

Migalhas Quentes

Padre é condenado por impedir interrupção de gestação de feto sem chances de vida

24/10/2016
Migalhas de Peso

Autonomia reprodutiva e o aborto

11/9/2016
Migalhas Quentes

Advocacia do Senado é contra aborto em grávidas infectadas pelo vírus da zika

10/9/2016
Migalhas Quentes

PGR defende legalidade de aborto em grávidas infectadas pelo vírus da zika

8/9/2016
Migalhas de Peso

Estupro e o aborto legal: propostas de novas regras

8/11/2015

Notícias Mais Lidas

TJ/MG revoga liminar e veta transfusão em paciente testemunha de Jeová

15/7/2024

Herdeiros que ocupam imóvel exclusivamente devem pagar aluguel

16/7/2024

OAB/SP divulga nova tabela de honorários com 45 novas atividades

15/7/2024

TJ/BA anula sentença após juiz dizer que "lugar de demônio é na cadeia"

15/7/2024

Funcionária chamada de “marmita do chefe" por colegas será indenizada

16/7/2024

Artigos Mais Lidos

Partilha de imóvel financiado no divórcio

15/7/2024

Inteligência artificial e Processo Penal

15/7/2024

Você sabe o que significam as estrelas nos vistos dos EUA?

16/7/2024

Advogado, pensando em vender créditos judiciais? Confira essas dicas para fazer da maneira correta!

16/7/2024

O setor de serviços na reforma tributária

15/7/2024