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Execução de cheque deve ser processada no mesmo local da agência sacada

Credor pedia que a execução se desse em foro diferente de onde se situava a agência bancária em que o devedor mantinha sua conta corrente.

12/6/2013

A execução de cheque não pago deve ser processada no foro onde se localiza a agência bancária da conta do emitente, ainda que o credor seja pessoa idosa a resida em outro lugar. Com esse entendimento, a 3ª turma do STJ determinou que compete ao foro de Quirinópolis/GO processar e julgar a execução de cheques ajuizada por um credor já idoso.

A turma entendeu que, por se tratar especificamente de cheques não pagos, o local de pagamento – e, portanto, o foro competente para a execução – é aquele onde está sediada a instituição financeira sacada. Para os ministros, o lugar é onde se situa a agência bancária em que o emitente mantém sua conta corrente.

O credor dos cheques pedia que a execução se desse no foro de Uberlândia/MG, local em que reside.

Compensação

O devedor apresentou incidente de exceção de incompetência, pedindo a remessa dos autos da ação de execução de título extrajudicial ao foro de Quirinópolis, local de pagamento dos cheques e de seu domicílio.

Em 1ª instância, o pedido foi provido para declarar a competência do foro de Quirinópolis. O credor interpôs agravo de instrumento e embargos de declaração, ambos rejeitados.

Inconformado, recorreu ao STJ, sustentando que a apresentação dos cheques ocorreu na praça de Uberlândia, via câmara de compensação, o que equivaleria à apresentação a pagamento, de modo que o juízo dessa comarca seria o competente para processar a ação executiva.

Argumentou ainda que todos os processos que envolvem o idoso, como parte (em qualquer dos polos) ou interveniente, estão sujeitos à regra do artigo 80 da lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), que atribui a competência ao foro de seu domicílio.

Normas gerais

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que os títulos de crédito foram emitidos em Quirinópolis, mesma localidade em que está sediado o banco sacado e onde reside o devedor.

Segundo ela, o artigo 576 do CPC define que o processamento da execução fundada em título extrajudicial deve seguir as normas gerais de distribuição de competência previstas no Livro I, Título IV, Capítulos II e III, desse diploma legal.

"Nesse contexto, a interpretação conjunta dos artigos 100, inciso IV, alínea d, e 585, inciso I, do CPC autoriza a conclusão de que o foro do lugar de pagamento é, em regra, o competente para o julgamento de processo executivo lastreado em cheque não pago, sendo certo que se trata de competência territorial, de natureza relativa, conforme já assentado por esta Corte", acrescentou a ministra.

Estatuto do Idoso

Quanto ao artigo 80 da 10.741/03, Nancy Andrighi observou que o dispositivo se limita a estabelecer a competência do foro do domicílio do idoso para processamento e julgamento das ações relativas à proteção judicial dos respectivos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos.

"Uma vez que a pretensão do recorrente objetiva a tutela de direito individual e disponível – execução de título de crédito –, impõe-se reconhecer a não incidência da norma precitada", disse a relatora.

A ministra também rechaçou o argumento de que a apresentação do cheque via câmara de compensação atrairia a competência para Uberlândia. Segundo ela, o artigo 34 da lei 7.537/85 "restringe-se a traçar relação de equivalência entre a apresentação do cheque à câmara de compensação e a apresentação a pagamento", mas não estabelece regra de fixação de competência.

Veja a íntegra da decisão.

___________

RECURSO ESPECIAL Nº 1.246.739 - MG (2011/0053278-0)

RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE: CARL WALTON RITCHIE

ADVOGADO: MARDEN DRUMOND VIANA E OUTRO(S)

RECORRIDO: ODILSON ABADIO DE RESENDE

ADVOGADO: GIORGI THOMPSON DE SOUZA E OUTRO(S)

EMENTA

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CHEQUE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO E SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. FORO COMPETENTE: LOCAL DE PAGAMENTO DO TÍTULO. DOMICÍLIO DO IDOSO. ART. 80 DA LEI 10.741/2003. NORMA APLICÁVEL A AÇÕES QUE VERSAM ACERCA DE INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS INDISPONÍVEIS OU HOMOGÊNEOS.

1- Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração.

2- O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico entre acórdãos que versem sobre situações fáticas idênticas.

3- A interpretação conjunta dos arts. 100, IV, “d”, 576 e 585, I, do CPC autoriza a conclusão de que o foro do lugar do pagamento (sede da instituição financeira) é, em regra, o competente para o julgamento de execução aparelhada em cheque não pago.

4- O art. 80 da Lei n. 10.741/2003 limita-se a estabelecer, de modo expresso, a competência do foro do domicílio do idoso para processamento e julgamento das ações que versam acerca de seus interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos (previstas no Capítulo III daquela lei), circunstância não verificada no particular.

5- A aplicação do art. 34 da Lei 7.537/1985 revela-se inviável, na medida em que seu texto não encerra regra de fixação de competência.

6- Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 02 de maio de 2013 (Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso especial interposto por CARL WALTON RITCHIE, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional.

Ação: incidente de exceção de incompetência, oposto por ODILSON ABADIO DE RESENDE no curso da execução de título extrajudicial ajuizada em face dele pelo recorrente, por meio do qual pleiteia a remessa dos autos ao foro de Quirinópolis - GO, local de pagamento dos títulos de crédito e de seu domicílio.

Decisão: acolheu o pedido formulado pelo recorrido, para declarar a competência do foro de Quirinópolis - GO.

Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelo recorrente.

Embargos de declaração: interpostos pelo recorrente, foram rejeitados.

Recurso especial: invoca dissídio jurisprudencial e alega violação dos artigos: 535, I e II, do CPC; 34 da Lei n. 7.573/1985; e 80 da Lei n. 10.741/2003. Afirma que houve negativa de prestação jurisdicional. Aduz que “a apresentação dos cheques ocorreu junto à praça de Uberlândia-MG via Câmara de Compensação, o que equivale à apresentação a pagamento” (e-STJ, fl. 177), de modo que o juízo dessa comarca é o competente para processar e julgar a presente ação executiva. Argumenta que “todos os processos que envolvem o idoso, como parte (em qualquer dos polos) ou interveniente, estão sujeitos à regra do art. 80” (e-STJ, fl. 179) da Lei n. 10.741/2003, que atribui a competência do foro de seu domicílio.

Decisão de admissibilidade: o TJ/MG não admitiu o recurso especial.

Agravo de instrumento: interposto pelo recorrente, foi provido, para o fim de que subissem os autos do recurso especial a esta Corte Superior.

É o relatório.

VOTO

Cinge-se a controvérsia a determinar o foro competente para processamento e julgamento de execução de título extrajudicial (cheque) ajuizada em face de idoso.

1- Da violação do art. 535 do CPC.

Os embargos de declaração, como é sabido, constituem instrumento processual excepcional que se destina ao aprimoramento da decisão que apresente obscuridade, contradição ou omissão.

Quando o acórdão analisa fundamentadamente todas as questões relevantes à solução da lide, ainda que adote posicionamento diverso do pretendido pela parte, não padece dos vícios mencionados.

Na hipótese, o TJ/MG se pronunciou de maneira a abordar todos os aspectos essenciais da matéria devolvida a seu exame, dentro dos limites que lhe são impostos por lei. Prova disso é que integram o objeto da própria irresignação recursal, que será enfrentada a seguir.

Nessa medida, não há falar em violação do art. 535 do CPC.

2- Da divergência jurisprudencial.

Entre os acórdãos trazidos à colação, não há o necessário cotejo analítico nem a comprovação da similitude fática, elementos indispensáveis à demonstração da divergência. Assim, a análise da existência do dissídio é inviável, porque foram descumpridos os arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ.

3- Do foro competente para processamento e julgamento de execução fundada em cheques não pagos.

