Migalhas Quentes

Plano de saúde não pode negar migração para categoria inferior

Mudança de categoria pode ser feita sem cumprimento de novos prazos de carência.

11/5/2012

O TJ/SP autorizou uma aposentada a migrar para categoria inferior de plano de saúde sem cumprimento de novos prazos de carência. A mulher alegou não ter condições de continuar com o plano contratado, mas recebeu negativa da operadora.

Ela era contratante de apólice coletiva de seguro e solicitou mudança para plano mais econômico. De acordo com a responsável pelo caso, a advogada Maria Helena Crocce Kapp, do Vilhena Silva Advogados, a apólice coletiva permite tal mudança, uma vez que não haverá prejuízo à operadora, que continuará recebendo o valor da mensalidade de acordo com a nova categoria, preservando o equilíbrio econômico-financeiro.

O TJ/SP determinou que a operadora de saúde autorizasse a migração, sob pena de multa diária caso não cumpra a decisão. A determinação levou em consideração que a aposentada ficaria em desvantagem caso precisasse procurar por outro contrato, sujeitando-se a novos prazos de carência.

Para a advogada, o caso mostra a ganância das empresas operadoras de saúde. Ela afirmou que "O contrato firmado entre as partes permite a mudança de categoria, desde que seja para uma superior, ou seja, mais cara. Quando o consumidor deseja pagar mesmo, sujeitando-se a diminuir o padrão e a quantidade de hospitais, clínicas e laboratórios colocados à disposição, é impedido. O objetivo não é prestar serviço à saúde mediante justa remuneração, mas sim extrair do consumidor o maior valor mensal que ele pode pagar por um plano de saúde".

__________

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA DE SÃO PAULO
FORO REGIONAL XI – PINHEIROS
1ª VARA CÍVEL

SENTENÇA

Processo nº: 0016258-72.2011.8.26.0011
Classe - Assunto Procedimento Ordinário - Planos de Saúde
Requerente: Beatriz Norma Fernandez de Chaweles
Requerido: Sul América Companhia de Seguro Saúde S/A

Prioridade Idoso

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Fabio Coimbra Junqueira

Vistos.

BEATRIZ NORMA FERNANDEZ DE CHAWELESS devidamente qualificados, propôs ação em face da SUL AMÉRICA SEGUROS S/A., sustentando, em síntese, que é titular de plano executivo. Teve rejeitada a mudança para o plano especial em razão de dispositivo contratual. Assim, requer a condenação da requerida no direito efetivo de migração do plano em epígrafe.

Juntou documentos (fls. 21/61).

Liminar concedida a fls. 63/64.

Citada e intimada, a requerida apresentou contestação (fls. 100/107), alegando a legalidade de sua conduta e a conseqüente improcedência da ação. Junta documentos a fls. 113/126.

Réplica (fls. 134/145).

É o relatório.

FUNDAMENTO E DECIDO.

O processo comporta julgamento antecipado, na forma do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto todas as questões de fato e de direito estão devidamente recrudescidas nos autos, tornando desnecessária qualquer dilação probatória, salientando-se que os pontos controvertidos são matéria de direito.

A presente lide encontra-se afeita ao microssistema consumerista, legislação protetiva monopolar, com princípios e regras próprias, de ordem pública e interesse social e, ainda, com fundamento de validade em cláusula pétrea da Constituição Federal, portanto, inafastável sua aplicação ao caso em tela.

Fixada a natureza jurídica da relação havida entre as partes, passo aanalisar o mérito propriamente.

A preliminar não se sustenta, uma vez que a Emprea Qualicorp apenas tem o condão de gerir o ativo e passivo da ré, sendo a última quem contrata e pratica todos os atos decorrentes da avença entre as partes.

A autora busca a condenação da ré na abstenção da proibição de migrar para o plano especial, no caso, com menos benefícios do que se encontra atualmente.

No mérito, a própria contratação anterior cria para a autora o direito à permanência no seguro, mesmo porque o fato de optar por um ou outro plano é decisão que cabe somente ao contratante, não podendo a ré se imiscuir e, muito menos impedir a livre decisão ou migração do consumidor.

