O SBT foi condenado pela 8ª câmara de Direito Privado do TJ/SP a indenizar uma mulher por mensagem imprecisa em leilão de oferta mínima. De acordo com os autos, a requerente alega que foi enganada pela rede de televisão após receber mensagem equivocada sobre seu lance.
Ela afirma ter enviado, por mensagem de celular, o lance de R$ 0,01 na promoção, que dava um carro ao participante que enviasse o menor e único lance. No entanto, a apelante recebeu aviso de que já havia, no banco de dados a rede de TV, valor ofertado menor do que o seu. Ela recebeu o texto "SBT: Já recebemos um lance igual ao seu de 0,01. No momento o menor lance único está abaixo do seu. Tente novamente".
A requerente alega que se sentiu ludibriada após a notificação, uma vez que é impossível a oferta de lance negativo. O pedido de indenização foi feito a título de dano moral, a fim de servir de desestímulo à conduta reprovável da emissora.
O SBT alegou "vício operacional" na falha, o que foi contestado pelo desembargador Caetano Lagrasta, relator da ação, que afirmou que a explicação "não se mostra como justificativa, eis que constatada a falha, permaneceu no ar".
Para Lagrasta, a indenização tem caráter compensatório pela dor sentida pela vítima, além de servir "de desestímulo e inibição das condutas da mesma natureza". A indenização por danos morais foi fixada em 50 salários mínimos.
Divergente
O revisor, desembargador Ribeiro da Silva, proferiu voto divergente. Para ele, o erro não se trata de fraude, mas apenas de falha no sistema. Ele afirmou que nem todo mal-estar configura dano moral. "Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos", afirmou.
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Processo: 0078727-05.2008.8.26.0224
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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULOACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0078727-05.2008.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos, em que é apelante T.A.S. (JUSTIÇA GRATUITA) sendo apelado TVSBT- CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A.ACORDAM, em 8a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, CONTRA O VOTO DO REVISOR QUE DECLARA.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores CAETANO LAGRASTA (Presidente), RIBEIRO DA SILVA E LUIZ AMBRA.
São Paulo, 11 de abril de 2012.
CAETANO LAGRASTA
PRESIDENTE E RELATORVoto n. 26079 - 8a Câmara de Direito Privado
Apelação n. 0078727-05.2008.8.26.0224 – Guarulhos
Apelante: T.A.S.
Apelado: TVSBT Canal 4 de São Paulo S.A.
Juíza: Mareia BlanesAção indenizatória. Propaganda enganosa.
Nexo de causalidade estabelecido. Dano moral configurado. Indenização devida.
Sentença reformada. Recurso provido.
Vistos.
Trata-se de ação de indenização por danos morais movida por T.A.S. em face de TVSBT
Canal 4 de São Paulo S.A.
A r. sentença de fls. 119/121, cujo relatório se adota, julgou improcedente o pedido condenando a autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, com a observância do disposto no art.12, da Lei 1060/50.
Irresignada apela a autora aduzindo, em síntese, que é aplicável ao caso a Lei 8.078/90.
Alega que foi enganada pelo requerido, eis que de acordo com o regulamento do leilão seria pago prêmio ao consumidor que desse o menor lance, e tendo oferecido o lance de 0,01 recebeu a informação de que já havia lance menor do que o seu, o que não pode ser aceito, haja vista que não há como dar lance negativo.
Aduz que se sentiu ludibriada devendo ser indenizada a título de dano moral, a fim de servir de desestimulo à conduta reprovável do réu. Pleiteia a reforma da r.sentença julgando-se procedente o pedido, invertendo-se a sucumbência.
Recurso tempestivo, isento de preparo e respondido (fls. 132/138).
É o relatório.
Atento à determinação do CNJ, tendo cumprido as metas programadas, com o julgamento dos processos assumidos do Acervo do Des. Álvares Lobo, inicio a apreciação dos processos de 2009 em diante. Acresce que, a partir da unificação dos tribunais, desde abril de 2005, até dezembro de 2011 este Relator proferiu 14.908 votos.
Afasta-se a alegação de preclusão lógica levantada pelo apelado. A afirmativa de ter a autora se valido da própria torpeza não é questão a ser resolvida preliminarmente ou como prejudicial, visto que as considerações não integraram o dispositivo, razão de conhecer e analisar o recurso.
