A 1ª seção do STJ anulou parte de processo administrativo que aplicou pena de inidoneidade para licitar e contratar com o poder público, por dois anos, por alegada fraude em pregão. Com a decisão, ficam invalidados os atos posteriores ao momento em que a licitante deveria ter sido intimada para se defender.
Em 2010, a empresa venceu pregão do MEC para supervisionar obras nos Estados da BA e CE, com financiamento Federal. Após a assinatura do contrato, a unidade de compras e contratos do ministério entendeu que a empresa teria se aproveitado da qualificação de pequeno porte (EPP) sem fazer jus a essa condição.
Defesa prévia e final
Durante o processo, movido por outra participante do pregão, a empresa pôde se manifestar em três momentos: após representação da concorrente, em resposta ao pregoeiro e em defesa prévia apresentada após o parecer de unidade técnica que sugeria a penalidade à autoridade superior.
A lei de Licitações (lei 8.666/93), porém, prevê expressamente que, além da defesa prévia, em cinco dias, as licitantes têm direito à defesa final, com prazo de dez dias. Conforme o ministro Castro Meira, uma é prevista no parágrafo segundo do artigo 87 da lei; outra, no parágrafo terceiro do mesmo dispositivo.
“Dessa forma, revela-se manifesta a nulidade por cerceamento de defesa da impetrante, segundo se extrai de orientação já firmada por esta Corte em situação semelhante”, afirmou.
“Assim, deve ser anulado o processo administrativo a partir do momento em que a administração deixou de proporcionar oportunidade para a apresentação da defesa prevista”, concluiu o relator.
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Processo Relacionado : MS 17.431
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MANDADO DE SEGURANÇA Nº 17.431 - DF (2011/0173413-0)
RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
IMPETRANTE : JCA ENGENHARIA E ARQUITETURA LTDA
ADVOGADO : ALLAN HABIB TEIXEIRA E OUTRO(S)
IMPETRADO : MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
INTERES. : UNIÃO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE DE EMPRESA LICITANTE. PROCEDIMENTO. DEFESA FINAL. CERCEAMENTO. ART. 87, IV E § 3º, DA LEI N.º 8.666/93.
1. O mandado de segurança foi impetrado contra a aplicação da pena de inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público, por suposta ocorrência de fraude em Pregão Eletrônico, junto ao respectivo Ministério.
2. O artigo 87, § 3º, da Lei nº 8.666/93 dispõe ser do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, a competência para a aplicação da pena de inidoneidade prevista no inciso IV do referido dispositivo, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de dez dias.
3. O processo iniciou-se em decorrência de representação de empresa concorrente perante o pregoeiro, que, após adotar as providências cabíveis, determinou a remessa dos autos ao Coordenador Geral de Compras e Contratos, órgão vinculado à Subsecretaria de Assuntos Administrativos (SAA).
4. Após a instrução processual e realização de diligências junto aos órgãos integrantes da Subsecretaria de Assuntos Administrativos (SAA) e Subsecretaria de Planejamento e Orçamento, os autos foram conclusos ao Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto, que sugeriu ao Ministro de Estado a aplicação da pena de inidoneidade.
5. Durante todo o trâmite, a empresa impetrante foi notificada apenas para apresentar resposta à representação inicial da empresa concorrente; depois, perante o pregoeiro e, por último, quanto à defesa prevista no § 2º do art. 87, com prazo de 5 dias, por determinação do Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto.
6. A ausência de abertura de prazo para oferecimento de defesa final sobre a possível aplicação da pena de inidoneidade, consoante a determinação expressa contida no artigo 87, § 3º, da Lei de Licitações, acarreta a nulidade a partir desse momento processual, não logrando êxito a pretensão de nulidade ab initio. Precedente. Desse modo, fica prejudicado o exame das demais alegações relativas à ilegalidade do ato coator.
7. Segurança concedida em parte.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder em parte a segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves e Teori Albino Zavascki votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, a Sra. Ministra Eliana Calmon e o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima. Licenciado o Sr. Ministro Ari Pargendler. Sustentou, oralmente, o Dr. Lourenço Paiva Gabina, pela União.
Brasília, 26 de setembro de 2012(Data do Julgamento).
