Migalhas Quentes

Sinthoresp tem legitimidade para representar trabalhadores de fast-food

Em duas ações, empresas alegavam que o representante de seus funcionários era outro sindicato.

19/4/2012

A 14ª turma do TRT acolheu recursos do Sinthoresp contra decisões de 1ª instância que julgaram improcedentes os pedidos do sindicato para o repasse de contribuições sindicais dos empregados de dois restaurantes de fast-food. As empresas alegavam que o representante de seus funcionários era o Sindifast - Sindicato dos Trabalhadores em Fast Food de São Paulo, para o qual repassavam as contribuições sindicais.

Nas duas ações, o desembargador Manoel Antonio Ariano, relator dos acórdãos, afirma que, pelo princípio da unidade sindical, "a fundação originária de um sindicato representativo da categoria profissional em uma base territorial, por si só, impede a criação de outra entidade na mesma base territorial".

Para ele, em ambos os casos, não se justifica a cisão, "visto que se trata da profissão dos empregados em restaurantes, bares, lanchonetes, fast-food, cafés ou assemelhados, que se constituem em garçons, maitres, cozinheiros etc, não importando a forma de preparação do produto a ser servido ou mesmo o modo de destiná-lo ao cliente".

No acórdão, Ariano cita decisão do STF de recurso extraordinário (RExt 209.993) acerca do tema: "Decidiu o Ministro Nelson Jobim que "havendo identidade entre categoria de trabalhadores representados pelo autor e pelo réu e sendo idênticas também as bases territoriais de atuação de um e de outro sindicato, deve prevalecer o primeiro deles, dada a sua constituição anterior".

Dessa forma, os magistrados da 14ª turma do TRT reconheceram a legitimidade do autor quanto à representatividade dos empregados da ré, passando à análise do pedido de contribuições assistenciais. As empresas deverão pagar ao sindicato as contribuições sindicais de seus funcionários, com juros e atualização monetária.

Leia a íntegra de um dos acórdãos.

_________

PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEGUNDA REGIÃO
PROCESSO TRT/SP Nº 0000928-89.2010.5.02.0075 - 14ª TURMA
RECURSO ORDINÁRIO
ORIGEM: 75ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO
RECORRENTE: SINTHORESP - SINDICATO DOS EMPREGADOS EM HOTÉIS, APART-HOTÉIS, MOTÉIS, RESTAURANTES, BARES, LANCHONETES E SIMILARES DE SÃO PAULO E REGIÃO
RECORRIDA: THIAGO MAMORU MAEDA - ME

Inconformado com a r. sentença de fls. 155/158, cujo relatório adoto e que julgou improcedente a presente ação, recorre ordinariamente o Sindicato-autor pelas razões de fls. 162/192, alegando, preliminarmente, nulidade da r. sentença de origem por negativa de prestação jurisdicional e cerceamento de defesa; no mérito, pretendendo a reforma do julgado no tocante à legitimidade ad causam, contribuições assistenciais, contribuições sindicais, aplicação do Precedente Normativo nº 21 deste Tribunal, multa astreinte e multa do art. 538 do CPC.

Contrarrazões às fls. 197/198.

É o relatório.

V O T O

Regular e tempestivo, conheço.

O recorrente argúi nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional e por cerceamento de prova, esta última ao argumento de que o Juízo de origem não deferiu a expedição de mandado de constatação, com o qual pretendia demonstrar a atividade econômica desenvolvida pela empresa recorrida.

O MM. Juízo de Primeira Instância, ao decidir o feito, analisou o conjunto probatório na sua integralidade, bem como todas as questões arguidas pelas partes. Ao indeferir o mandado de constatação requerido pelo demandante, o magistrado de origem assim o fez porque presentes nos autos outros elementos que propiciaram a formação de sua convicção. Pelo que, entendo inexistente o propalado cerceamento de defesa a ensejar a nulidade do julgado.