Verifica-se, das premissas fáticas assentadas pelo acórdão impugnado, que os títulos de crédito que aparelham a presente ação foram emitidos em Quirinópolis - GO, mesma localidade em que está sediado o banco sacado e onde reside o recorrido/executado (e-STJ, fl. 148).

Segundo disposição expressa do art. 576 do Código de Processo Civil, o processamento da execução fundada em título extrajudicial deve seguir as normas gerais de distribuição de competência previstas no Livro I, Título IV, Capítulos II e III, desse diploma legal.

Nesse contexto, a interpretação conjunta dos arts. 100, IV, “d”, e 585, I, do CPC autoriza a conclusão de que o foro do lugar de pagamento é, em regra, o competente para o julgamento de processo executivo lastreado em cheque não pago, sendo certo que se trata de competência territorial, de natureza relativa, conforme já assentado por esta Corte (confira-se, a título ilustrativo, o CC 107.769/AL, minha relatoria, Segunda Seção, DJe 10/09/2010).

Convém esclarecer que, cuidando-se especificamente do título de crédito sob exame – cheque –, o local de pagamento (foro competente para a execução) é aquele onde está sediada a instituição financeira sacada. Vale dizer, é o lugar onde se situa a agência bancária em que o emitente mantém sua conta corrente.

Destaque-se que a doutrina atual acerca da matéria orienta-se precisamente nesse sentido, conforme se dessume das lições a seguir transcritas:

Tratando-se de cheque, a competência se fixa no lugar do pagamento, que é o indicado ao lado do nome do sacado (at. 2º, I, da Lei 7.357/1985), e só na omissão deste dado deriva para o domicílio do emitente. (Araken de Assis. Manual da Execução, 14ª ed., 2012, p. 426)

A execução fundada em cheque deve igualmente ser proposta no foro do local do pagamento, indicado ao lado do nome do sacado, que será sempre a instituição financeira depositária dos recursos do emitente. (Fredie Didier Jr., Leonardo J. C. Cunha, Paula S. Braga e Rafael Oliveira. Curso de Direito Processual Civil, vol. 5: Execução, 3ª ed., 2011, p. 242)

É preciso consignar, sob distinto norte, que o art. 80 da Lei n. 10.741/2003 – Estatuto do Idoso – não possui o alcance que o recorrente procura conferir-lhe.

Isso porque o dispositivo limita-se a estabelecer, de modo expresso, a competência do foro do domicílio do idoso para processamento e julgamento das ações concernentes à proteção judicial dos respectivos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos (previstas no Capítulo III daquela lei).

A respeito do enunciado normativo mencionado, valioso o apontamento feito por Oscar Hugo de Souza Ramos:

[...] nem todas as ações judiciais que tenham como parte um idoso, seja no pólo ativo ou passivo, terão obrigatoriamente como juízo competente o do foro do domicílio desse.

As ações que envolvam interesses e direitos individuais e disponíveis, como por exemplo, a maioria das questões contratuais, terão que obedecer às regras de competência previstas na legislação infraconstitucional, notadamente ao disposto nos artigos 91 a 101 do Código de Processo Civil, que cuida do disciplinamento da competência interna.

(in: Neida Maria Pinheiro (coordenadora). Estatuto do Idoso Comentado. 2ª ed., p. 444)

Assim, uma vez que a pretensão do recorrente objetiva a tutela de direito individual e disponível – execução de título de crédito –, impõe-se reconhecer a não incidência, na espécie, da norma precitada.

Por derradeiro, cumpre afastar a aplicação do invocado art. 34 da Lei 7.537/1985, na medida em que seu texto não encerra regra de fixação de competência.

De fato, a norma restringe-se a traçar relação de equivalência entre a apresentação do cheque à câmara de compensação e a apresentação a pagamento, circunstância estranha à discussão posta a desate.

Tudo isso considerado, impõe-se concluir que se afigura correta a solução dada à controvérsia pelo Tribunal de origem, na medida em que declarou o foro do lugar do pagamento como competente para o processamento da execução dos cheques emitidos pelo recorrido.

Forte nessas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.

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