Ministro Castro Meira
Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator): O mandado de segurança foi impetrado contra iminente ato do Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação, que aplicou a pena de inidoneidade para licitar e contratar com o poder público por suposta ocorrência de fraude no Pregão Eletrônico nº 7/2010, junto ao respectivo Ministério, tendo em vista o parecer emitido pelo Coordenador-Geral de Compras e Contrato substituto, segundo o qual a licitante teria se valido da qualidade de empresa de pequeno porte (EPP), sem fazer jus a tal qualificação.
A impetrante sustenta a presença de seu direito líquido e certo com base nos seguintes argumentos:
a) não observância do devido processo legal substantivo, por ofensa aos princípios do contraditório e ampla defesa e por falta de motivação adequada do ato administrativo (e-STJ fl. 09);
b) ausência de má-fé, pois em momento algum se declarou como empresa de pequeno porte no intuito de fraudar o certame, tampouco se utilizou dos benefícios licitatórios conferidos a essa categoria de empresa (e-STJ fl. 14);
c) possibilidade de a empresa apresentar o balanço patrimonial após 4 meses do fim do ano-calendário, com base no art. 1.078 do CC, circunstância que tornaria legal sua qualificação como EPP para participar do pregão;
d) desproporcionalidade da sanção de inidoneidade, em razão da falta de dolo na conduta da impetrante (e-STJ fls. 26 e 28-34).
Aduz, outrossim, estar configurado o justo receio "que irão advir de tal decisão, uma vez que a JCA presta serviços a diversos órgãos da administração direta e indireta da União, e a declaração de sua inidoneidade para contratar contra a Administração Federal, decorrerá a rescisão de diversos contratos (cf. atestados anexos), bem como a demissão de todo o seu quadro de funcionários e o inevitável encerramento das atividades da Impetrante (interesse/necessidade)" (e-STJ fl. 04).
Ao final, requer seja concedida a segurança definitiva para declarar nulo o procedimento administrativo nº 23000.007846/2011-37, levando em consideração todas as irregularidades apresentadas (e-STJ fls. 36-37).
O pedido de urgência foi indeferido pelo Exmo. Senhor Ministro Presidente, consoante se verifica à fl. 313 (e-STJ).
A autoridade apontada como coatora ofertou informações, aduzindo:
a) inadequação da via eleita, tendo em vista que o exame da controvérsia demandaria avaliar os "elementos de convicção adotados pela Subsecretaria de Assuntos Administrativos do Ministério da Educação" (e-STJ fl. 329);
b) inexistência de prova pré-constituída, pois "não foi colacionado aos autos nenhum documento que faça referência à prática de qualquer ato pelo Ministro de Estado da Educação no referido processo administrativo" (e-STJ fls. 330-331);
c) ilegitimidade de parte, "uma vez que o objeto é alusivo à prática de ato - parecer técnico - por agente público federal, conforme a dicção do art. 109, VII, da Carta da República"(e-STJ fl. 331);
d) não haver ofensa ao princípio do contraditório e ampla defesa, já que o "órgão julgador não é obrigado a enfrentar todos os argumentos suscitados pela parte interessada na defesa apresentada" (e-STJ fl. 334);
e) legalidade da pena de inidoneidade, tendo em vista que o Ministério da Educação enfrentou toda a questão relativa ao enquadramento da impetrante como EPP, constatando fraude no processo licitatório (e-STJ fls. 332-333).
Às fls. 362-375 (e-STJ), a impetrante refuta os fundamentos das informações prestadas, reiterando ser adequada a via eleita; haver prova pré-constituída de suas alegações; a competência da autoridade coatora; violação à ampla defesa e ao contraditório e desconsideração da boa-fé.
Instado a manifestar-se, o ilustre Procurador Regional da República, no exercício das funções de Subprocurador-Geral da República, Maurício Azevedo Gonçalves consignou "não ser necessária a intervenção do Ministério Público Federal como custos legis no feito" (e-STJ fl. 359).