Não se acolhe, da mesma forma, o pedido de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, tendo em vista que eventual matéria não apreciada na origem pode nesta oportunidade ser julgada, já que pelo recurso ordinário são devolvidas todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro (CPC, art. 515, § 1º). Rejeito, portanto, em sua integralidade as alegações preliminares.

A presente ação principal visa a cobrança de contribuições assistenciais e sindicais. Alega a reclamada que passou a contribuir para o Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Refeições Rápidas (fast food) de São Paulo, aduzindo que referida entidade apresenta registro sindical perante o Ministério do Trabalho confirmado por sentença judicial e reconhecimento de absoluta validade do registro e consequente direito de representação da categoria por mais de uma sentença.

A representatividade dos sindicatos em tela quanto aos empregados em empresas de refeições rápidas constitui objeto de diversas ações em trâmite, sem que nenhuma tenha alcançado trânsito em julgado ou medida liminar em vigor.

Este Relator já reconheceu a representatividade do Sindfast em relação aos empregados em empresas de fast food na base territorial de São Paulo. No entanto, revendo tal posição, passo a me inclinar pela representatividade do Sinthoresp, conforme fundamentação a seguir.

Como regra, o enquadramento sindical do empregado é feito em razão da atividade preponderante da empresa (CLT, art. 570). O nosso Direito Coletivo dispõe que a organização dos trabalhadores e a respectiva representação sindical são feitas de forma objetiva, por categorias. Em São Paulo, as respectivas categorias econômicas e profissionais do seguimento de hospedagem e alimentação há muito tempo que se faz representar pelo Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares, e Similares de São Paulo e pelo Sinthoresp.

No ano de 2000 surgiu o Sindfast – Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Refeições Rápidas "fast-food" de São Paulo, com a pretensão de cindir a representação da referida categoria profissional, sustentando a necessidade de representação sindical mais específica, tendo em vista a semelhança entre os empregados no ramo de fast food.

No nosso ordenamento jurídico adota-se a unicidade sindical, não permitindo que o empregador escolha a entidade sindical para a qual pretenda destinar as contribuições compulsórias e muito menos a entidade com a qual pretenda celebrar os convênios sindicais autorizados. Tal escolha seria frutífera em vários países e é constantemente incentivada pela OIT, desaguando num quadro de pluralidade sindical, que no Brasil se caracteriza inconstitucional.

O Ministro Sepúlveda Pertence, em voto proferido em Mandado de Injunção de 1992 e mencionado em vários julgados, deixou claro que, "no tema de que cuidamos, muitos se têm deixado seduzir a emprestar o seu próprio conceito ideal de liberdade sindical à investigação objetiva do que efetivamente tenha sido acolhido pela Constituição". E conclui: "Nela, uma vez desmistificada, o que, na verdade, se pôs foi um sistema de liberdade sindical mais que relativo, onde o caminho da aproximação aos parâmetros internacionais da Convenção 87, da OIT, se viu significativamente obstruído pela força cinquentenária da resistência do modelo corporativo do Estado" (voto vencedor - itens 22 e 23 - Mandado de Injunção 144, de 03.08.1992, publ. em 28.05.1993).

A ementa do referido julgado dispõe que "a diferença entre o novo sistema, de simples registro, em relação ao antigo, de outorga discricionária do reconhecimento sindical, não resulta de caber o registro dos sindicatos ao Ministério do Trabalho ou a outro ofício de registro público. Ao registro das entidades sindicais inere a função de garantia da imposição de unicidade – esta, sim, a mais importante das limitações constitucionais ao princípio da liberdade sindical".

Ainda muitos anos depois, a posição do STF segue no mesmo trilho, separando a concepção ideal do sindicalismo de sua concepção constitucional. Em maio de 2009, a Ministra Ellen Gracie concluiu que "o princípio da unicidade sindical, previsto no art.8º, II, da Constituição Federal, é a mais importante das limitações constitucionais à liberdade sindical" (REx 310.811).

