STJ
Dias de trabalho não podem ser descontados de pena em regime aberto
A 6ª turma do STJ negou HC a condenado em regime aberto que pretendia descontar da pena os dias de trabalho. Pelo entendimento da turma, isso só pode ser feito quando o condenado cumpre pena em regime fechado ou semiaberto.
A defesa alegou constrangimento ilegal. Para ela, o princípio ideológico da lei e do direito penal, de que a pena tem função de reintegrar o indivíduo à sociedade, garantiria a remição da pena de condenados em regime aberto. A defesa afirmou ainda que a LEP é omissa aos apenados neste regime, o que atrairia a interpretação por analogia em favor do réu.
A ministra Maria Thereza de Assis Moura, relatora, entendeu que a remição de pena pelo trabalho aos condenados em regime aberto foge da previsão da lei. Conforme a relatora, a LEP determina que o desconto de dias da pena por trabalho ou estudo poderá ser feito para condenados em regime fechado ou semiaberto.
Ela apontou ainda que a remição da pena em regime aberto é possível por estudo de acordo com a lei 12.433/11, que modificou a LEP. Porém, observou que no caso o pedido foi de remição por trabalho, e votou pela denegação da ordem.
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Processo relacionado: HC 189.914
Veja a íntegra da decisão.
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HABEAS CORPUS Nº 189.914 - RS (2010/0206106-9)
RELATORA: MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
IMPETRANTE: CLEOMIR DE OLIVEIRA CARRÃO - DEFENSORA PÚBLICA
IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PACIENTE: EDUARDO SIDNEI SOARES
EMENTA
HABEAS CORPUS. REMIÇÃO. POSSIBILIDADE A CONDENADO NO REGIME ABERTO. PREVISÃO LEGAL EM SENTIDO CONTRÁRIO. ORDEM DENEGADA.
1. Segundo orientação desta Corte, bem assim do Supremo Tribunal Federal, o art. 126 da LEP prevê a remição da pena pelo trabalho somente aos apenados que se encontram nos regimes fechado ou semiaberto, situação mantida com a entrada em vigor da Lei 12.433/2011.
2. Ordem denegada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora." Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior e Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS) votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Og Fernandes.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Brasília, 14 de fevereiro de 2012(Data do Julgamento)
Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Relatora
RELATÓRIO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de EDUARDO SIDNEI SOARES, apontando como autoridade coatora a Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Agravo em Execução n.º 70037990058).
Consta dos autos que, em 21.6.2010, o Juízo da Vara das Execuções Criminais de Novo Hamburgo/RS indeferiu o pedido de remição da pena do apenado no regime carcerário aberto, em razão de o trabalho externo figurar como condição obrigatória para a sua concessão. Confiram-se os termos da decisão unipessoal (fl. 45):
"Com razão o Ministério Público. Incabível a remição de pena no regime carcerário aberto, salvo se o apenado tenha permanecido recolhido no estabelecimento prisional sem usufruir do trabalho externo, benefício que, aliás, é condição obrigatória para tal regime, em conformidade com os artigos 126 e 115, II, ambos da Lei de Execução Penal. todavia, já que esse não é o caso dos autos, uma vez que o próprio atestado de efetivo trabalho faz menção de ter o apenado trabalhado no PAC.
Oficie-se ao estabelecimento prisional solicitando a remessa de novo atestado de efetivo trabalho, devendo ser desconsiderado o período em que o apenado está no regime aberto.
Com relação ao benefício da comutação, conforme certidão de fl. 519, não há período a comutar, uma vez que o apenado cumpriu toda a pena referente ao crime comum até 25.12.09, razão pela qual indefiro o pedido com base no artigo 2.º e 7.º, parágrafo único, do Decreto n.º 7.046/09."
Inconformada, a defesa interpôs agravo em execução perante o Colegiado de origem, que negou provimento ao recurso. Eis a ementa do decisum (fl. 86):
"AGRAVO EM EXECUÇÃO. PEDIDO DE REMIÇÃO DE PENA. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE.
O artigo 126 da LEP exclui o regime aberto para a remição, pois esta é um direito privativo dos apenados que estejam cumprindo pena no regime semiaberto ou fechado.
AGRAVO DEFENSIVO IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME."
Daí o presente writ, em que a impetrante alega constrangimento ilegal, ao argumento de que o instituto da remição deve ser aplicado ao apenado em regime aberto, em virtude do caráter ressocializador.
Afirma que, "em que pese a LEP ser omissa em relação aos apenados que cumprem pena em regime aberto que intentam a remição, merece ser empregada a analogia em bonam partem no caso em análise, conjugada com os princípios do Direito Penal e as finalidades da pena que emergem do bojo principiológico da LEP; para que ao cabo de tudo se possa pensar em função ressocializadora da pena (de acordo com as suas possibilidades práticas e jurídicas do caso concreto) e em respeito à dignidade humana" (fl. 3).