Por meio de petição protocolada sob nº 00377696, a impetrante narra a ocorrência de fato novo, nos termos do artigo 462 do CPC, haja vista o Ministro de Estado da Educação ter-lhe aplicado a pena de inidoneidade para licitar a contratar com a Administração Pública Federal por 2 (dois) anos, com fundamento no art. 87 c/c art. 88 da Lei nº 8.666/93, em virtude do cometimento da infração capitulada no artigo 90 do referido diploma, consoante se infere de cópia da Portaria nº 1.566, de 1º de novembro de 2011 (e-STJ fl. 391).
Conclui, asseverando que o presente mandado de segurança preventivo passa a ser repressivo, "visto que concretizou-se no plano material o ato coator que buscava ser evitado na ação mandamental impetrada preventivamente" (e-STJ fl. 380).
Nesse contexto, adita o pedido inicial com fulcro nos argumentos a seguir delineados:
a) falta de intimação da impetrante para apresentação de defesa antes da aplicação da pena de inidoneidade, consoante previsão do artigo 87, inciso IV, § 3º, da Lei nº 8.666/93 (e-STJ fl. 381);
b) dificuldade de acesso aos autos, pois teve que se submeter a um procedimento novo de requerimento de cópias no Ministério da Educação por meio de envio de e-mail a ser deferido no prazo de até 48 horas (e-STJ fls. 382-383);
c) ocorrência de prejuízos econômicos decorrentes da aplicação da pena de inidoneidade "pondo em risco até mesmo a sua sobrevivência" (e-STJ fl. 381);
d) necessidade de gradação da pena, observância da boa-fé e direito subjetivo de utilizar-se do procedimento previsto no artigo 1.078 do CC (e-STJ fls. 383-388).
Por derradeiro, pleiteia seja concedida em definitivo a segurança para:
a) declarar nulo de pleno direito o processo administrativo n. 23000.007846/2011-37, em trâmite no Ministério da Educação, levando em consideração todas as irregularidades apresentadas na presente demanda (e-STJ fl. 388);
b) alternativamente, suspender os efeitos da decisão já proferida acerca da Declaração da Pena de Inidoneidade (e-STJ fl. 389);
c) a intimação da autoridade impetrada para fornecer cópia da íntegra do procedimento administrativo, se for indispensável ao julgamento (e-STJ fl. 389).
A impetrante reitera a ocorrência de fato novo, pleiteando liminarmente a suspensão dos efeitos da pena de inidoneidade aplicada no Processo Administrativo (e-STJ fls. 407-476). Às fls. 487-587 requereu a juntada de cópia do Processo Administrativo.
Indeferi o pedido de liminar, por entender não estarem presentes os requisitos autorizadores da medida (fls. 481-483).
Instada a se manifestar sobre os documentos juntados, a autoridade impetrada consignou que a Coordenação de Contratos e Projetos "não tem nada a acrescentar sobre o assunto objeto dos citados memorandos, considerando-se que a matéria em tela foi anteriormente analisada por esta Coordenação, não tendo sido registrado nenhum fato novo" (e-STJ fl. 602).
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator):
I. Breve histórico
O mandado de segurança foi impetrado contra iminente ato a ser praticado pelo Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação, que aplicou a pena de inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público, por suposta ocorrência de fraude no Pregão Eletrônico nº 7/2010, junto ao respectivo Ministério.
No entanto, em 03 de novembro de 2011, ocorreu a superveniente aplicação da penalidade pelo prazo de 2 (dois) anos pela autoridade impetrada, com fundamento no artigo 87 c/c artigo 88 da Lei nº 8.666/93, consoante se infere de cópia da Portaria nº 1.566, de 1º.11.2011 (e-STJ fl. 391).
A incidência da penalidade estaria embasada no parecer emitido pelo Coordenador-Geral de Compras e Contrato substituto, segundo o qual a licitante teria se valido da qualidade de empresa de pequeno porte (EPP) sem fazer jus a tal condição.
Após lograr-se vencedora no certame, em 18 de março de 2010, a impetrante firmara o Contrato nº 33/2010 com o MEC, tendo por objeto "a supervisão/monitoramento das obras financiadas com recursos do Ministério da Educação, nos Estados da Bahia e Ceará, nas redes federal, estadual, municipal, áreas da educação superior, educação profissional e tecnológica, ensino médio, ensino fundamental e educação infantil" (e-STJ fl. 42).
