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Plano de saúde deve pagar por medicamento complementar

A 9ª câmara de Direito Privado do TJ/SP negou provimento a recurso de plano de saúde que se negou a reembolsar despesas referentes à realização de procedimentos em decorrência de doença que acomete o autor e de cobertura de custeio do medicamento.

18/10/2011


Saúde

Plano de saúde deve pagar por medicamento complementar

A 9ª câmara de Direito Privado do TJ/SP negou provimento a recurso de plano de saúde que se negou a reembolsar despesas referentes à realização de procedimentos em decorrência de doença que acomete o autor e de cobertura de custeio do medicamento.

J.C. tem câncer e precisava do medicamento Clexane, prescrito pelo médico como complemento ao tratamento quimioterápico. Porém, a Amil recusou-se a cobrir as despesas alegando que o remédio não é o indicado para esse tratamento.

Ana Paula Carvalho, membro do Vilhena Silva Sociedade de Advogados e responsável pelo caso, conta que "nessa ação, a operadora foi obrigada a pagar não só o Clexane, como também as despesas decorrentes da internação e a reembolsar a diferença dos honorários médicos referentes aos procedimentos realizados".

A Amil não concordou com a decisão e recorreu, alegando que o reembolso das despesas depende de previsão contratual, que o medicamento utilizado não é indicado para a doença e, ainda, que essa medicação é empregada para tratamento domiciliar. A Justiça negou o recurso da empresa, afirmando que "a limitação imposta excluiria o tratamento que foi prescrito como meio adequado e indispensável à tentativa de recuperação da higidez física do paciente, negando, pois, o próprio objetivo do contrato, o que não pode ser admitido".

De acordo com o desembargador Galdino Toledo Júnior, relator, "não se trata de um simples medicamento de uso domiciliar indicado para aliviar sintomas, mas sim de droga prescrita em razão do quadro de tromboflebite decorrente do tratamento quimioterápico, sem a qual o paciente não teria qualquer possibilidade de cura total da doença".

Veja abaixo a decisão.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0195533-73.2009.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante AMIL ASSISTÊNCIA MÉDICA INTERNACIONAL LTDA sendo apelado J.C..

ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores GRAVA BRAZIL (Presidente sem voto), VIVIANI NICOLAU E ANTONIO VILENILSON.

São Paulo, 12 de julho de 2011.

GALDINO TOLEDO JÚNIOR

RELATOR

Apelação Cível nº 0195533-73.2009.8.26.0100

Comarca de São Paulo

Apelante: Amil Assistência Médica Internacional Ltda

Apelado: J.C.

Voto nº 6.987

PLANO DE SAÚDE Negativa de reembolso de despesas referentes à realização de procedimentos em decorrência de doença que acomete o autor (neoplasia de sigmóide) e de cobertura de custeio do medicamento Clexane Procedência das ações decretadas Obscuridade dos critérios contratuais utilizados para cálculo do reembolso Ofensa ao CDC (14, 46, 56 e 51, IV) Negativa de custeio do medicamento Clexane Medicamento prescrito como complemento de tratamento quimioterápico Contrato que não exclui tratamento da doença suportada pelo paciente (câncer) - Alegação da apelante de que o procedimento não é indicado para o tratamento do apelado Descabimento Empresa prestadora de serviços de assistência médica que não pode interferir na indicação feita pelo médico Dever da apelante de cobrir as despesas decorrentes do tratamento indicado, pelo período necessário Recurso desprovido.

1. Ao relatório constante de fls. 148/151 acrescento que a sentença julgou procedentes as ações cominatórias promovidas pelo recorrente, impondo à ré a obrigação de pagar diretamente ao Hospital Sírio Libanês as despesas decorrentes da internação, reembolsar ao autor a diferença dos honorários médicos referentes aos procedimentos realizados, bem como arcar com o tratamento oncológico do autor com o medicamento “Clexane”, pelo tempo que for necessário.

Volta-se a ré contra a decisão deduzindo em suas razões recursais de fls. 157/175 que o reembolso das despesas depende de previsão contratual e é efetivado de acordo com os multiplicadores contratados e com a URA (Unidade de Ressarcimento Amil). Afirma que a negativa de cobertura decorre do fato de que o medicamento utilizado para tratamento no autor não é indicado para a doença que o acomete e, ainda, que essa medicação é utilizada para tratamento domiciliar. Pugna pela improcedência das ações e consequente inversão dos ônus da sucumbência.

Recurso regularmente processado, com oferecimento de contrarrazões às fls. 182/198.

2. Discute-se nestes autos a legalidade da conduta da apelante em negar ao autor o reembolso das despesas decorrentes de internação para realização de procedimentos cirúrgicos, bem como do fornecimento do medicamento Clexane, necessário ao tratamento da doença que acomete o autor (neoplasia de sigmóide).

Nesse passo, bem decidiu a lide o julgador monocrático, não comportando guarida o inconformismo da apelante.

Analisa-se, em primeiro lugar, a questão atinente ao reembolso.

Insiste a apelante que as cláusulas contratuais que estipulam os critérios para cálculo de reembolso são completamente compreensíveis e, portanto, válidas, pois o apelado teria com elas consentido quando da realização do negócio.