Como bem elucida a questão o Exmo. Juiz Homero Batista Mateus da Silva, ao proferir sentença no processo nº 679/2009, em trâmite perante a 88ª VTSP, "aceitar negociar diretamente com entidade sindical inviável, volúvel ou precária é o mesmo que anuir com a pluralidade sindical, sob o singelo argumento de que a entidade depositou os estatutos em cartório de registro de títulos e documentos, com cópia para o órgão apropriado do Ministério do Trabalho e Emprego".

Verifica-se que a fundação originária de um sindicato representativo da categoria profissional em uma base territorial, por si só, impede a criação de outra entidade na mesma base territorial, pelo princípio já mencionado da unicidade sindical, exceto quando haja um "sindicato preexistente que representa mais de uma atividade ou profissão, dele se destacando uma delas com o propósito de constituir um sindicato específico para aquela atividade ou profissão", como bem preleciona Amauri Mascaro Nascimento (in

"Compêndio de Direito Sindical". São Paulo: LTr, 2008, p. 287).

No caso, não se justifica a cisão pretendida, visto que se trata da profissão dos empregados em restaurantes, bares, lanchonetes, fast food, cafés ou assemelhados, que se constituem em garçons, maitres, cozinheiros etc, não importando a forma de preparação do produto a ser servido ou mesmo o modo de destiná-lo ao cliente. Nesse ponto, convém ressaltar que não se cogita da cisão do sindicato patronal, para a criação de uma entidade que abarque apenas as empresas fornecedoras de refeições rápidas.

Não podem ser acolhidas as teses de defesa a respeito do enquadramento sindical, com a transposição da representação do Sinthoresp pelo Sindfast.

A conduta da ré em escolher Sindicato diverso do anterior para representar seus empregados afigura-se incompatível com os propósitos do artigo 511 da CLT e do artigo 8º da CF/88.

Não se reconhece a nulidade de estatutos nem de pretenso desmembramento sindical, o que já se discute em ações próprias, mas apenas de fazer com que o empregador observe as normas coletivas em que tenha participado o Sinthoresp, sindicato originário na representação da categoria ora considerada, não podendo desviar o enquadramento para normas negociadas com entidades não aptas à representação.

Ineficaz, portanto, a norma coletiva firmada entre a reclamada e a entidade sindical que se pretende prevalecer como representante dos trabalhadores em empresas de refeições rápidas.

Decidiu o Ministro Nelson Jobim que "havendo identidade entre categoria de trabalhadores representados pelo autor e pelo réu e sendo idênticas também as bases territoriais de atuação de um e de outro sindicato, deve prevalecer o primeiro deles, dada a sua constituição anterior" (REx 99.142, de 03.10.2000, publ. em 14.12.2001. No mesmo sentido, o REx 209.993, de 15.06.1999).

Sabe-se de outros processos que as normas coletivas firmadas com o Sindfast apresentam significativa redução dos direitos dos trabalhadores, inclusive em relação ao piso salarial mantido pelo Sindicato originário.

Evidente que a constituição de novo sindicato tem como objetivo a subtração de empresas do setor à atuação do Sinthoresp, o que não pode prevalecer. Aliás, este Regional, por sua 12ª Turma, já se pronunciou no sentido de que "o Sindfast, por seu turno, é um sindicato artificial, criado apenas com o objetivo de recolher contribuições, taxas e impostos. Não possui legitimidade alguma (vide fls. 174 e 175, inclusive vv.)." e de que "Por outro lado, não é pelo fato do restaurante que serve fast food ter algumas características particulares que a representação sindical, seja de patrões, seja de trabalhadores, vai mudar pela mera iniciativa cartorial de um grupo não necessariamente legítimo. Irrelevante, tampouco, que o novel sindicato tenha firmado norma coletiva com o sindicato patronal de hotéis, bares e restaurantes; nesse ponto, ambos exorbitaram dos limites legais, devendo tal norma coletiva ser considerada nula de pleno direito. A propósito, é sintomático que o sindicato patronal permaneça uno, congregando tanto os estabelecimentos que servem a la carte como os fast food, que, mecanizados que sejam, modernos e o que se queira inventar, continuam tranqüilos sob a representação da mesma entidade de categoria econômica." (Acórdão nº 0080928794, 12ª Turma; Recurso Ordinário em Rito Sumaríssimo; Processo nº: 01979-2007-075-02-00-0; Julgamento: 16.10.2008; Relator: Davi Furtado Meirelles-grifado no original).