II. Preliminares: inadequação da via eleita, inexistência de prova pré-constituída, ilegitimidade da autoridade passiva impetrada e inobservância do devido processo legal substantivo
Ficam prejudicadas as alegações da autoridade impetrada de inexistência de prova pré-constituída do ato coator e ilegitimidade passiva do Ministro de Estado, ante a expedição da Portaria Ministerial nº 1.566, de 1º de novembro de 2011, em que é aplicada a pena de Declaração de Inidoneidade à ora impetrante (fls. 391 e-STJ).
Não procede, outrossim, a assertiva de inadequação da via eleita, ao argumento de que seria necessário ingressar no mérito do ato administrativo – elementos de convicção adotados pela Subsecretaria de Assuntos Administrativos do Ministério da Educação, que opinou pela aplicação da pena de inidoneidade. Malgrado o Poder Judiciário não possa imiscuir-se no mérito dos atos administrativos, tem o dever de realizar o controle de legalidade sobre tais atos, como se postula nesta impetração.
Quanto à ofensa ao devido processo legal, a empresa assevera:
a) que lhe foi negado o direito de ter acesso aos autos, pois teve que se submeter a um procedimento novo de requerimento de cópias no Ministério da Educação por meio de envio de e-mail a ser deferido no prazo de até 48 horas (e-STJ fls. 382-383);
b) que a Administração foi "silente quanto a todas as controvérsias/fatos modificativos argumentados por esta Impetrante" (e-STJ fl. 10);
c) o artigo 87, IV, § 3º, da Lei nº 8.666/93 dispõe que "antes de ser aplicada a pena de inidoneidade pelo Ministro de Estado [in casu] deveria ter sido facultada a defesa desta Impetrante (interessada) no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista" (e-STJ fl. 381).
Alega também que lhe fora negado o direito de ter acesso aos autos. Todavia, não há prova pré-constituída de tal assertiva, o que impede o exame na via estreita do writ. Some-se a isso o fato de que, prima facie, não é desarrazoado o rito estabelecido pelo MEC para a aquisição de cópias de procedimentos administrativos, já que compete a cada órgão da administração estabelecer os procedimentos próprios de gestão, organização e atendimento ao público.
Mostra-se ausente, outrossim, a suposta nulidade do processo administrativo quanto à alegação de que não foram examinadas todas as teses da empresa licitante suscitadas em suas manifestações de defesa.
Ainda que de maneira implícita, a Administração repeliu as insurgências da impetrante, ao concluir que houve faturamento acima do limite adequado ao seu enquadramento como Empresa de Pequeno Porte, conforme se verifica do seguinte trecho das informações:
33. No tocante a suposta violação do contraditório e da ampla defesa, cumpre transcrever os seguintes trechos do Relatório produzido pela Coordenação-Geral de Compras e Contratos, datado em 21 de junho de 2011 (doc. anexo), in verbis:
[...]
2. Em síntese, àqueles documentos constituem das seguintes informações:
[...]
- contrarrazões da JCA/procuração/sexta alteração contratual/contrato social consolidado da JCA/ Certidão Simplificada Junta Simplificada do Estado da Bahia/Livro de Abertura - Livro Diário nº 4 - 01.01 a 31.12.2008 (fls. 3.933/3.959).
9. A autoridade Superior da SAA, acolhendo as orientações jurídicas e técnicas, encaminhou à JCA Ofício nº 1.319/2010/SAA/SE/MEC, de 04/11/2010, para apresentação de contraditório e ampla defesa, mediante alegação de que a empresa não poderia ser enquadrada como EPP, à época da realização do certame licitatório. Por sua vez, a empresa apresentou sua defesa em 21/11/2010 (4.284/4.263).
34. É imperioso consignar que em sede de processo administrativo que resulte na aplicação de sanção é indispensável que haja o pronunciamento conclusivo sobre as questões necessárias para o deslinde da controvérsia, bem como haja a devida fundamentação da decisão a ser adotada.
35. Contudo, o agente público/julgador não é obrigado enfrentar todos os argumentos suscitados pela parte interessada na defesa apresentada.