Não é possível admitir, o que hoje se torna corriqueiro, em transações envolvendo utilização de aparelhos de informática, comunicações em geral, especialmente em se tratando de transações bancárias ou mesmo acesso à Justiça, tais como "falha do sistema", "queda da rede", etc. Ora, a alegação do requerido de que teria havido "vício operacional" não se mostra como justificativa, eis que constatada a falha, permaneceu no ar.
A apelante informa que ofereceu o menor lance, ou seja, R$ 0,01, o que segundo regulamento lhe daria o direito a comprar o bem oferecido (item 1.3 do regulamento - íl.45), entretanto para sua surpresa recebeu a seguinte informação: "SBT: Já recebemos um lance igual ao seu de 0,01. No momento o menor lance único está abaixo do seu. Tente novamente". Ora, se o próprio regulamento diz que o comprador que desse o menor lance teria direito a compra, não há como aceitar a informação de que haveria lance menor do que o oferecido pela autora, eis que qualquer valor inferior ao dado por ela é negativo, e, portanto estaria fora do regulamento.
Assim, a atividade tornou-se enganosa (art. 6o, inciso IV, do CDC), não o era, enquanto o sistema respondia aos lances dos participantes, porém passou a ser desde o momento em que houve a falha e esta deixou de ser prontamente corrigida, eis o relato da própria apelada: *(...) 05 dias após o envio da mensagem IMPRECISA acima mencionada, foi realizado um broadcast (disparo de mensagem SMS para os cadastrados no banco de dados) informando o intervalo do lance mínimo atual (...)fl.87w.
Mais a mais, as considerações da r. sentença padecem de fundamento para justificar a atividade da empresa, eis que apenas consta uma reclamação, quando na verdade devem ser milhares ou, quando nada, centenas. Nesse sentido vide fls. 94/101.
Assim, presente o nexo de causalidade entre o engodo promovido pelo requerido e o desgosto e o sentimento sofrido pela autora ter sido enganada, resta fixar a indenização, que servirá de caráter compensatório pela dor sentida pela vítima, como também de desestímulo e inibição das condutas da mesma natureza, sendo desnecessário falar em "prova" do prejuízo, eis que no dano moral prescinde-se desta. Conforme entendimento desta Câmara, expresso na GARCIA: conforme jurisprudência já consolidada do Eg. Superior Tribunal de Justiça, basta a prova do fato (...) a humilhação, constrangimento e transtornos lhes são conseqüências. Suficiente, portanto, o abalo psíquico da vítima para o caracterizar e ensejar indenização. Cuida-se, em suma, do chamado damnum in re ipsa.
(Ainda a respeito, as Apelações n° 335.773.4/0, 341.347.4/5, 259.790.4/6, 443.594.4/5 e 470.509.4/1, em que fui Relator).
Citando Wilson Mello da Silva (Das InexecuçÕes das Obrigações e suas Conseqüências, 3ª edição, S. Paulo, 1965, n. 157): "Dano moral são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico, ou seja, ê o dano causado injustamente a outrem, que não atinja ou diminua o seu patrimônio".
Assim, julga-se procedente o pedido condenando-se o requerido ao pagamento de indenização por danos morais no valor equivalente a 50 salários mínimos, a ser pago de uma única vez, respondendo ainda pelas custas e despesas processuais, além da verba honorária fixada em 10% sobre o valor da condenação.
Acresce, desde logo, que a fixação da indenização no equivalente a salários mínimos, conforme entendimento desta Relatoria (Apelações n. 410.796.4/0, 456.716.4/3, 441.092.4/0) e de acordo com a jurisprudência de tribunais superiores (Súmula 490 do STF), não necessita de acréscimo de juros ou correção monetária, posto que será paga no valor do salário mínimo à época da quitação.
Ante o exposto, DA-SE PROVIMENTO ao recurso.
CAETANO LAGRASTA
RelatorVOTO N°: 22762
APEL. N°: 0078727-05.2008.8.26.0224
COMARCA: GUARULHOS
APTE.: T.A.S.
APDO.: TVSBT - CANAL 4 DE SÃO PAULO S/AVOTO DIVERGENTE
Adotado o relatório de fls. 143, em que pese o entendimento do Douto Relator sorteado, dele ouso divergir para negar provimento ao recurso da autora, mantendo o resultado da sentença de fls. 119/121.