Requer, liminarmente e no mérito, seja cassado o acórdão objurgado a fim de se conceder a remissão da pena ao paciente pelos dias trabalhados durante o cumprimento no regime aberto.
O pedido liminar foi indeferido às fls. 101/102, oportunidade em que foram solicitadas informações à autoridade coatora, trazidas às fls. 109/131.
O Ministério Público Federal opinou, em parecer de fls. 134/136, da lavra do Subprocuradora-Geral da República Denise Vinci Tulio, pela denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
O entendimento de que é possível a remição de pena pelo trabalho aos condenados em regime aberto não se afigura condizente com a previsão legal, já que a Lei de Execução Penal é clara ao tratar do instituto da remição, no art. 126, verbis:
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
Ressoa evidente que a remição somente pode ser concedida quando diante dos regimes fechado ou semiaberto pelo trabalho do apenado ou, com a nova redação dada ao artigo 126 da LEP pela Lei n.º 12.433, de 29 de junho de 2011, também por estudo.
Confira-se a orientação da Quinta Turma desta Corte, de cujos precedentes se colhe:
EXECUÇÃO PENAL. RECURSO ESPECIAL. REMIÇÃO. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou-se no sentido de que o apenado que cumpre pena em regime aberto não faz jus à remição pelo trabalho, nos termos do art. 126 da LEP, que prevê expressamente tal benefício apenas ao condenado que cumpre pena em regime fechado ou semiaberto.
2. Recurso provido para negar ao recorrido o direito de remição pelos dias trabalhados. (REsp 984.460/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 10/09/2009, DJe 13/10/2009)
HABEAS CORPUS. PENAL. AGRAVO EM EXECUÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA. NÃO-INTERPOSIÇÃO DO RECURSO INTERNO. TRÂNSITO EM JULGADO. SUPERVENIÊNCIA. POSSIBILIDADE DE EXAME DA MATÉRIA NESTA INSTÂNCIA.
REMIÇÃO. REGIME ABERTO. ART. 126 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL.
IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.
1. O inconformismo dirigido contra decisão de Desembargador componente da Turma Criminal do Tribunal a quo, sem que tenha sido ajuizado o agravo interno, inviabiliza o acesso a esta Corte Superior, em razão do não esgotamento das instâncias ordinárias.
Entretanto, a Quinta Turma sedimentou no entendimento no sentido de que "Não obstante a ausência de esgotamento da instância antes da impetração do presente habeas corpus, tendo em vista a ausência de interposição de agravo regimental ao Órgão Colegiado, evidenciado o trânsito em julgado da decisão impugnada, torna-se possível o conhecimento do writ, originariamente, nos termos do art. 105, inciso I, alínea “c”, da Constituição Federal. Precedentes." (HC 83.960/MS, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), Quinta Turma, julgado em 23-8-2007, DJ 1-10-2007, p. 346).
2. A jurisprudência desta Corte assentou o entendimento de que o sentenciado que cumpre pena em regime aberto não tem direito à remição pelo trabalho, nos termos do art. 126 da LEP, sendo o benefício ora pretendido aplicável somente aos condenados que se encontrem no modo fechado ou semiaberto.
3. Ordem denegada. (HC 130.336/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 23/06/2009, DJe 24/08/2009)
Por sua vez, também o é desta Turma, a qual já professou:
HABEAS CORPUS. REMIÇÃO. ART. 126 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE.
1. Ao réu que se encontra cumprindo pena em regime aberto, não há previsão de remição no art. 126 da Lei de Execução Penal, que é taxativo ao permitir o benefício somente para as hipóteses de regime fechado ou semi-aberto.
2. Habeas corpus denegado.” (HC 120.547/RS, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), Rel. p/ Acórdão Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 16/04/2009, DJe 03/11/2009)
Tal orientação, ainda cabe destacar, tem respaldo no entendimento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, a saber:
HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO. REGIME ABERTO.
O condenado a cumprir pena em regime aberto não está contemplado no art. 126 da Lei de Execução Penal, que se destina aos apenados nos regimes fechado e semi-aberto. Habeas corpus indeferido. (STF. HC 77.496/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Nelson Jobim, DJU de 19/2/1999).
Mencione-se, ainda, que essa orientação não contraria a previsão da recente Lei 12.433/2011, que alterou o art. 126 da LEP, acrescendo-lhe alguns parágrafos, devendo-se destacar o que interessa, verbis:
"Art. Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
(...)
§ 6º. O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo."
Como posto, embora a nova previsão legal, do § 6º, tenha permitido a remição, pelo estudo, de parte da pena no regime aberto, tal hipótese não se aplica ao caso em exame, porquanto aqui trata-se de remição pelo trabalho, cuja norma aplicável, a do caput, expressamente delimita a concessão de abatimento aos condenados que cumprem a pena nos regimes fechado e semiaberto, fazendo supor, por consequência, a inviabilidade em relação aos que se encontram no regime menos gravoso.
Ante o exposto, denego a ordem.
É o voto.