Nesse sentido, vale citar o seguinte trecho de ementa de julgado do STJ, que, mutatis mutandis, aplica-se a matéria em discussão, in verbis:
1 - Consoante entendimento pacificado desta Corte, o órgão judicial, para expressar sua convicção, não precisa aduzir comentários sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Embora sucinta a motivação, pronunciando-se sobre as questões de fato e de direito para fundamentar o resultado, exprimindo o sentido geral do julgamento, não se emoldura violação ao art. 535 do Código de Processo Civil (AgRg no REsp 1106593/MG. Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 01/10/2009. Dje 26/10/2009)
36. Sendo assim, é forçoso concluir que a manifestação técnica emitida pela SAA/MEC que sugere a aplicação da sanção de declaração de idoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, não merece qualquer reparo, haja vista que foi devidamente fundamentada, consoante os termos das manifestações acima transcritas (e-STJ fls. 333-334 – sem destaques no original).
III. Inobservância do prazo decenal para a defesa
No entanto, merece guarida o argumento de que a autoridade impetrada deixou de observar o prazo decenal para defesa da impetrante, após a conclusão final da Subsecretaria de Assuntos Administrativos que sugeriu a aplicação da pena de inidoneidade para licitar ao Ministro de Estado.
Nesse sentido, não deixa dúvidas a dicção do art. 87, § 3º, da Lei nº 8.666/93, ao atribuir ao Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, a competência para a aplicação da pena de inidoneidade prevista no inciso IV do referido dispositivo, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias.
Para que fique bem elucidado esse ponto, a demonstração da nulidade, rememoro a cronologia dos fatos.
1) 24.2.10 – a impetrante logra-se vencedora no Pregão Eletrônico nº 7/2010 realizado junto ao Ministério da Educação, consoante se verifica do item 04 – "Fiscalização Obras Civis" – do termo de adjudicação datado de 10.3.10, acostado à fl. 229 (e-STJ);
2) 18.3.10 – a impetrante firma com o Ministério da Educação o "Contrato nº 33/2010", que tem por objeto "a supervisão/monitoramento das obras financiadas com recursos do Ministério da Educação, nos Estados da Bahia e Ceará, nas redes federal, estadual, municipal, áreas da educação superior, educação profissional e tecnológica, ensino médio, ensino fundamental e educação infantil" (e-STJ fl. 42);
3) 28.4.10 – nos autos do Processo nº 23000.011582/2009-00, relativo ao Pregão Eletrônico em referência, a empresa Artcop Plotagem Serviços de Engenharia apresenta representação administrativa perante o Pregoeiro requerendo diligência com o fim de demonstrar que a empresa impetrante teria se valido das benesses concedidas às empresas de pequeno porte,sem fazer jus a tal classificação (e-STJ fls. 54-65);
4) 11.5.10 – JCA Engenharia e Arquitetura Ltda oferece resposta à representação, com a juntada de procuração, alteração contratual, contrato social consolidado, certidão simplificada do Estado da Bahia e Livro Diário de 01.01 a 31.12.08 (e-STJ fls. 66-104);
5) 12.5.10 – conclusão do Pregoeiro atestando a regularidade da situação da impetrante quando da realização do Pregão (Ofício nº 10/2010 enviado ao representante da Artcop Plotagem Serviços de Engenharia Ltda.) (e-STJ fl. 105 - PA fl. 3.976);
6) 13.5.10 – Artcop Plotagem Serviços de Engenharia Ltda. reitera a existência de irregularidades perante o Pregoeiro. Junta documentos (e-STJ fls. 106-118);
7) 21.5.10 – Pregoeiro reafirma a regularidade da situação da impetrante quando da ocorrência do Pregão (Ofício nº 23/2010 enviado ao representante da Artcop Plotagem Serviços de Engenharia Ltda.) (e-STJ fl. 115 - PA fl. 3.989);