Para demonstrar o contrário reproduzem-se os seguintes excertos das cláusulas questionadas: “Cláusula Quarta. O valor da URA (unidade de Ressarcimento Amil) a ser praticado quando de ressarcimento pela utilização de serviços por beneficiário cadastrado, será na presente data o abaixo definido e atualizado na mesma época, e no mesmo percentual do contrato. URA (Unidade de Ressarcimento Amil). Consultas: R$ 0,52. Exames/Procedimentos/Honorários Médicos: R$ 0,36”. Parágrafo Primeiro. O valor da UFA (Unidade de Franquia Amil) a ser praticado quando da utilização de serviços por beneficiário cadastrado em Plano de Rede Credenciada (Opções, Medicus e Medicus Especial), será na presente data o abaixo definido e atualizado de acordo com os reajustes legais. UFA (Unidade de Franquia Amil) = R$1,00. (fl. 97).

Ou seja, sem sombra de dúvida, incompreensíveis os termos ali estipulados, uma vez que as orientações não foram redigidas de maneira clara, inteligível e direta, além de ser impossível ao contratante verificar a correção das variáveis, uma vez que essas regras não permitem a compreensão ou comprovação da forma de efetivação dos reembolsos, configurando ofensa direta ao artigo 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor.

Confira-se a respeito o que dispõe o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

Mais adiante completam os artigos 46 (“Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”) e 47 (“As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”) do mesmo diploma legal.

Sobre o tema acentua a jurisprudência que: “Nas relações de consumo, o consumidor só se vincula às disposições contratuais em que, previamente, lhe é dada a oportunidade de prévio conhecimento, nos termos do artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor. III - As informações prestadas ao consumidor devem ser claras e precisas, de modo a possibilitar a liberdade de escolha na contratação de produtos e serviços. Ademais, na linha do art. 54, §4º da Lei n. 8.078/90, devem ser redigidas em destaque as cláusulas que importem em exclusão ou restrição de direitos” (STJ 4ª Turma REsp 485.760/RJ Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira).

Ademais, como bem anotado pelo julgador monocrático, “é certo que, tratando-se de médico de livre escolha do paciente, não integrante da rede credenciada, existe limitação contratual (fls. 97). Portanto, pelo contrato, o reembolso não é integral, pois se faz de acordo com “Unidade de Ressarcimento Amil” (URA) e “Unidade de Franquia Amil” (UFA). Contudo, a verdade é que o contrato não é claro sobre como devem ser aplicadas a URA e a UFA. Além disso, na contestação (fls. 122, antepenúltimo parágrafo), a ré não explicou como chegou aos ínfimos valores que já reembolsou ao autor. Além disso, a memória de cálculo a fls. 129-130 não permite nem mesmo entrever a aplicação das tais URA e UFA. Ou seja, o autor, graças a essa falta de clareza e transparência, fica a mercê da ré, ...” (fl. 149).

Da mesma forma quanto à negativa de custeio do medicamento Clexane, amparada no fato de que o medicamento é utilizado para tratamento de tromboembolismo, não sendo esta a doença que acomete o autor, bem como na questão de que tal medicação é de uso domiciliar.

Da análise dos documentos juntados aos autos, verifica-se que o apelado mantém, por intermédio de sua empregadora, contrato de assistência médica com a apelante e que, acometido de neoplasia de sigmóide, lhe foi indicado tratamento com “Clexane” diário até término de quimioterapia, cuja cobertura foi negada pela ré.

Em que pesem as alegações da apelante, fato é que a necessidade de referido tratamento restou atestada pelo documento de fl. 30, não podendo a empresa prestadora de serviços de assistência médica interferir na indicação médica.

Nesse sentido, confira-se entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça em caso análogo, “Seguro saúde. Cobertura. Câncer de pulmão.

Tratamento com quimioterapia. Cláusula abusiva. 1. O plano de saúde pode estabelecer quais doenças estão sendo cobertas, mas não que tipo de tratamento está alcançado para a respectiva cura. Se a patologia está coberta, no caso, o câncer, é inviável vedar a quimioterapia pelo simples fato de ser esta uma das alternativas possíveis para a cura da doença. A abusividade da cláusula reside exatamente nesse preciso aspecto, qual seja, não pode o paciente, em razão de cláusula limitativa, ser impedido de receber tratamento com o método mais moderno disponível no momento em que instalada a doença coberta. 2. Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma REsp 668216/SP Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito).

Ademais, consta do laudo médico de fl. 30 que o autor “apresenta tromboflebite de repetição com indicação de anticoagulação plena. No momento, por orientação do seu oncologista suspenso marevan por interação com quimioterápico e necessita do clexane diário até término de quimioterapia”, visando tão somente à melhora de sua saúde. Nem se alegue, também, que referido medicamento é de uso domiciliar, o que justificaria a negativa de cobertura de custeio.

Isto porque, no contrato celebrado (fls. 62/100) não há qualquer cláusula contratual de exclusão de cobertura para a doença que atingiu o apelado câncer. E, sendo inegável a submissão do ajuste às normas do Código de Defesa do Consumidor, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de forma mais benéfica ao consumidor.

Ademais, contrariamente ao alegado pela apelante, não se cuida de medicamento simples de uso domiciliar indicado para aliviar meros sintomas do mal suportado pelo paciente, mas de droga prescrita em razão de quadro de tromboflebite decorrente do tratamento quimioterápico, sem a qual afastar-se-ia qualquer possibilidade de tratamento com escopo de cura total da doença.

Em outras palavras, a limitação imposta excluiria o tratamento que foi prescrito como meio adequado e indispensável à tentativa de recuperação da higidez física do paciente, negando, pois, o próprio objetivo do contrato, o que não pode ser admitido.

Assim, incabível tanto a negativa de reembolso quanto a de custeio do medicamento defendida pela apelante com apoio nas cláusulas contratuais, sendo correta a solução alvitrada em primeiro grau, que fica mantida em sua integridade.

3. Ante o exposto, meu voto nega provimento ao recurso.

Galdino Toledo Júnior

Relator

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