Com efeito, um dos pilares contratuais é justamente a honestidade e limpidez que deve nortear uma avença, consistente na chamada boa-fé objetiva, quase uma norma implícita nas relações civis como o caso em tela. Neste passo, tem-se a função social do contrato como aliado do primeiro princípio já decantado.

Ressalte-se que a ré como empresa que cuida de interesses nobres dos segurados, no caso a saúde e bem estar, não pode desprezar a acuidade e respeito aos princípios acima, sempre se valendo de expedientes clariformes, algo não provado nesta lide, haja vista que sem sustentação jurídica o argumento da ré de que não pode efetivar a mudança pleiteada.

Nesta senda, reprovável a limitação da forma como se procedeu, merecendo a autora a migração do contrato tal como ficou decidido na liminar já deferida. Desta maneira, é crível a versão da autora, devendo ser amparado ante a sua hipossuficiência ante a ré, que por certo em sistema que não respeita os princípios acima, errou na sua conduta, falha esta que não deve ser suportada pela autora consumidora. Assim, qualquer limitação à migração do autor sob o argumento de falta de cumprimento de período de carência é considerado abusivo, mesmo sendo opção dos requerentes.

Ora, resta evidente que a autora tem direito adquirido a usufruir o novo plano com todas as suas benesses, sendo iminente o direito requerido.

Dessa forma, a resistência oposta pela requerida configura-se como cláusula abusiva, nos termos do artigo 51, inciso IV, e parágrafo primeiro, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor.

“Cláusula abusiva é aquela que é notoriamente desfavorável à parte mais fraca na relação contratual, que, no caso de nossa análise, é o consumidor, aliás, por expressa definição do art. 4º, nº I, do CDC” (Grinover, Ada Pellegrini e outros, “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto”, Editora Forense Universitária, 5ª edição, 1998, pág. 380).

Acrescente-se que, diante do caos reinante no sistema público de saúde, a atividade explorada pelas operadoras de planos ou seguros de saúde tem enorme repercussão social. A fim de buscar segurança e proteção, milhões de consumidores aderem aos planos e seguros de saúde, na esperança de que, em situações de risco a sua saúde ou de seus familiares, possam encontrar o respaldo necessário.

Ora, a vida e a saúde são bens supremos, devidamente acolhidos pela Constituição Federal, e, sendo assim, não há argumento legal ou contratual que possa prevalecer sobre eles.

Assim:

“O direito à vida, à saúde e à dignidade humana, são direitos constitucionalmente assegurados, para que não se tenha o risco de prejuízos irreparáveis. Como a saúde não se caracteriza como uma mercadoria qualquer, nem pode ser confundida com outras atividades econômicas, tem-se que o particular, que presta uma atividade econômica correlacionada com os serviços médicos e de saúde, possui os mesmos deveres do Estado, ou seja, os de prestar uma assistência integral para os consumidores dos seus serviços”. (14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Processo 1.0702.07.395986-9/001).

Dessa forma, a resistência oposta pela requerida configura-se como cláusula abusiva, nos termos do artigo 51, inciso IV, e parágrafo primeiro, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor.

“Cláusula abusiva é aquela que é notoriamente desfavorável à parte mais fraca na relação contratual, que, no caso de nossa análise, é o consumidor, aliás, por expressa definição do art. 4º, nº I, do CDC” (Grinover, Ada Pellegrini e outros, “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto”, Editora Forense Universitária, 5ª edição, 1998, pág. 380).

Com isso, evidente que a restrição é abusiva, impondo-se o custeio integral dos procedimentos necessários ao restabelecimento da saúde do primeiro autor, não se podendo admitir a aplicação da carência de 24 meses prevista no contrato firmado entre as partes.

Posto isso, JULGO PROCEDENTE o pedido, nos termos do artigo 269, I, do Código de Processo Civil, tornando definitiva a liminar concedida, para condenar a requerida a permitir a migração tal como proposta sem custo por isto, conforme a contraprestação da autora.

Pela sucumbência, condeno a requerida, ainda, ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios, que fixo por eqüidade em R$ 2.000,00, corrigidos desde a data desta sentença e com incidência de juros de mora de 1% ao mês.

P.R.I.

São Paulo, 09 de maio de 2012.

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