8) 22.6.10 – Artcop Plotagem Serviços de Engenharia Ltda. insiste nas irregularidades apontadas, juntado o Livro Diário nº 05 de 01.01 a 31.12.09 (e-STJ fls. 119-137; PA fl. 4.037);
9) 19.8.10 – Pregoeiro envia ao Coordenador-Geral de Compras e Contratos relatório acerca da representação formulada pela empresa concorrente, requerendo parecer conclusivo da Consultoria Jurídica com o fim de elucidar a questão (e-STJ fl. 138);
10) 23.9.10 – Consultoria Jurídica da Coordenação Geral de Licitações e Negócios Jurídicos sugere o encaminhamento à Subsecretaria de Planejamento e Orçamento - SPO para que seja realizado estudo técnico da situação da empresa - Informação 202/2010 (e-STJ fls. 141-145);
11) 7.10.10 – atendendo ao requerimento do Pregoeiro à fl. 150, a Subsecretária de Assuntos Administrativos determina o envio do processo à SPO – Memorando nº 464/2010 (e-STJ fl. 153);
12) 20.10.10 – Subsecretaria de Planejamento e Orçamento/SPO, com base na Nota Técnica nº 09/2010 formulada pela Coordenação de Contabilidade, que concluiu pela existência de "excedente significativo da receita bruta auferida pela empresa" (e-STJ fls. 155-156), determinou a remessa dos autos ao Pregoeiro para a adoção das medidas cabíveis contra a empresa (e-STJ fl. 157);
13) 28.10.10 – Coordenador-Geral de Compras e Contratos sugere à Subsecretaria de Assuntos Administrativos o acolhimento das recomendações do pregoeiro – cancelamento total da nota de empenho, rescisão unilateral do contrato com aplicação das penalidades cabíveis, cancelamento da homologação e adjudicação, abertura de vista à empresa e a aplicação da pena de inidoneidade, conforme o disposto no artigo 87, IV, e § 3º, c/c artigo 88, ambos da Lei nº 8.666/93 (e-STJ fls. 158-159);
14) 4.11.10 – a Subsecretaria de Assuntos Administrativos, subordinada à Secretaria Executiva, expede o Ofício 1.319/2010 com o fim de notificar a impetrante para apresentar defesa prévia no prazo de 5 dias úteis (e-STJ fl. 160; PA fl. 4.245);
15) 21.11.10 – Empresa JCA Engenharia e Arquitetura Ltda apresenta resposta ao pregoeiro, alegando: i) que, à época da realização do certame, enquadrava-se como Empresa de Pequeno Porte; ii) antinomia entre o art. 3º, § 9º, da LC 123/06 e do art. 1.078 do CC/02; iii) que não se utilizou do benefício de EPP com relação ao lote 06; iv) existência de boa-fé ao se enquadrar como EPP. Ao final, pugna pelo não acolhimento das providências sugeridas e a não incidência de qualquer penalidade (e-STJ fls. 163-176; PA fl. 4.248-4.761). Junta documentos (e-STJ fls.177-178);
16) 10.1.11 – Coordenador-Geral de Compras e Contratos, após examinar as alegações de defesa da empresa, pareceres jurídicos e relatórios técnicos, recomendou ao Subsecretário de Assuntos Administrativos as seguintes providências: i) rescisão unilateral do contrato Administrativo 33/2010; ii) suspensão da empresa de licitar e contratar com o Ministério da Educação, no âmbito da Administração Direta e Indireta, pelo período de 12 meses, na forma do inciso III do artigo 87 da Lei nº 8.666/93 (e-STJ fl. 184; PA 4.309);
17) 11.1.11 – Após concordar com as recomendações da Coordenadoria de Compras e Contratos, o Subsecretário de Assuntos Administrativos encaminhou os autos do processo 23000.011582/2009-00 à Coordenação-Geral de Recursos Logísticos para a realização das providências necessárias à efetivação das medidas, bem como ordenou a notificação à empresa das penalidades cabíveis (e-STJ fl. 185; PA 4.310);
18) 12.1.11 – o Coordenador-Geral de Recursos Logísticos encaminha os autos à Coordenação de Documentação e Gestão de Processos (e-STJ fl. 186) que, na sequência, apresenta parecer às fls. 187-188. Posteriormente, o Coordenador de Contratos e Projetos sugere a rescisão dos contratos (e-STJ fl. 190).