Assim, revejo o posicionamento anterior e reconheço a legitimidade do autor quanto à representatividade dos empregados da ré, passando à análise do pedido de contribuições assistenciais. Nesse ponto, não tem razão o recorrente. Há sólida jurisprudência neste sentido, a saber:

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

PRECEDENTE NORMATIVO Nº 119 - Res. 82/1998, DJ 20.08.1998:

"A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, EM SEUS ARTS. 5º, XX, E 8º, V, ASSEGURA O DIREITO DE LIVRE ASSOCIAÇÃO E SINDICALIZAÇÃO. É OFENSIVA A ESSA MODALIDADE DE LIBERDADE CLÁUSULA CONSTANTE DE ACORDO, CONVENÇÃO COLETIVA OU SENTENÇA NORMATIVA ESTABELECENDO CONTRIBUIÇÃO EM FAVOR DE ENTIDADE SINDICAL A TÍTULO DE TAXA PARA CUSTEIO DO SISTEMA CONFEDERATIVO, ASSISTENCIAL, REVIGORAMENTO OU FORTALECIMENTO SINDICAL E OUTRAS DA MESMA ESPÉCIE, OBRIGANDO TRABALHADORES NÃO SINDICALIZADOS. SENDO NULAS AS ESTIPULAÇÕES QUE INOBSERVEM TAL RESTRIÇÃO, TORNAM-SE PASSÍVEIS DE DEVOLUÇÃO OS VALORES IRREGULARMENTE DESCONTADOS".

Saliente-se que tal entendimento não foi revogado, portanto, prevalece, ao contrário do sustentado pelo recorrente. Também as decisões mencionadas não vinculam esse juízo.

Urge destacar, outrossim, que a diretriz amparada na interpretação do Precedente Normativo n. 21 desse Egrégio Regional há muito já foi superada pela prevalência inafastável da ordem constitucional vigente.

Por não comprovado o recolhimento de contribuições sindicais ao Sindicato legítimo a recebê-las, conforme fundamentado anteriormente, provejo o recurso para deferi-las, nos termos em que postuladas, cabendo eventualmente o repasse dos valores recolhidos equivocadamente à entidade reconhecidamente legítima.

Não procedem as multas postuladas, quer porque a reclamada juntou os documentos solicitados na inicial, às fls. 116/126, quer porque os artigos 598 e 600, par. 1º, "a" da CLT não se aplicam à hipótese. Eventual obrigação a ensejar a incidência de "astreintes" sequer foi determinada em primeira instância e a penalidade condizente aos dispositivos celetistas mencionados refere-se a recolhimento da contribuição sindical efetuado fora do prazo, mas realizado espontaneamente, o que não é o caso dos autos.

Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados da 14ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em: rejeitar as preliminares e DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso para julgar a ação procedente em parte, reconhecendo o autor como legítimo representante sindical dos empregados da reclamada e condenando-a no pagamento do que for apurado em liquidação, no limite e na forma da fundamentação, com atualização monetária e juros de mora na forma da lei, a título de contribuições sindicais, na forma postulada na inicial.

Correção monetária na forma da Súmula 381. Custas em reversão, pela reclamada, sobre o valor da condenação de R$ 317,30, no importe de R$ 6,35.

MANOEL ANTONIO ARIANO

RELATOR

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