Apenas em um ponto merece reparo a sentença, sem que seu resultado mereça reforma: o Juízo a quo entendeu que a autora deveria ter feito oferta maior se quisesse adquirir o bem, porém não era este o objetivo do jogo.
Vencia quem desse o menor lance, e ainda deveria ser lance único; não vencia quem desse o maior lance, não se tratando de um leilão padrão.
Por óbvio que a mensagem enviada, "SBT: Já recebemos um lance igual ao seu de 0,01. No momento o menor lance único está abaixo do seu. Tente novamente. (R$ 4,00+imp/lance)n era gerada eletronicamente, não se tratando de fraude, apenas em falha no sistema. Por óbvio que não poderia existir lance menor de R$ 0,01, mas é bem provável que o computador que gerava as mensagens não foi programado com uma mensagem individualizada para lances de R$ 0,01, único caso que em não poderia haver lance menor.
O que não pode ensejar o direito a danos morais, porque da mensagem também consta que já houve outro lance, ou outros lances de igual valor, ou seja, a autora não poderia mais nutrir qualquer expectativa de ser vencedora com aquele lance. Qualquer alegação em sentido contrário é querer a autora se aproveitar de sua própria torpeza.
Consoante ensinamento da doutrina:
"Constitui condição ao êxito da ação de indenização a existência efetiva dos danos. Devem ser estes demonstrados no curso do feito, embora se possa relegar para execução a apuração de seu montante. Se não se comprovam durante a ação, não pode esta vingar; só se apuram em execução quando evidenciados na ação." (Washington de Barros Monteiro, in "Direito Civil - Obrigações", Saraiva, 4o vol., 1a parte, 27a ed., 1994, p. 335).
Em nota de rodapé, o saudoso Professor aponta vários julgados:
" 'Exige-se comprovação no curso da própria ação, a fim de que não se transforme a execução em nova ação, ou a instância de execução em instância de acertamento de direito/ (RF 196/201). 'Além disso, diferir tal prova para a execução seria imprimir à sentença caráter condicional.'"
Do mesmo pensar é AGUIAR DIAS, in "Da Responsabilidade Civil", Forense, vol, I, 1960, p. 110:
"O que o prejudicado deve provar, na ação, é o dano, sem consideração ao seu quantum, que é matéria da liquidação, Nâo basta, todavia, que o autor mostre que o fato de que se queixa, na ação, seja capaz de produzir dano, seja de natureza prejudicial. É preciso que prove o dano concreto, assim entendida a realidade do dano que experimentou, relegando para a liquidação a avaliação do seu montante."
O dano moral é conceituado por SAVATIER como todo o sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária, conforme acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, relator Des. Carlos Alberto Menezes Direito in "Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial", Ú ed., p. 395, de Rui Stoco. ^-"•^Tí
Na mesma obra, vem anotado acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, relatado pelo Desembargador BENINI CABRAL, onde diz: "No plano moral não basta o fator em si do acontecimento, mas, sim, a prova de sua repercussão, prejudicialmente moral"
SÉRGIO CAVALIERi FILHO, em seu livro "Responsabilidade Civil", 2a ed., Malheiros Editores, 1998, p. 78, após citar a lição de ANTUNES VARELA, diz:
"Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamentopsicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-adia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações peios mais triviais aborrecimentos."
"Nem todo mal-estar configura dano moral", como assinala o Juiz ANTÔNIO JEOVÁ SANTOS, em sua obra "Dano Moral Indenizavel", 3a ed., Método, p. 119; e mais adiante, na p. 122, prossegue:
"O que se quer afirmar é que existe um mínimo de incômodos, inconvenientes ou desgostos que, pelo dever de convivência social, sobretudo nas grandes cidades em que os problemas fazem com que todos estejam mal-humorados há um dever geral de suportá-los. O mero incômodo, o desconforto, o enfado, decorrentes de algumas circunstâncias, como exemplificados aqui, e que o homem médio tem de suportar em razão mesmo do viver em sociedade, não servem para que sejam concedidas indenizações."
Pelo meu voto, nego provimento ao recurso.
RIBEIRO DA SILVA
Revisor