19) 11.2.11 – a Subsecretária de Assuntos Administrativos autoriza a rescisão unilateral do contrato nº 33/2010 firmado com a ora impetrante (e-STJ fl. 191);
20) 20.6.11 – o Coordenador-Geral de Compras e Contratos solicita informações à Coordenadoria de Recursos Logísticos "acerca da existência de pendências e serviços autorizados e não concluídos relativo ao Contrato nº 33/2010, formalizado com a Empresa JCA Engenharia e Arquitetura Ltda.", em razão da "necessidade de se aplicar à citada empresa a penalidade de inidoneidade, na forma do inciso IV art. 87 da Lei 8.666/93, por cometer fraude no processo licitatório - Pregão Eletrônico nº 07/2010" (Memo nº 672/2011)(e-STJ fl. 206). Informações prestadas à fl. 207;
21) 21.6.11 – o Parecer do Coordenador-Geral de Compras e Contratos recomenda ao Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto que declare a inidoneidade da empresa JCA Engenharia e Arquitetura Ltda., proibindo-a de licitar e contratar com a Administração Pública Federal por 2 anos, pelo cometimento da infração capitulada no artigo 90 da Lei de Licitações. Sugere, outrossim, a notificação da empresa (e-STJ fl. 213);
22) 21.6.11 - o Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto, nos autos do Processo nº 23000.011582/2009-00, determina a notificação da empresa, "concedendo o prazo de 5 (cinco) dias úteis para defesa prévia, conforme previsto no § 2º do artigo 87 da Lei nº 8.666/93. Ofício 469/2011 - Assunto: Notificação de aplicação de penalidade" (e-STJ fl. 213 e 342; PA fl. 174);
23) 14.7.11 – JCA Engenharia e Arquitetura Ltda. apresenta defesa prévia ao Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto, nos autos do Processo nº 23000.007846/2011-37. Petição foi assinada em 30.06.11 (e-STJ fls. 545-567 ; PA fl. 227-249);
24) 10.8.11 – o Parecer Técnico nº 01/2011 exarado pelo Coordenador-Geral de Compras e Contratos Substituto mantém a recomendação de que seja aplicada a pena de inidoneidade, determinando a remessa dos autos ao Gabinete do Ministro, na forma do inciso IV do art. 87 da Lei nº 8.666/93 (e-STJ fls. 568-574);
25) 12.8.11 – o Subsecretário de Assuntos Administrativos acolheu a proposta da Coordenação-Geral de Compras e Contratos com base na Nota Técnica nº 01/2011 e determinou a remessa dos autos ao Gabinete do Ministro (e-STJ fl. 575);
26) 12.8.11 – o Exmo. Sr. Ministro de Estado da Educação determina a remessa dos autos à Consultoria Jurídica – Conjur para análise e manifestação (e-STJ fl. 576);
27) 30.8.11 – o Parecer Conjur nº 670/2011, nos autos do Processo nº 23000.007846/2011-37 conclui pela necessidade de aplicação da pena de inidoneidade. (e-STJ fls. 577-580; PA fls. 259-262);
28) 1º.11.11 - a Portaria nº 1.566 do Ministro de Estado da Educação aplicando a pena de inidoneidade para licitar, nos termos do art. 87, inciso IV, § 3º, da Lei nº 8.666/93, pelo cometimento da infração do art. 90 do mesmo diploma (e-STJ fl. 581; PA fl. 263).
Como facilmente se verifica dos eventos ora relacionados, o processo contra a impetrante iniciou-se em decorrência de representação da concorrente Artcop Plotagens Serviços de Engenharia Ltda. perante o pregoeiro, que, após adotar as providências cabíveis, determinou a remessa dos autos ao Coordenador-Geral de Compras e Contratos, órgão vinculado à Subsecretaria de Assuntos Administrativos (SAA).
O artigo 2º, do Anexo II, do Decreto 6.320/2007 – em vigor à época do Pregão, o qual teve sua redação mantida com a edição do Decreto 7.690/2012 – ao estabelecer a estrutura organizacional do Ministério da Educação, dispõe que o Gabinete e a Secretaria Executiva são órgãos de assistência direta e imediata ao Ministro de Estado.
Esse dispositivo consigna ainda que a Secretaria Executiva é composta pela Subsecretaria de Assuntos Administrativos (SAA), Subsecretaria de Planejamento e Orçamento (SPO) e pela Diretoria de Tecnologia da Informação (DTI). Já a Subsecretaria de Assuntos Administrativos é composta pela Coordenação-Geral de Pessoas, Coordenação-Geral de Compras e Contratos, Coordenação-Geral de Recursos Logísticos e Coordenação-Geral de Gestão Administrativa e encontra-se subordinada à Secretaria Executiva.
Após a instrução processual e realização de diligências junto aos órgãos integrantes da Subsecretaria de Assuntos Administrativos (SAA) e Subsecretaria de Planejamento e Orçamento, os autos foram conclusos ao Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto, que sugeriu a aplicação da pena de inidoneidade ao Ministro de Estado.
Durante todo o trâmite, a impetrante foi notificada apenas para apresentar resposta à representação inicial da empresa concorrente (evento nº 4); depois perante o pregoeiro (evento nº 14) e, por último, a defesa prevista no § 2º do artigo 87, com prazo de 5 dias por determinação do Subsecretário de Assuntos Administrativos Substituto (eventos nºs 22 e 23).
Em momento algum, a empresa fora instada a apresentar sua defesa final sobre a possível aplicação da pena de inidoneidade, consoante a determinação expressa contida no artigo 87, § 3º, da Lei de Licitações, de seguinte teor:
Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
§ 1º Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou cobrada judicialmente.
§ 2º As sanções previstas nos incisos I, III e IV deste artigo poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso II, facultada a defesa prévia do interessado, no respectivo processo, no prazo de 5 (cinco) dias úteis.
§ 3º A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação.
Dessa forma, revela-se manifesta a nulidade por cerceamento de defesa da impetrante, segundo se extrai de orientação já firmada por esta Corte em situação semelhante:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. OPORTUNIZAÇÃO DE DEFESA. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE DA EMPRESA LICITANTE. ART. 87, INCISO IV E § 3º, DA LEI N.º 8.666/93. LIMINAR. PERICULUM IN MORA E FUMUS BONI JURIS. DEMONSTRADOS.
1. A concessão de liminar, em sede de Mandado de Segurança, reclama a demonstração do periculum in mora, que se traduz na urgência da prestação jurisdicional, bem como a caracterização do fumus boni juris, consistente na plausibilidade do direito alegado, qual seja, o direito líquido e certo comprovado de plano e amparável na via mandamental, a teor do que dispõe o art. 7º, inciso III, da Lei 12.016/2009.
2. Verificado o equívoco da decisão de fls. 430/433 quanto à inexistência, nos autos, de ato coator praticado por Ministro de Estado, exercendo o juízo de retratação, mister seja o pedido de liminar reapreciado.
3. A defesa formalizada no Processo Administrativo n.º 21036.001520/2005-15, instaurado pelo Superintendente de Agricultura Pecuária e Abastecimento de Pernambuco que se buscava apurar falhas na execução do Contrato n.º 01/2006, firmado com a empresa impetrante, nos termos do Pregão Eletrônico n.º 001/2005, não aproveita ao Processo Administrativo n.º 21036.000384/2010-11, instaurado pelo Ministro de Estado da Agricultura para fins de aplicação da sanção de "declaração de inidoneidade".
4. Fumus boni juris que, prima facie, encontra-se evidenciado porquanto violado o disposto no art. 87, § 3º, da Lei n.º 8.666/93, ("§ 3º. A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação)" a demonstrar a liquidez e certeza do direito alegado.
5. O periculum in mora, por sua vez, ressoa evidente na proibição de licitar e contratar com a Administração Pública resultante da declaração de inidoneidade pelo Ministro de Estado da Agricultura.
6. Agravo regimental desprovido para manter a decisão que concedeu a liminar para suspender os efeitos decisão do Ministro de Estado que declarou a inidoneidade da empresa impetrante para fins de oportunizar a sua defesa no Processo Administrativo n.º 21036.000384/2010-11 (AgRg na RCDESP no MS 15.267/DF, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 01/02/2011).
Assim, deve ser anulado o processo administrativo a partir do momento em que a Administração deixou de proporcionar oportunidade para a apresentação da defesa prevista no § 3º do art. 87 da Lei nº 8.666/93, não logrando êxito a pretensão de nulidade ab initio. Prejudicado o exame das demais alegações relativas à ilegalidade do ato coator.
Ante o exposto, concedo em parte a segurança.
É como voto.